No DSM-III-R, tais transtornos foram classificados dentro do conceito de “síndrome mental orgânico”, cuja etiologia é uma afecção sistêmica ou uma substância ou a combinação de ambos. O termo Síndrome Mental Orgânico não é utilizado pelo DSM-IV, pois implica que os transtornos mentais “não orgânicos” não têm uma base biológica, o que está absolutamente refutado pelo avanço atual das neurociências (ver capítulo de “bases biológicas de la psiquiatría”); nesta classificação, os transtornos são localizados nas categorias correspondentes de acordo com o sintoma predominante, como “Transtorno mental debido a afección médica general”. Devem ser suspeitados diante dos seguintes sinais (Dagadakis, 1993; American Psychiatric Association, 1994):

  • Primeira crise “conversiva” em paciente maior de 50 anos
  • Início rápido de sintomas psiquiátricos totalmente novos
  • Ausência de precipitantes conhecidos
  • Doença crônica ou abuso de drogas
  • Sintomas variáveis
  • Sintomas focais ou transtorno de consciência
  • Falta de resposta a tratamento psiquiátrico
  • Ausência de histórico familiar ou pessoal
  • Transtornos de memória, cognição ou intelecto
  • Mudanças na personalidade
  • Comportamento desinibido
  • Pobreza da linguagem
  • Alucinações visuais ou olfativas

 

EXAME MÉDICO E NEUROPSIQUIÁTRICO

 

Pretende descartar causas orgânicas por meio da inspeção cuidadosa e ordenada das diversas partes corporais: cabeça, tórax, abdômen, extremidades, genitais, costas, pele, sistema neurológico. Neste último, é preciso avaliar o estado mental por meio da aparência geral, comportamento psicomotor, atitude durante a entrevista, afeto, humor, transtornos perceptuais, conteúdo e curso do pensamento, memória recente e antiga, concentração, cálculo, informação, inteligência, fala, julgamento e nível de introspecção. Um modelo de avaliação apropriado poderia ser o apresentado na (Tabla 1).


 

DELIRIUM

 

  1. História: Existem referências ao transtorno nos escritos de Hipócrates, mas a primeira descrição similar à moderna é feita no século XVIII, com denominações desde então como fiebre, frenesí e locura febril. No século XIX, a ênfase é colocada no transtorno da consciência e na confusão. Para Engel y Romano (1940s), as características centrais são os transtornos de atenção e cognitivos. O termo “delirium” é introduzido nos anos 60 por Lipowski. Atualmente, outros termos menos aceitos também têm sido utilizados para defini-lo: encefalopatía, estado confusional agudo e síndrome cerebral orgánico (Caine et al., 1995).
  2. Definição: Transtorno cognitivo global com distúrbio da consciência que não se explica por uma demência prévia e que se desenvolve em um curto período de tempo, horas a dias, de curso flutuante, frequentemente reversível (isto não é critério para o DSM-IV). Geralmente associa-se a transtornos na atenção, na orientação, na memória e no ciclo sono-vigília, com sonolência diurna e despertares noturnos; desorganização no processo do pensamento; distúrbios psicomotores, hiperatividade ou lentidão; distúrbios emocionais como ansiedade, medo, irritabilidade, depressão, euforia e apatia, com mudanças rápidas entre um estado e outro; alucinações ou delírios transitórios; mudanças no EEG (lentidão difusa). O delírio pode resolver-se em poucas horas ou persistir por várias semanas, particularmente em indivíduos que sofrem de demência. A recuperação depende da detecção oportuna do fator etiológico (American Psychiatric Association, 1994).
  3. Etiologia: Alteração de atividades corticais superiores por disfunção do córtex pré-frontal como consequência do comprometimento de outras regiões como a protuberância, tálamo (sistema reticular ativador e sistema de filtro para a informação que entra no cérebro), caudado, córtex temporal e córtex parietal (posterior direita). Existem três circuitos paralelos que conectam o tálamo, o córtex pré-frontal e os gânglios basais, e que medeiam as funções executivas, a personalidade, o humor e a motivação. As vias talamocorticais e corticoestriatais são excitatórias (glutamatérgicas) e podem ser estimuladas, enquanto as vias estriatonigrais ou nigrotalâmicas são inibitórias (GABAérgicas) e podem ser estimuladas ou inibidas. No nível dos gânglios basais, as interneurônios utilizam outros neurotransmissores como a dopamina (que se encontra elevada), serotonina (elevada ou diminuída) e acetilcolina (diminuída). Os gânglios basais estão interconectados com o sistema límbico, o tronco cerebral e as regiões temporais, e qualquer alteração nessas áreas pode modificar a função dos circuitos tálamo-frontais-gângliobasais e favorecer a presença do delirium (Trzepacz, 1996).Afecciones sistémicas (Dagadakis, 1993):
  • Insuficiência adrenocortical ou enfermedad de Addison (com depressão, ansiedade e flutuações marcadas do afeto)
  • Hiperadrenalismo ou enfermedad de Cushing (ansiedade, agitação, alucinações)
  • Degeneración hepatolenticular ou enfermedad de Wilson (alucinações, irritabilidade, amnésia, mudanças súbitas do afeto)
  • Hipertiroidismo (ansiedade, paranoia, delusiones)
  • Hipotiroidismo (depressão, fadiga, delusiones paranoides)
  • Hiper ou hipoparatiroidismo (hiperatividade, ansiedade, irritabilidade)
  • Trauma encefalocraneano, encefalopatía hipertensiva ou ECV (confusão, irritabilidade, labilidade afetiva, amnésia, alucinações, delusiones)
  • Infecciones (confusão, irritabilidade, desorientação, alucinações)
  • Porfiria aguda intermitente (depressão, confusão)
  • Hipoxia (alucinações visuais, desorientação, confusão)
  • Hipoglicemia (agitação, confusão, ansiedade)
  • Convulsiones [estado postictal] (labilidade emocional, paranoia, confusão, desorientação, alucinações, comportamento automático)
  • Lesiones focales del lóbulo parietal derecho y de la superficie inferomedial del lóbulo occipital ou tumores intracraneanos (alteração do estado de consciência, alucinações, mudanças rápidas no estado mental)
  • Transtornos hepáticos e renais, arritmias, disbalance hidroelectrolítico, fiebre, deficiência de tiamina, hipercapnia, estados postoperatorios…Medicaciones (Dagadakis, 1993):
  • Digoxina (alucinações visuais e/ou apatia), em até 20% dos pacientes em doses usuais
  • Disulfiram (estado maníaco, depressivo ou paranoide)
  • L-dopa (hipomania, alucinações, delusiones paranoides, agitação, depressão)
  • Lidocaína (alucinações visuais e depressão)
  • Penicilina intravenosa (agitação, alucinações, ansiedade, convulsões)
  • Podofilina (alucinações visuais, sedação, paranoia)
  • Propranolol (alucinações visuais, depressão)
  • Quinidina (alucinações visuais, depressão, excitação)
  • Ranitidina (depressão, agitação, alucinações, confusão)
  • Salicilatos em altas doses (confusão, agitação, alucinações)
  • Antihistamínicos (psicose, paranoia, agitação, depressão)
  • Corticoesteroides tipo prednisona (instabilidade emocional, mania, confusão, desorientação, “psicosis esteroide”), pela alteração do metabolismo dos neurotransmissores ao afetar a bomba Na+ – K+ (Gerner, 1993).
  • Anticolinérgicos, Atropina e antidepresivos tricíclicos (desorientação, confusão, agitação, paranoia, alucinações, “psicosis o delirium anticolinérgico”). Neste caso, prefere-se a Propantelina [PRO-BANTHINA] que não cruza a barreira hematoencefálica.
  • Anestésicos, antiasmáticos, antibióticos (quinolonas, penicilina cristalina), anticonvulsivantes, antiparkinsonianos, relaxantes musculares, medicaciones gastrointestinales, Ciclosporina…Intoxicación o abstinencia a sustancias:barbitúricos (agitação, confusão, alucinações, depressão, sonolência), benzodiacepinas (depressão, às vezes agitação e desinibição), alcohol, cocaína, anfetaminas, marihuana, opiáceos, alucinógenos, inhalantes, fenciclidina…Toxinas:

    anticolinesterasas, insecticidas organofosforados, monóxido de carbono, dióxido de carbono, gasolina, plomo, mercurio…

  1. Epidemiologia: As crianças podem ser mais suscetíveis que os adultos ao delirium, e isso se relaciona com estados febris ou o consumo de medicamentos como anticolinérgicos. No entanto, o grupo de maior risco para a apresentação do delirium é a população idosa e aqueles com transtornos cognitivos. Em maiores de 65 anos hospitalizados, a prevalência pode chegar a 10% a 50% (American Psychiatric Association, 1994; Caine et al., 1995).
  2. Diagnóstico: Se o delirium é consequência dos efeitos fisiológicos diretos de uma afecção sistêmica, será diagnosticado como Delirium debido a afección sistémica; mas se for devido aos efeitos fisiológicos de uma droga de abuso, será diagnosticado como Delirium debido a una intoxicación o abstinencia a una sustancia; quando houver mais de uma etiologia, é diagnosticado como Delirium debido a múltiples etiologías e, se não for possível determinar a causa, Delirium de causa no especificada (tabla 2). O diagnóstico diferencial deve ser feito com demência (sem alteração no estado de consciência e no alerta); trastorno psicótico breve; esquizofrenia; trastorno esquizofreniforme; transtornos afetivos com elementos psicóticos (no delirium, os sintomas psicóticos são flutuantes, fragmentados e pouco sistematizados); simulación e trastornos facticios; trastornos cognitivos no especificados (American Psychiatric Association, 1994).
  3. Exames de laboratório: Estabelecer a causa urgentemente com determinação de sinais vitais, Hemoleucograma e sedimentación (HLG e sed), química sanguínea, pruebas de función renal y hepática, toxicología urinaria (alcoholemia), pruebas tiroideas, citoquímico de orina, eletrocardiograma (EKG), radiografias de tórax (Rx), tomografia axial computadorizada de crânio (TAC) em caso de delirium inexplicável, punción lumbar (P.L.), eletroencefalograma (EEG) em caso de perda ou alteração da consciência antes do estado delirante, medição de eletrólitos (Na+, K+, Cl-, HCO3) e gases arteriais (O2, CO2)… Um teste de gravidez prévio pode ser útil quando se requer o uso de benzodiazepínicos em mulheres em idade reprodutiva (Dagadakis, 1993).
  4. Tratamento: Realizar um manejo urgente, buscando inicialmente tranquilizar o paciente para realizar os exames correspondentes e detectar as causas subjacentes. Deve-se fornecer explicação adequada ao paciente sobre o que está ocorrendo e sobre o que ele está sentindo, proporcionando, além disso, um ambiente tranquilo, o que em alguns casos limitados é suficiente para a diminuição dos sintomas. Para o manejo da agitação ou ansiedade, utiliza-se Haloperidol, 1-2 mg c / 30-60 minutos V.O. (via oral) (0.04 a 0.06 mg./kg./dia) ou 0.5 mg I.M. (intramuscular) ou 0.5 a 20 mg I.V. até acalmar o paciente, continuando a medicação por mais 2 a 3 dias (Adams, 1988; Fernández et al., 1988; Dagadakis, 1993; Wilson, 1993); além disso, BZD de ação curta para a labilidade autonômica e a insônia, como Lorazepam, 1-2 mg c / 4 h. V.O. ou I.M. Em algumas situações, é preciso sujeitar e/ou isolar o paciente (Stern et al., 1987).

 

DEMÊNCIAS

 

  1. Definição – generalidades: Esquirol no século XIX realizou a primeira definição moderna de demência: “uma afección cerebral crónica caracterizada por un debilitamiento de la sensibilidad, el entendimiento y la voluntad.” Atualmente, define-se como um comprometimento global adquirido (em mais de uma área) de diversas funções mentais superiores sem alteração do estado de consciência, com diminuição das habilidades cognitivas, transtornos de memória, da linguagem (afasia), agnosia, apraxia, do afeto, cálculo, pensamento abstrato, julgamento, orientação, pobre insight e mudanças de personalidade que interferem nas atividades sociais ou ocupacionais. O suicídio pode ocorrer, particularmente em estágios iniciais, nos quais o indivíduo é capaz de planejar uma ação. Outros sinais que podem aparecer no decorrer do transtorno são o comportamento desinibido, ansiedade, distúrbios do afeto e do sono, delírios persecutórios, alucinações visuais e exacerbação durante estados estressantes. Divide-se em 3 tipos: 1) cortical: anomia, amnésia, apraxia construccional, transtornos cognitivos (Alzheimer, Pick, enfermedad de Creutzfeldt-Jakob, neurosífilis, hidrocefalia de presión normal), 2) subcortical (comprometimento de gânglios basais, substância branca e estruturas do tronco cerebral): amnésia (embora com menor comprometimento na retenção da informação e menores erros de intrusão e perseveração), comprometimentos da atenção, do alerta, da motivação, do sistema motor e do estado emocional, sem afasia, apraxia ou agnosia (Parkinson, Huntington, Wilson, demencia de vasos pequeños, esclerosis múltiple e demencia por VIH); 3) mixta (demencia multinfarto) (Benson, 1982; Cummings & Benson, 1984). Para o ICD-10, existem quatro tipos: 1) enfermedad de Alzheimer; 2) demencia vascular; 3) demencia por enfermedades clasificadas en otras partes (enfermedad de Pick, enfermedad de Huntington, enfermedad de Parkinson, enfermedad de Creutzfeldt-Jakob); 4) demencia no especificada.
  2. Etiologia: As causas mais comuns para sua apresentação e que serão analisadas individualmente são: enfermedad de Alzheimer (65%), demencia multinfarto (10%), síndrome de inmunodeficiencia adquirida (SIDA), enfermedad de Pick, enfermedad de Huntington, enfermedad de Parkinson, esclerosis múltiple, transtornos endócrinos, hepáticos, urinários, cardiovasculares, pulmonares, infecciosos do SNC, tóxicos, déficit de vitamina B12 e ácido fólico, desequilíbrios hidroeletrolíticos, hematoma subdural, neoplasias intracranianas, neurosífilis, neurocisticercosis e transtornos vasculares (estes últimos como causa em 10-15% e de caráter irreversível) (American Psychiatric Association, 1994).
  3. Epidemiologia: Entidade que se apresenta principalmente em maiores de 80 anos. Em indivíduos menores de 18 anos com retardo mental, o diagnóstico de demência pode ser feito se os sintomas não respondem satisfatoriamente aos critérios de R.M. Embora a demência seja pouco comum em crianças e adolescentes, pode ocorrer como consequência de afecções sistêmicas (TEC, tumores cerebrais, HIV, adrenoleucodistrofias). Prevalência: 0.72% (60-64 anos); 1.5-2% (65-69 anos); 5.5-6.5% (75-79 anos); 20-22% (85-89 anos) e 38.6% (90-95 anos) (Benson, 1982; Amaducci, 1990; Caine et al., 1995). Na Colômbia, o Estudio de Salud Mental com uma amostra de 15.045 entrevistados revela uma prevalência ao longo da vida de transtornos cognitivos em geral (aplicando o MMSE) de 2.6% sem diferenças entre os sexos, com um pico de maior prevalência em maiores de 61 anos (4.2%), que aumenta quando é levado em conta o nível de escolaridade (9.7% em indivíduos não escolarizados) (Torres & Montoya, 1997).
  4. Diagnóstico: É preciso avaliar regularmente transtornos sensoperceptivos (atenção e vigilância), transtornos cognitivos (concentração, entendimento, memória, orientação e cognição), transtornos do afeto e comportamento e da memória. O transtorno de memória é o selo que distingue as demências de outras entidades e costuma ser o primeiro sinal exibido pelo paciente. Os test de memoria (avaliação neuropsicológica) são essenciais para documentar a demência, já que o exame neurológico, a TAC ou RM são informados geralmente como normais nos estágios iniciais (Delis, 1993). A SPECT pode ser muito útil para diferenciar os tipos de demência, encontrando-se uma hipoperfusão parietotemporal bilateral na enfermedad de Alzheimer, uma hipoperfusão frontal na enfermedad de Pick e achados de hipoperfusão multifocal na demencia vascular. Para o DSM-IV, o diagnóstico de demência como entidade isolada não é contemplado, mas é feita uma abstração das definições particulares, já que é comum às mesmas (tabla 3).

 

DEMÊNCIA TIPO ALZHEIMER

 

  1. Definição: A apresentação clínica e as mudanças microscópicas características do cérebro foram descritas inicialmente em 1907 por Alois Alzheimer, neurologista alemão. É o mais comum transtorno neurodegenerativo (em estudos ocidentais), e se caracteriza por um início insidioso, progressão gradual e inexorável e declínio na memória, cognição e funções neurológicas, levando o paciente a uma demência severa e à morte. É devida principalmente à perda seletiva dos neurônios colinérgicos. Pode ser acompanhada de alterações não cognitivas como comportamento agitado e violento (48% e 30% dos pacientes respectivamente) (Reisberg et al., 1987), descuido de hábitos higiênicos, delírios e alucinações (Wragg & Jeste, 1989) e hiperatividade motora.
  2. Etiologia e patologia: Factores genéticos: Entidade demencial que se associa a fatores genéticos com até 40% de histórico familiar nos pacientes e maior concordância entre gêmeos monozigóticos. Aparentemente, padrão de transmissão autossômica dominante de penetrância quase completa no braço longo do cromossomo 21 em vários loci próximos ao centrômero [21q11.2-21] (onde se encontra o gene da proteína precursora do amiloide (APP)) que se relaciona com enfermedad de Alzheimer familiar e de início precoce antes dos 70 anos (entre os 40 e 50 anos) (Li et al., 1995); esse cromossomo é o mesmo implicado na síndrome de Down, e por isso se observa uma alta taxa de apresentação da doença em pacientes com essa síndrome após os 30 anos de idade. Na síndrome de Down, a duplicação do gene APP no cromossomo 21 parece ser suficiente para o depósito de amiloide e o subsequente desenvolvimento da neuropatología tipo Alzheimer (Hyman, 1992). Existem outros estudos que envolvem o cromossomo 14 (em mais de 80% dos casos de enfermedad de Alzheimer de inicio temprano) e o cromossomo 19, alelo apo-E4 (enfermedad de Alzheimer esporádica de inicio tardío, variante cuerpos de Lewy) (Farrar et al., 1990; Collacott et al., 1992; Galasko et al., 1994). Também são fatores de risco a história familiar de leucemia, mielolinfoma ou enfermedad de Hodgkin (Caine et al., 1995). Li, G. et al. concluem que provavelmente seja mais determinante a presença de um paciente com enfermedad de Alzheimer de inicio temprano na idade de início do transtorno em seus parentes do que no risco de apresentação do mesmo para eles (Li et al., 1995), em contraposição aos achados de Silverman et al. para quem o risco nos parentes de um paciente com enfermedad de Alzheimer de inicio temprano é maior em todas as idades do que para aqueles com um paciente com enfermedad de Alzheimer de inicio tardío (Silverman, et al., 1994).Hallazgos neuropatológicos y moleculares: Do ponto de vista patológico, observa-se atrofia cortical difusa com achatamento de sulcos corticais e aumento no tamanho dos ventrículos por degeneración neuronal colinérgica de tipo granulovacuolar no septo medial e núcleos basais de Meynert (principal inervação colinérgica para o hipocampo, a neocorteza e amígdala de primatas), com diminuição de receptores muscarínicos pré-sinápticos e das concentrações de acetilcolina transferasa (vital para a síntese de acetilcolina) e alteração de receptores nicotínicos de alta afinidade (Perry et al., 1977; Bartus et al., 1982; Beyreuther, 1990). Tal degeneração neuronal deve-se à alteração de mecanismos reguladores durante o envelhecimento (apoptosis celular) que permitem o aumento excessivo de Ca++ intracelular (mediado pelo canal de Ca++ tipo L), o que leva a danos em proteínas e fosfolipídios da membrana celular e a uma disfunção no metabolismo de vários neurotransmissores (a superexcitação neuronal a partir de receptores para glutamato [NMDA] pode levar à lesão celular por entradas massivas de Na+ ou Ca++ e à liberação do glutamato intracelular afetando os neurônios circundantes em um ciclo autoperpetuável) (Kachaturian, 1990; 1992; Branconnier et al., 1992). O Ca++ elevado, e possivelmente a estimulação colinérgica, induz a divisão enzimática da proteína precursora do amiloide (PPA), que consiste em uma grande cadeia amino terminal extracelular e uma curta cadeia carboxi intracelular. A secção enzimática no meio da proteína libera uma forma secretada (sAPPa) que modula a excitabilidade neuronal e atua como um fator que promove a sobrevivência dos neurônios. Mas, a secção da região amino terminal extracelular deixa um fragmento de 100 aminoácidos (C100) que é então secionado no grupo carboxi terminal para deixar intacto o peptídeo b amiloide. Vários estudos mostraram que a expressão de C100 causa degeneração em células neurais cultivadas (Mattson & Furukawa, 1997). O peptídeo b amiloide induz a produção de radicais livres, acúmulo de Ca++ nos neurônios, pode induzir a formação de autoanticorpos e depositar-se na sinapse primeiramente e depois intraneuronal e intravascularmente, formando placas senis no nível da amígdala, hipocampo, córtex e base do cérebro anterior (áreas de associação frontal) principalmente. Existe ampla evidência que suporta a hipótese de que mecanismos imunes e inflamatórios participam na destruição tecidual na enfermedad de Alzheimer; proteínas de fase aguda são encontradas elevadas no nível sérico e se depositam nas placas amiloideas, assim como células microgliais ativadas (Yanker et al., 1990; Aisen & Davis, 1994). O depósito de amiloide não ocorre apenas nos vasos sanguíneos cerebrais, mas também nos epicutâneos (Katzman, 1986; Cacabelos, 1992). O depósito do amiloide (peptídeo b, A-b ou b-A4) começa 30 anos antes dos primeiros sintomas e está presente em 80% nos maiores de 90 anos. Além disso, há uma diminuição nas dendrites neuronais (principalmente colinérgicas) por ausência ou diminuição do estímulo despolarizante com diminuição do fosfatidilinositol nos sinaptossomas do córtex frontal (Bothmer et al., 1994) e emaranhamento de neurofibrillas (neurofilamentos) que constituem o citoesqueleto por possível ação da interleucina 1 alfa (IL-1) com ativação das microglias e componentes do complemento (Griffin et al., 1994; Aisen & Davis, 1994) e fosforilação anormal da proteína tau associada aos microtúbulos, que deprime a união do GTP e leva à fratura daqueles, com a subsequente alteração no transporte intraneuronal, na geometria celular e na viabilidade neuronal (Arriagada et al., 1992; Khatoon et al., 1995). Apresenta-se também, alteração dos núcleos da rafe média e do locus coeruleus com comprometimento da noradrenalina e da serotonina; redução significativa na concentração de somatostatina no SNC e alteração da resposta do GH ao GRF (fator liberador do hormônio do crescimento) em indivíduos com início precoce da doença (Nemeroff & Krishnan, 1993). Outros agentes que levam à injúria celular são o Óxido Nítrico (NO -), os radicais oxidantes tipo superóxido (O2 =), peróxido de hidrogênio (H2O2) e hidroxilo (OH -), produtos da respiração celular que causam mutações no DNA e alteram o metabolismo lipídico (diminuição da fosfolipase A2 que converte os fosfolipídios de membrana em acetilcolina). Detectou-se, além disso, uma diminuição na atividade da glutamina sintetase no nível do lobo frontal (Carney et al., 1994). Entre os fatores hipotéticos que aparentemente ajudam no desencadeamento da entidade estão: Hipertensión arterial (H.T.A.), diabetes mellitus, depressão episódica, heridas en la cabeza (TEC), transtornos de personalidade pré-mórbidos, analfabetismo ou baixo nível de educação (Ott et al., 1995), ausência de uso de AINEs, transtornos vasculares e tireoidianos, cigarro, desnutrição (déficit de Ca++), solventes orgânicos, maternidade tardia, alumínio (?), ferramentas vibratórias (?)… (Kokmen et al., 1991; Li et al., 1995).
  3. Diagnóstico e curso: O diagnóstico só pode ser realizado quando outras causas de demência tiverem sido descartadas (tabla 4). O curso da demência tipo Alzheimer tende a ser lentamente progressivo, com uma perda de 2 a 3 pontos no Mini-Mental State Examination a cada ano e de 6 a 10 pontos na ADAS-Cog (Mohs & Cohen, 1988). A duração média da doença desde o início dos sintomas até a morte é de aproximadamente 8 a 10 anos. O quadro clínico caracteriza-se por um declínio das habilidades cognitivas como memória e resolução de problemas; também podem apresentar-se transtornos de linguagem, cálculo, percepções visuoespaciais, julgamento e comportamento. Em estágios tardios, os indivíduos podem ter demência profunda com mutismo, incontinência e prostração (Evans et al., 1989). Entre os sintomas que podem ceder parcialmente a algum tratamento encontram-se: Depressão (labilidade emocional) (19%), ansiedade (32%), delírios persecutórios não elaborados relacionados ao roubo (30%) (Cummings et al., 1987), alucinações (28%), falsos reconhecimentos (23%), agressividade verbal (24%), agitação psicomotora (44%), convulsões (10%), “vagar sem destino” (Wragg, & Jeste, 1989). Para Ownby et al., da Universidade de Miami, é possível identificar cinco grupos de pacientes segundo achados psicopatológicos predominantes, a partir de um estudo com 90 pacientes com enfermedad de Alzheimer (Ownby et al., 1996):
    1. Grupo irritável: elevação da irritabilidade e transtornos do ritmo circadiano.
    2. Grupo deprimido: altos níveis de depressão e ansiedade.
    3. Grupo agitado: elevados níveis de agitação, transtornos cognitivos e longa duração da doença.
    4. Grupo psicótico: altos níveis de sintomas psicóticos.
    5. Grupo normal: pouca evidência de psicopatologia e leves transtornos cognitivos.
  4. Epidemiologia: A enfermedad de Alzheimer se apresenta principalmente em maiores de 65 anos (em maiores de 85 anos, cerca de um terço da população apresenta algum tipo de demência e três quartos de todas as demências são do tipo Alzheimer (Ott et al., 1995)). Prevalência: 3.25 -10% (11% em maiores de 65 anos; 19% – 50% em maiores de 90 anos) (Evans et al., 1989). Mais frequente em mulheres do que em homens? (pela maior expectativa de vida das primeiras?) (Amaducci, 1990). É a quarta causa de morte nos Estados Unidos com custos anuais de mais de 90 bilhões de dólares.
  5. Laboratório: Pruebas neuropsicológicas: Teste de apraxia construtiva (já que a presença de apraxia ou afasia leva a um declínio mais rápido da doença [Yesavage et al., 1993]); ADAS-Cog (Alzheimer Disease Assessment Scale); MMSE (Minimental State Examination). Devem ser realizados a cada 6 meses. Exames neuroradiológicos: Tomografia axial computadorizada (TAC) na qual se observa atrofia cortical e alargamento ventricular (este último possivelmente relacionado a um pobre funcionamento neuropsicológico); com SPECT, encontra-se hipometabolismo do córtex de associação temporoparietal, enquanto no PET, encontra-se um hipometabolismo no córtex de associação occipital e um padrão funcional regional das áreas de associação mais baixo do que na Demencia vascular (Mielke et al., 1994) [FIG. 1]. Exames neurofisiológicos: EEG com lentidão (perda do ritmo alfa); mapeamento cerebral. Anatomopatológicos: Biópsia cerebral que mostra as placas senis e o emaranhamento dos filamentos (contraindicada atualmente). No futuro, estarão disponíveis a determinação de anticorpos e a biópsia de pele.
  6. Tratamento: Até o momento, não existe tratamento que detenha significativamente o curso da doença; muito pelo contrário, diversos sintomas vão surgindo pela progressão da mesma, que requerem manejo adequado. Tal é o caso de sintomas delirantes-alucinatórios, que podem se beneficiar de antipsicóticos em baixas doses como Haloperidol, a Risperidona ou a Olanzapina. A Loxapina e a Tioridazina demonstraram ser superiores ao placebo na BPRS, embora em apenas um terço dos pacientes e com alta prevalência de extrapiramidalismo (Barnes et al., 1982). A agressividade e o comportamento disruptivo pouco se beneficiam desse tipo de psicofármacos. Um estudo com Trazodone em 7 pacientes com Enfermedad de Alzheimer e comportamento agressivo, informa uma marcada diminuição dos mesmos em 3 dos pacientes em doses de 200 a 300 mg./dia (Pinner & Rich, 1988); esses dados foram replicados em um estudo posterior (Lebert et al., 1994). Colenda informa de um paciente que respondeu a 45 mg./dia de Buspirona (Colenda, 1988). A Carbamazepina foi eficaz em 5 de 9 pacientes no controle da hostilidade, agitação e falta de cooperação em doses médias de 480 mg./dia e níveis séricos de 6.5 mgr./ml. (Gleason & Schneider, 1990). Os episódios depressivos que se somam a um processo demencial podem ser manejados satisfatoriamente com diversos antidepressivos como Imipramina (83 mg./dia e níveis de 116 ng./ml.) demonstrou ser superior ao placebo em um estudo duplo-cego, mas mostrou efeitos adversos significativos (Reifler et al., 1989) ou Venlafaxine (Whitehouse & Voci, 1995). Os antipsicóticos atípicos como a Risperidona e a Olanzapina demonstraram ser eficazes no controle de uma diversa sintomatologia (além do manejo dos episódios delirantes-psicóticos e agressivos). Os sintomas ansiosos ou depressivos respondem adequadamente a doses baixas desses antipsicóticos, assim como a hostilidade. Esse efeito é alcançado com doses baixas, o que permite supor que o bloqueio de receptores 5-HT2 é responsável pela eficácia terapêutica. Quanto aos tratamentos existentes que buscam deter o curso inexorável da doença e que tentam uma abordagem que cubra o déficit de vários neurotransmissores, encontram-se: A Fisostigmina, uma anticolinesterase reversível, pode melhorar transitoriamente as funções cognitivas de um certo número de pacientes, mas sua meia-vida é muito curta (menos de 2 horas), sua administração é acompanhada de vários efeitos adversos (transtornos gastrointestinais, depressão, ansiedade, hipotensão, bradicardia e salivação) (Christie et al., 1981). Baseados na hipótese catecolaminérgica da demência, que assume que os receptores pós-sinápticos das terminações colinérgicas degeneradas permanecem relativamente intactos, encontraram-se alguns resultados controversos com o uso de Tacrina hidroclorhidra (Tetrahidroaminoacridina), primeiro fármaco aprovado nos Estados Unidos para o tratamento da enfermedad de Alzheimer, mas que só produz leves benefícios em um modesto número de pacientes (Knapp et al., 1994). É um medicamento conhecido desde 1940 como antagonista da Atropina em anestesia, que aumenta a liberação de noradrenalina, dopamina e serotonina por bloqueio da recaptação, além do aumento de acetilcolina por meio da inibição reversível da colinesterase. É também um bloqueador dos canais de K+, o que leva ao seu aumento no nível intracelular. Atualmente, estuda-se seu uso em HIV (por um provável aumento dos linfócitos CD4+) (Davis et al., 1992; Knapp et al., 1994). Os pacientes que receberam tacrina (>80 mg/dia) foram 2.8 vezes menos propensos a serem institucionalizados do que os pacientes que receberam doses menores. Os pacientes que receberam doses > 160 mg/dia requerem, em média, 12.1 meses menos de cuidados de enfermagem (Knopman et al., 1996; Lubeck et al., 1994). Os inibidores de colinesterases de segunda geração, como o Donazepil, produzem benefícios cognitivos tão bons quanto os observados com Tacrina, com impacto similar na redução de cuidados institucionais. No entanto, ao contrário da tacrina, que é mal tolerada, Donazepil tem um melhor perfil de segurança (Baumel, 1998).

DEMÊNCIA VASCULAR

 

  1. Definição: Início súbito e dramático com deterioração em degraus, mais do que progressiva, da função cognitiva devido a dano de pequenos e médios vasos arteriais (infartos), com melhorias leves entre os infartos, mas com um curso de declínio mais rápido que o da enfermedad de Alzheimer, levando a uma aparição mais precoce de demência e morte. A depressão é mais frequente nesta entidade do que na enfermedad de Alzheimer por comprometimento das vias ponticolímbicas, e responde melhor aos antidepressivos. Constituem achados adicionais os sinais neurológicos focais (reflexos patológicos, transtorno da marcha, paresias ou plegias), H.T.A. severa de larga data, enfermedad valvular cardíaca, enfermedad vascular extracraneana que leva a embolia cerebral, ECV (múltiplos ataques), arteriosclerosis (Hachinski, 1983).
  2. Diagnóstico e curso: Os déficits costumam ser focais e dependem das regiões cerebrais comprometidas; por exemplo, o síndrome del giro angular no hemisfério dominante, com alexia, agrafia, afasia, distúrbios construcionais, acalculia, desorientação direita-esquerda e agnosia dos dedos com preservação da memória e da praxia ideomotriz (Sultzer et al., 1993). Os delírios de tipo persecutório podem apresentar-se em até 40% dos pacientes afetados por esta entidade (Cummings et al., 1987) (tabla 5).
  3. Epidemiologia: Sua aparição ocorre principalmente entre os 60 e 70 anos, com maior comprometimento de homens e histórico de H.T.A. usualmente (Pressão sistólica >160 mmHg), diabetes mellitus, arteriosclerosis, isquemia cerebral transitoria, doenças cardíacas, sopro carotídeo, anemia falciforme… (American Psychiatric Association, 1994).
  4. Laboratório: Observam-se zonas de infarto cerebral na tomografía axial computarizada (TAC) e hipometabolismo nas áreas corticais de associação (PET). Na MRI é possível detectar hiperintensidades na matéria branca e na região periventricular; também há comprometimento de regiões subcorticais e núcleos basais. No EEG podem ser observadas lesões focais. Adicionalmente, podem ser encontradas anomalias EKG e evidência de falha renal (Hachinski, 1983).
  5. Tratamento: Tratar a H.T.A. (IECAs), a diabetes e a doença cardíaca subjacente. Dar tratamento de suporte com antidepressivos, antipsicóticos, benzodiacepinas (BZD), antiagregantes plaquetarios (Aspirina) e bloqueadores dos canais de Ca++ (Nimodipina) (Hachinski, 1983).

 

ENFERMEDAD DE PARKINSON

 

  1. Definição e etiologia: Transtorno idiopático do movimento caracterizado por bradicinesia, rigidez muscular, tremor em repouso e transtorno do equilíbrio postural, devido à diminuição de células dopaminérgicas da substância nigra, a pars compacta e a área tegmental ventral com diminuição subsequente de dopamina (> 80%) e degeneração dos tratos dopaminérgicos (vias nigro-estriais diretas e indiretas e gângliobasais – talamocorticais) por causas desconhecidas na maioria dos casos, e em outros por traumas encefalocraneanos, medicamentos e neurotoxinas. Sugeriu-se uma transmissão genética autossômica dominante de penetrância incompleta em famílias com alta prevalência de parkinsonismo. O HLA-B44 é um indicador da suscetibilidade ao parkinsonismo induzido por neurolépticos em esquizofrênicos brancos. A dopamina é sintetizada a partir da tirosina, a qual é transformada pela tirosina-hidroxilase em DOPA e esta finalmente em dopamina pela dopa-descarboxilase. Por sua vez, a dopamina é degradada em DOPAC (ácido 3,4 – dihidroxifenilacético) pela MAO-B e em 3MT e HVA pela COMT e pela MAO, respectivamente. As vias dopaminérgicas nigro-estriatais dividem-se em direta (de tipo “excitatorio”, mediada por receptores D1 e que libera GABA no globo pálido medial impedindo que este iniba a estimulação talâmica do córtex) e indireta (de tipo “inhibitorio”, mediada por receptores D2 e com conexões ao globo pálido lateral e ao núcleo subtalâmico que por ação do glutamato permite que o globo pálido medial libere GABA no tálamo). Os gânglios basais se conectam com o tálamo através de neurônios GABAérgicos e finalmente, os núcleos ventral anterior e ventral lateral do tálamo se comunicam com o córtex motor por vias glutamatérgicas. Assim, a excitação do córtex motor depende que o GABA não seja liberado no nível talâmico, o que equivale a que a via indireta não esteja ativada. A lesão da via dopaminérgica direta permite a ação incrementada da via indireta, a inibição da via gângliobasal-talâmica e, finalmente, a diminuição da atividade excitatória sobre o córtex motor. O comprometimento das vias dopaminérgicas permite, além disso, a liberação da ação colinérgica (normalmente antagonizada por dopamina). Também há comprometimento de neurônios noradrenérgicos no córtex cerebral (camadas I e II) em regiões pré-frontal, pré-motora e motora. Na autópsia, observam-se inclusões intracelulares na substância nigra, chamadas cuerpos de Lewy (Gaspar et al., 1991; Uribe, 1991a; Cedarbaum & Olanow, 1991). Detectaram-se radicais livres tóxicos pelo metabolismo oxidativo que aceleram o dano nigroestriatal (lesão do DNA e da membrana) e, além disso, uma diminuição nas catalases e peroxidases no nível da substância nigra.
  2. Diagnóstico e curso: Começo insidioso ou brusco em um membro superior > mandíbula > cabeça > membro inferior (às vezes hemiparkinson). Curso progressivo com aumento da incapacidade até um estado acinético rígido (após cerca de 5 a 10 anos) e demência (Uribe, 1991a). Esta última se apresenta em 20-60% dos indivíduos, especialmente se são de idade avançada ou com curso grave da doença; caracteriza-se por lentidão motora e cognitiva, disfunção executiva, desorientação espacial e transtorno de memória (Lees & Smith, 1983). A morte geralmente ocorre por pneumonia ou embolia pulmonar. Os sintomas próprios do transtorno e que participam durante sua evolução são: tremor: Inicialmente distal, nas mãos como “conteo de monedas”, de repouso (às vezes intencional) e que desaparece com o sono e aumenta com a ansiedade. É sugestivo de uma enfermedad de Parkinson de evolução benigna (mais ainda se persiste durante todo o curso) (Hershey et al., 1991). rigidez: Inicialmente na musculatura proximal (nuca, tronco e músculos flexores) levando à aparição do sinal de “rueda dentada” em que o paciente realiza o movimento de forma sequencial quando lhe é oferecida resistência. bradicinesia: Diminuição dos movimentos espontâneos com lentidão da fala, escrita (micrografía) e outras atividades (comer, vestir-se…) que progride até a aquinesia (imobilidade). Também afeta a marcha com diminuição do balanço dos braços e queda a qualquer tropeço; a marcha é característica, festinante, com aceleração sem detenção e inclinação do tronco para frente e passos pequenos pela sensação que o paciente tem de que vai cair de bruços. Além disso, fascies inexpresiva, em “máscara”. outros: Retropulsión, acatisia (incapacidade de permanecer em uma única posição), transtornos autonômicos (sialorrea, hiperhidrosis) e diminuição na qualidade do sono (insônia precoce por ansiedade, fragmentação e sonolência matinal), às vezes por altas doses de Levo dopa (que melhora com Difenhidramina ou com antidepressivos tricíclicos como Imipramina). Além disso, apresentam-se vários transtornos mentais (depressão, irritabilidade, demência). Em alguns, transtornos da linguagem e do procedimento gestual.
  3. Epidemiologia: Apresenta-se principalmente em maiores de 40 anos (embora uma variante familiar possa manifestar-se desde a idade adulta jovem) (Tellez, 1995). Prevalência anual: 84-270/100 mil hab. Incidência anual: 5-24/100 mil hab. A demência pode apresentar-se em 40-80% dos casos e a depressão na metade ou um terço dos pacientes (devido a transtorno no metabolismo da serotonina), embora esses dados não tenham sido replicados pelo estudo realizado em Dunedin (Nova Zelândia) onde em 73 pacientes com Parkinson apenas 2.7% encontraram critérios de depressão maior (Cummings, 1992; McKeith et al., 1994; Hantz et al., 1994).
  4. Tratamento: A administração oral de Levodopa (precursor da dopamina) + Carbidopa (inibidor da dopa descarboxilase) [SINEMET], continua sendo o mais eficaz e melhor tolerado tratamento farmacológico da enfermedad de Parkinson, mas induz discinesias [por desequilíbrio entre as vias estriatais diretas (D1) e indiretas (D2)], oscilações na resposta motora, complicações psiquiátricas e uma emergência progressiva de transtornos na marcha; devem ser levados em conta alguns estudos que falam da diminuição do armazenamento da dopamina sintetizada a partir de Levodopa exógena em enfermedad de Parkinson (Poewe, 1995). Por outro lado, um estudo de Chiveh, C. permitiu identificar a formação de radicais livres hidroxilo (OH-) a partir da auto-oxidação da dopamina nos gânglios basais, com peroxidação lipídica das membranas celulares dos neurônios adjacentes (Chiveh et al., 1994). Os agonistas da dopamina como o Mesilato de Pergolida e a Bromocriptina, ajudam a reduzir as flutuações motoras e as discinesias ocasionadas pela L-dopa, mas tais benefícios não podem ser mantidos indefinidamente. Portanto, não são mais efetivos que a L-dopa, de tal maneira que apenas 20-30% dos pacientes podem ser mantidos satisfatoriamente com a monoterapia com agonistas dopaminérgicos por mais de três anos. O que se postula então é a associação precoce de tais agonistas com L-dopa em doses baixas (Mannen et al., 1991; Poewe, 1995). Os agonistas dopaminérgicos elevam a superóxido dismutase cerebral, diminuindo a formação de peróxido de hidrogênio a partir do metabolismo da dopamina, preservando as células nigrais (Jenner, 1995). Também são utilizados como tratamentos alternativos o Biperideno e o Trihexifenidilo, anticolinérgicos que são usados sozinhos quando o sintoma predominante é o tremor, ou em associação com Levodopa. A Selegilina [DEPRENYL] (inibidor irreversível da MAO-B e, portanto, do metabolismo e oxidação da dopamina), 10-15 mg/dia (> 30 mg/dia: efeito antidepressivo) que foi postulada como terapia de primeira escolha. A Amantadina [SYMMETREL], 100-300 mg./dia, aumenta a liberação de dopamina, bloqueia sua recaptação e tem propriedades anticolinérgicas, embora não seja tão eficaz para o controle do tremor como o Biperideno. Pode ser iniciada como monoterapia, embora após 4 a 8 semanas possa mostrar diminuição de seu efeito e requerer a adição de L-dopa. Os inibidores da COMT, recentemente introduzidos no mercado, oferecem uma alternativa em pacientes não respondedores a outros tratamentos. Estuda-se uma possível utilidade dos antagonistas da N-metil-D-aspartato que diminuem a atividade dos núcleos subtalâmicos, sozinhos ou em combinação com L-dopa; aparentemente diminuem os sintomas e retardam a progressão da doença (Greenamyre & O’Brien, 1991). A Clozapina e a Olanzapina demonstraram ser úteis no controle de sintomas psicóticos secundários à administração de medicamentos dopaminérgicos, sem agravamento da sintomatologia extrapiramidal. A talamotomía é utilizada como último recurso no tremor incapacitante. A cirurgia estereotáxica com implante de medula suprarrenal continua sendo questionada.

 

SÍNDROMES POR LESÃO DE HEMISFÉRIOS E LÓBULOS CEREBRAIS

 

Múltiplas entidades podem comprometer os hemisférios e lóbulos cerebrais, levando a diferentes síndromes, dependendo da estrutura comprometida; os sintomas podem ser tão seletivos que é possível identificar a zona lesionada:

  1. Lóbulo parietal: Agnosia, afasia e apraxia. Negação do transtorno e hipomania em comprometimento direito.
  2. Lóbulo temporal: Alteração de funções auditivas, transtornos de memória, equilíbrio, estado emocional e de consciência. Agnosia verbal, amusia, paracusias (alucinações auditivas), alucinações gustativas e olfatórias, síndrome de Korsakoff, transtornos do pensamento e conduta.
  3. Lóbulo occipital: Ilusões e alucinações visuais, agnosia visual, alexia, acromatopsia (agnosia da cor), prosopagnosia, síndrome de Anton (cegueira cortical com negação do transtorno).
  4. Lóbulo frontal: Importante pelas múltiplas conexões com o restante do SNC, modulando as funções cognitivas, linguísticas, de atenção e processos perceptuais que se originam em outras áreas do cérebro. As funções cognitivas, usualmente referidas como executivas, compreendem: análise, processamento sequencial, manutenção da informação relevante, autoelaboração de planos em relação a contingências específicas, adaptação a mudanças ambientais e controle de respostas comportamentais e avaliação de sua pertinência de acordo com as contingências internas (geradas por estruturas subcorticais) e externas (situações ambientais) (Dubois, 1996). Foram identificados cinco circuitos em paralelo que o conectam com estruturas subcorticais (lobo frontal ® striatum ® globus pallidus / substantia nigra ® tálamo ® lobo frontal). Os três circuitos comportamentalmente relevantes originam-se no córtex pré-frontal dorsolateral, no córtex orbitofrontal e no córtex frontal medial / cíngulo anterior (Cummings, 1996). Existem vários tipos de lesões do lobo frontal (Cummings, 1995; Gaviria, 1995): Superior mesial (frontal medial / cíngulo anterior): O córtex frontal medial é fundamental na motivação e no início da ação. A lesão do mesmo se caracteriza por apatia, diminuição da condução, “pseudodepressão”, bradicinesia, diminuição da atenção, pobre motivação e desinteresse (Cummings, 1996). Às vezes mutismo acinético. Responde ao tratamento com agonistas da dopamina (Bromocriptina, Metilfenidato) pois se presume um comprometimento nas vias dopaminérgicas ascendentes, terapia cognitiva, estimulação física da linguagem, terapia ocupacional e física. A esquizofrenia tipo II tem sido associada a hipometabolismo pré-frontal dorsolateral. Dorsolateral (convexidade): O córtex pré-frontal dorsolateral medeia funções neuropsicológicas como mudança ou manutenção de uma ação, planejamento motor, fluência verbal, memória de evocação e preparação de estratégias para a resolução de problemas. A lesão do mesmo é acompanhada de irritabilidade e transtornos cognitivos (pensamento concreto), perseveração, julgamento pobre, transtornos de memória, dificuldades na resolução de problemas e depressão (sem disforia, nem mudanças neurovegetativas, nem desesperança) (Cummings, 1996). É manejado com estabilizadores do humor como os anticonvulsivantes (Carbamazepina, Ácido Valproico), bloqueadores dos canais de Ca++, terapia comportamental, manejo do ambiente e simplificação das rotinas diárias. A depressão tem sido associada a hipometabolismo pré-frontal lateral. Orbitofrontal: O córtex orbitofrontal medeia funções como moderação da interação social, comportamento em público e estabilidade afetiva. A lesão do mesmo conduz o paciente a uma marcada desinibição, euforia e impulsividade; pouca empatia, pouca consciência da doença, irritabilidade e labilidade afetiva (sem aumento da atividade motora, nem energia excessiva, nem transtorno do sono) (Cummings, 1996). É manejado com beta-bloqueadores (Pindolol) mais Carbamazepina, Buspirona, ISRS, estrógenos, manejo do ambiente, terapias comportamentais. Pode ser observado na esclerose múltipla. O transtorno obsessivo-compulsivo tem sido associado a hiperatividade orbitofrontal. Frontal-subcortical: Refere-se às conexões entre o córtex frontal, o núcleo caudado, o globus pallidus e os núcleos talâmicos (dorsomediales). Sua lesão se caracteriza por perseverações, apatia, transtornos na memória de evocação mas não de reconhecimento, interpretação concreta de provérbios, ecopraxia e impulsividade. Pode ser observado nas demências subcorticais (Parkinson, Huntington, Wernicke-Korsakoff). Motor-premotor: Envolve área 4 e 6, área motora suplementar, parte dos campos visuais frontais (área caudal 8) e partes da região de Broca (área 44). Dependendo de sua localização, o dano deste componente do lobo frontal resulta em fraqueza, alteração do tônus muscular, liberação de reflexos, mutismo, acinesia, apraxia, incontinência, aprosodia e afasia de Broca (Mesulam, 1996).

 

TUMORES CEREBRAIS

 

Originam sinais neurológicos, cefaleia, náuseas, vômito, convulsões, transtornos visuais com papiledema e sintomas psiquiátricos, devido ao efeito de massa e ao aumento da pressão intracraniana. Sua localização determina a sintomatologia psiquiátrica; assim: no lobo frontal, levam a depressão, afeto inapropriado, desinibição, demência, sintomas psicóticos (Gaviria, 1995). No lobo temporal, ansiedade, depressão, alucinações (gustativas e olfatórias), psicose esquizofreniforme. No lobo parietal, comprometimento de funções mentais superiores como agnosias, apraxias e afasias.


 

ENFERMEDAD CEREBRO-VASCULAR (ECV)

 

Segundo o tipo de região comprometida pela ECV, apresentam-se diversos sintomas:

  • Apatia, por comprometimento do lobo frontal direito e parte medial do cíngulo. Tratamento: Bromocriptina, Ritalina.
  • Choro e riso patológicos com lesão do lobo parietal direito. Tratamento: Antidepressivos (Nortriptilina).
  • Psicose ou alucinações. Tratamento: Risperidona.
  • Mutismo acinético, devido a infarto talâmico.
  • Desorganização catastrófica. Tratamento: Antidepressivos, Buspirona.
  • Mania, comprometimento do lobo frontal direito.
  • Depressão “post-stroke”. Tratamento: antidepressivos. (ver trastornos del afecto).

 

TRAUMA ENCEFALOCRANENANO (TEC)

 

A amnésia pós-traumática está frequentemente presente e o transtorno de memória pode persistir. Apresentam-se, além disso, afasia, transtornos na atenção, irritabilidade, ansiedade, depressão, labilidade afetiva, apatia, agressividade, agitação, psicose pós-traumática, delírios, mudanças na personalidade e, raramente, demência. Em casos de agitação, o Haloperidol em doses de 1-2 mg c / 30-60 minutos V.O. é útil e seguro. Em agressividade, vários estudos sugerem a utilidade dos beta-bloqueadores (Wilson, 1993).


 

EPILEPSIA

 

  1. Definição: Transtorno paroxístico da função cerebral de começo súbito, curta duração e recorrente (não necessariamente convulsão), devido a uma descarga neuronal excessiva, desordenada, sincrônica e rítmica de um grupo ou da totalidade das neuronas cerebrais corticais (no caso de convulsões generalizadas), que se acompanha em algumas ocasiões de movimentos clônicos ou hipertonia da musculatura esquelética por sua contração súbita de forma localizada ou generalizada (Uribe, 1991b) [FIG. 17].
  2. Etiologia: A etiologia é variável, incluindo vários fatores: 1) genéticos. A epilepsia de crises generalizadas tem um claro componente hereditário, já que é 10 vezes mais comum entre pais, irmãos e filhos de doentes seguindo um padrão de herança poligênica e na epilepsia mioclónica juvenil suspeita-se de uma associação com os loci BF e HLA do cromossomo 6p (Greenberg et al., 1988). Na epilepsia de crises parciais, o componente genético é menos importante, mas alguns dos subtipos se associam a alterações nos cromossomos 10q 22-24 e 20q 13.2 (epilepsia del lóbulo frontal nocturna) (Ottman et al., 1995; Phillips et al., 1995). 2) ambientais. Obstétricos (anoxia perinatal p.ej.), infecções do SNC, doenças virais infantis, trauma encefalocraneano ou enfermedad cerebrovascular, mais frequentes na epilepsia de crises parciais (Uribe, 1991b). O comprometimento do SNC pela presença de algum desses fatores permite a ativação espontânea e não controlada de grupos neuronais que em alguns casos pode envolver regiões adjacentes. As características dessas despolarizações determinarão o tipo de manifestação epiléptica em um dado paciente. Nas crises parciais, apresenta-se uma diminuição sináptica inibidora (controlada por GABA) e um aumento da excitatória (sob controle glutamatérgico). A diminuição do GABA em apenas 20% no nível da sinapse pode desencadear a atividade epileptiforme. A atividade convulsiva não depende apenas da descarga neuronal tipo tudo ou nada, como se observa nas crises generalizadas. A “ativação induzida”, chamada fenômeno kindling, foi deduzida a partir de modelos animais mediante a aplicação focal repetida de descargas subconvulsivas na amígdala cerebral que terminavam por produzir uma amplificação da atividade convulsiva (diminuição do limiar convulsivo) até conseguir uma convulsão. Uma vez induzido, o kindling persiste por toda a vida (Goddard, 1967) e é utilizado para explicar a recorrência das crises convulsivas na ausência de gatilhos eletrofisiológicos. O kindling depende da ativação de receptores NMDA por glutamato (McNamara, 1994). Durante uma crise convulsiva parcial, os neurônios apresentam despolarizações e potenciais de ativação em frequências altas. A Carbamazepina, Lamotrigina, o Valproato e a Hidantoína inibem a ativação de alta frequência ao diminuir a capacidade dos canais de Na+ para se recuperarem à mesma. Além disso, ao aumentar o GABA, aumentam o limiar convulsivo (McDonald & Kelly, 1993). As convulsões generalizadas não se iniciam em uma área circunscrita, mas na ativação recíproca do tálamo e do córtex. Nas crises de ausência, por exemplo, a estimulação de baixa frequência do tálamo medial, desencadeia descargas corticais em espiga seguidas por ondas lentas em uma frequência de 3 ciclos / segundo. Isso se deve à corrente T de baixo limiar tipo marcapasso dependente de Ca++, que pode ser bloqueada com antagonistas de canais de Ca++ tipo T (Valproato, Etosuximida, Trimetadiona) (McDonald & Kelly, 1993).
  3. Diagnóstico e classificação: O diagnóstico é basicamente clínico, utilizando-se o EEG apenas para sua confirmação (em menores de 16 anos o EEG não tem valor prognóstico). A classificação de maior aceitação é a Clasificación Internacional de las Crisis Epilépticas de la Liga Internacional contra la Epilepsia aprovada em Kyoto (Japão) em 1991, a qual agrupa os síndromes epilépticos em: 1. Epilepsias y síndromes relacionados con la localización; 2. Epilepsias y síndromes generalizados; 3. Epilepsias y síndromes indeterminados (localizados ou generalizados como crisis neonatales ou epilepsia durante el sueño de ondas lentas ou epilepsia mioclónica severa en la infancia) e 4. Síndromes especiales (convulsiones febriles ou crisis aisladas, p.ej.) (Commission of ILAE, 1989). Até 1981, assumia-se a seguinte classificação, a qual é mencionada por ser prática para uma primeira aproximação: Crises parciais (focales): Ativação inicial de um sistema de neurônios limitado a uma parte de um hemisfério cerebral.
    • Simples: Sem transtorno de consciência. Pode progredir para complexa ou generalizada. São movimentos de uma região (que podem propagar-se, crisis Jacksonianas), cuja origem é o córtex pré-rolândico contralateral; podem ser acompanhados de componente sensitivo (parestesias) e podem durar cerca de 20 a 30 segundos. É preciso descartar neurocisticercosis, tumores, TEC… Em outros casos, podem comprometer movimentos oculares ou cefálicos (crisis versivas), linguagem (crisis fonatorias, palilalia epiléptica), visualização de cores ou manchas ou alucinações (crisis visuales), alucinações olfatórias (crisis uncinadas, com comprometimento do hipocampo por tumor), sintomas dismnésicos (déjà vu y jamais vu, déjà entendu y jamais entendu), sensações de formigamento ou entorpecimento (crisis somatosensoriales), alucinações auditivas (crisis auditivas), transtornos cognitivos (estados de ensoñación, distorções do sentido do tempo, sensações de irrealidade, desdobramento ou despersonalização), sintomas afetivos (angústia, depressão, ira, medo, risa). A epilepsia del lóbulo temporal se caracteriza por sentimentos de desrealização e déjà vu, alucinações auditivas ou visuais transitórias, sentimentos de despersonalização, medo ou raiva, delírios e desejos sexuais (Kandel, 1995).
    • Complejas: Comprometimento da consciência; de origem temporal em 85% dos casos e comprometimento bilateral frequentemente que costuma durar mais de 60 segundos e raramente menos de 10 segundos. O paciente apresenta alteração do comportamento com amnésia e automatismos e sintomas psicóticos. Os automatismos são uma atividade motora mais ou menos coordenada e adaptativa que ocorre durante o estado de alteração da consciência no transcorrer de, ou após, uma crise epiléptica, e usualmente seguida de amnésia do evento, por uma descarga que compromete várias áreas do sistema límbico. Podem ser de tipo alimentar, da mímica, gestuais, ambulatórios, verbais. Pode generalizar-se e ser provocada com privação de sono. Crises generalizadas: Por descarga neuronal que se dissemina para ambos os hemisférios.
    • Tônico-clónicas: Começo fulminante com perda de consciência, fase tônica (grito, hipertonia, queda, evacuação vesical, cianose), fase clónica (sacudida das extremidades, sudorese, midríase, salivação, pulso lento a rápido). Alguns pacientes experimentam uma vaga sensação de mal-estar como advertência. As três fases duram cerca de 2 a 5 minutos e dão lugar a um estado de estupor profundo que dura 4 a 5 minutos. Finalmente, o paciente apresenta confusão, desorientação, cefaleias, mialgias. O EEG mostra espículas de alta amplitude que podem se localizar em grupos ou estar separadas por ondas lentas, para finalmente dar lugar a ondas delta de baixa amplitude.
    • Ausências: Desenvolvem-se na infância (6 a 10 anos) e às vezes desaparecem na puberdade. Caracterizam-se por interrupção súbita da atividade, com olhar fixo, mutismo por espaço de 5 a 10 segundos e depois reinício da atividade prévia. São frequentes (10 a 100 episódios por dia) e podem ser desencadeadas com hiperventilação ou estimulação fótica. Tem sido relacionada com um gene autossômico dominante. No EEG, observa-se padrão de espícula-onda lenta de 3 ciclos / segundo (Hz), sincrônico e de alta voltagem. A disfunção psicopatológica pode ocorrer neste tipo de epilepsia na forma de alucinações, delírios, agitação severa, hiperatividade, depressão ou euforia, afasia, mutismo, estados catatônicos, condutas automáticas, transtornos da expressão, pensamento e memória, sentimentos de estranheza…(também apreciáveis nas crises parciais por comprometimento do lobo temporal).
    • Mioclonías: Contrações musculares breves de membros superiores, principalmente nas manhãs, com explosões breves de espículas múltiplas no EEG.
    • Crisis atónicas: Perda súbita do tônus muscular com queda, mas sem inconsciência. Em ataques mais prolongados, a queda pode ser progressiva de maneira que ocorra um relaxamento rítmico sequencial.
    • Espasmos infantiles (síndrome de West): A partir dos primeiros meses de idade. Apresentam-se como crises em adução e flexão de curta duração e usualmente simétricas. Tendem a se apresentar em grupos ao a criança dormir ou acordar, ou por irritabilidade. É comum a presença de um transtorno neurológico de base e podem levar ao retardo mental.

    Manifestações interictales: As manifestações interictais consistem em mudanças crônicas da estrutura da personalidade, como aumento da agressividade, emocionalidade intensa, religiosidade ou moralismo extremo, perda do humor e do interesse sexual (excessiva expressão dos afetos e ideias sobre-elaboradas) (Kandel, 1995). As associações entre epilepsia e tipo de psicopatologia dependem da localização do foco epileptógeno, como mostra um estudo realizado em 40 pacientes com epilepsia focal que foram avaliados com SPECT no período interictal e com diferentes escalas como Beck Depression Inventory (BDI) e Leyton Obsessional Inventory (LOI), entre outras. Este estudo mostrou que os pacientes com um foco no lado esquerdo, apresentaram altos níveis na BDI, associados com hipoperfusão bifrontal e pacientes com um foco no lado direito, apresentaram altos níveis na LOI associados com hiperperfusión frontotemporal derecha, caudado e tálamo (Trimble et al., 1995).

    • Psicosis: Prevalência de 9.1%, com uma incidência anual de 0.3% em 1285 pacientes (a maioria com epilepsia del lóbulo frontal) de um estudo japonês. Os sintomas assemelham-se a uma esquizofrenia de tipo crônico presente em 4.6% dos pacientes e que é precedida por mudanças de personalidade; manifesta-se com ilusões e alucinações auditivas paranoides (esquizofreniformes) (Onuma et al., 1995). Diferencia-se do transtorno psicótico como tal pelo menor comprometimento do afeto, menor incidência familiar e história de epilepsia por vários anos. Geralmente há comprometimento do lobo temporal dominante. As psicosis postictales caracterizam-se por episódios psicóticos que se apresentam após os primeiros 7 dias de ocorrida uma série de convulsões e que são acompanhados de alterações no SPECT (hiperperfusión frontal mesial) sem mudanças no EEG durante os episódios psicóticos (Baumgartner et al., 1995). O delírio orgânico pode inclusive dever-se aos próprios anticonvulsivantes que levam à diminuição do ácido fólico e vitamina B12. A maior dose de anticonvulsivantes, maior risco de psicose em epilépticos.
    • Trastornos de personalidad: Mudanças no comportamento sexual (hiposexualidade), religiosidade marcada, viscosidade (pedantismo, detalhismo, circunstancialidade, hipergrafia…).
    • Outros transtornos: Transtornos da conduta (hipercinesia, impulsividade, farmacodependencia), transtornos do afeto (depressão, ansiedade) e transtornos de aprendizado. A sintomatologia depressiva em pacientes com transtornos convulsivos difere daquela própria dos pacientes com Trastorno depresivo mayor, pois somente foram encontradas alterações como baixo nível de energia, afeto triste e pessimismo em mais de 30% de 280 pacientes avaliados com a Beck Depression Inventory (Levy et al., 1995).
  4. Epidemiologia: Na Colômbia, a prevalência é de 10.8 / mil e em Medellín de 21.38 / mil (alta em relação a outras cidades do país, por maior registro?); 7% dos pacientes infantis entre 1 e 6 anos de idade podem ter convulsões febris. Além disso, é 3 a 7 vezes mais comum em pacientes psicóticos (Uribe, 1991b).
  5. Tratamento: Os anticonvulsivantes têm perfis diferentes e, por isso, são utilizados em alguns, mas não em todos os tipos de crises [FIG. 18]. Alguns atuam por ativação do receptor GABAA (barbitúricos e BZDs), por aumento da descarga de GABA pré-sináptico (Gabapentín) ou por diminuição da degradação enzimática do GABA pelas mãos da GABA-transaminasa (Vigabatrina e Valproato). Outros impedem a recuperação dos canais de Na+ ativados por voltagem e se comportam como antikindling (Difenilhidantoína, CBZ, Lamotrigina), ou inibem a ativação de receptores AMPA (barbitúricos), ou diminuem as correntes de Ca++ de baixo limiar (T) e sua atividade oscilatória em neurônios talâmicos (Etosuximida). Os anticonvulsivantes de segunda geração são mencionados em primeiro lugar, pois são agora os fármacos de eleição para epilepsia. A eficácia máxima alcançada é mencionada entre parênteses (Pellock, 1989; Mattson et al., 1992):
    • Tónico-clónicas generalizadas: Carbamazepina (75%), Ácido Valproico (75%), Oxcarbazepina (75%), Fenobarbital nos primeiros 12 meses (75%), Difenilhidantoína (75%).
    • Ausências: Clonazepam (rápido desenvolvimento de tolerância), Valproato sódico (> 74%), Etosuximida (74%), Trimetadiona, Acetazolamida, Lamotrigina.
    • Parciales: Carbamazepina (65%), Ácido Valproico (65%), Oxcarbazepina (52% a 60%), Difenilhidantoína (65%), Fenobarbital (50%), Primidona (50%), Felbamato (50%), Gabapentín (> 50%), Lamotrigine (50% em crises refratárias).
    • Mioclonías, acinesias, ausencias atípicas: Clonazepam, Diazepam, Ácido Valproico (40% em mioclonias malignas).
    • Espasmos infantiles: ACTH, corticosteroides. As respostas, em geral, como pode ser apreciado, são da ordem de 50% inicialmente, com 25% adicional no tratamento crônico, especialmente naqueles pacientes com epilepsia de início recente (Elwes et al., 1984). Tais medicamentos anticonvulsivantes podem ser medidos no sangue para estabelecer se o paciente se encontra no intervalo terapêutico ou não, ou se está próximo do nível tóxico, embora nunca cheguem a ser tão confiáveis quanto a clínica (nistagmo, ataxia, disartria, dismetria…). Se não houver controle das crises com níveis plasmáticos adequados, sugere-se mudar o anticonvulsivante antes de associá-lo. Se o descontrole persistir, a associação pode ser utilizada como alternativa (tabla 6). Deve-se ter em conta, além disso, que o paciente deve evitar o consumo de álcool, a privação de sono e esportes como equitação, ciclismo, natação ou atividades laborais que possam colocar em perigo sua vida e a dos demais. Na infância, não se deve iniciar o tratamento na primeira crise e em adultos é preciso confirmar o diagnóstico (com pelo menos 2 crises típicas). Em grávidas com epilepsia, o risco de mortalidade de seus filhos é muito maior que em grávidas normais. Embora os anticonvulsivantes possam reduzir significativamente essa mortalidade ao controlar as crises, deve-se ter em conta que foram associados a teratogênese (7% das gestações vs. 2 a 3% da população geral). O maior risco de teratogênese se apresenta com Trimetadiona e com Ácido Valproico (espina bífida e risco de defeitos do tubo neural) e com as combinações de anticonvulsivantes. Com a CBZ, foram descritos defeitos craniofaciais, hipoplasia das unhas e atraso do desenvolvimento. A correção do déficit de ácido fólico pode reduzir a apresentação de tais dismorfismos (Lindhout & Omzigt, 1994). 60% dos pacientes respondem à monoterapia, mas o restante requererá um esquema politerapêutico com taxas de resposta adicionais de 10% a 15%. Existem medicamentos que podem ser associados aos diferentes anticonvulsivantes para o controle da epilepsia refratária (com taxas de resposta da ordem de 30% a 50%) como o Gabapentin [NEURONTIN], 900-1800 mg/dia em três tomadas (máx. 2400 mg/dia) (Bebin & Bleck, 1994), Vigabatrín [SABRIL], 25-100 mg./kg./dia em três tomadas (McDonald & Kelly, 1994), Lamotrigine, 500 a 700 mg./dia (Messenheimer, J.A., 1995) ou Flunarizina [SIBELIUM], 10-20 mg/dia (máx. 60) (Starreveld et al., 1989), em crises parciais simples ou complexas e tônico-clônicas generalizadas secundárias, mas não em crises de ausência. Com respeito à suspensão do tratamento, um estudo prospectivo com 92 pacientes que apresentavam crises generalizadas ou parciais, e que estavam em tratamento por 2 anos com um único fármaco sem apresentar convulsões, mostrou que a suspensão daquele conduzia à apresentação de recorrências em apenas 33% dos pacientes (a porcentagem era um pouco maior com as crises parciais complexas ou um EEG anormal) (Callaghan et al., 1988). Em uma metanálise de 25 estudos, encontrou-se que a proporção de pacientes que recorriam após a suspensão do antiepiléptico variava de 12% a 67% (20% a 40% para a maioria de tais estudos). O risco de recorrência é de 25% ao ano e 29% aos 2 anos. No entanto, até 26% dos pacientes que continuavam tomando a medicação aos 2 ou 4 anos também mostravam recorrências, sugerindo que, após esse tempo, o risco depende mais do curso natural da doença e não tanto da suspensão do antiepiléptico; portanto, um intervalo livre de convulsões de 2 anos é adequado para a suspensão do antiepiléptico de forma paulatina (durante 12 meses: 20% a cada 2 a 3 meses). Em crianças e grávidas, considerar suspensão precoce (Berg & Shinnar, 1994). Uma revisão posterior dos mesmos autores, analisa os fatores de risco para recorrência após a descontinuação da medicação antiepiléptica. Eles estudaram 264 crianças epilépticas que estavam em tratamento por um período médio de 2.9 anos, sem apresentar nenhuma convulsão. Encontram que a epilepsia de início na infância é de melhor prognóstico que aquela cujo início ocorre após os 12 anos (a de início na idade adulta é surpreendentemente comparável à da infância). Igualmente, os pacientes com epilepsia sintomática remota (por lesão estrutural), com convulsões febris atípicas ou epilepsia mioclónica juvenil, alcançam menores taxas de remissão do que aqueles com epilepsia criptogênica ou a idiopática (66% vs. 36%). O EEG prévio à descontinuação do fármaco é importante, já que se for anormal (lentificação), prediz um maior risco de recorrência (56% vs 26%) (Shinnar & Berg, 1995). Existem síndromes epilépticos que se curam sozinhos com a idade; 50% se curam após um tratamento farmacológico de 2 a 4 anos; 20% são controlados mas não se curam e requerem tratamento para toda a vida e existe outro tanto de caráter maligno que são controlados parcialmente ou são progressivos sem melhorar com nenhuma medicação (epilepsia refratária). O prognóstico em geral é bom quando o início da epilepsia ocorre após o primeiro ano de idade (2 a 5 anos), quando as crises são unicamente generalizadas ou parciais complexas, de caráter idiopático, sem maiores anormalidades no EEG, QI alto, ausência de antecedentes familiares de epilepsia, ausência de transtornos de personalidade e início do tratamento no primeiro ano de aparecimento das crises. O prognóstico é ruim quando essas condições não são cumpridas ou quando as crises são variadas, Jacksonianas, febris atípicas ou em caso de epilepsia mioclónica juvenil.

 

TRASTORNO AMNÉSICO POR AFECCIÓN NO PSIQUIÁTRICA

 

  1. Definição: Transtorno da memória de curto ou longo prazo devido a causa orgânica sem outro transtorno associado. A habilidade para aprender e recordar nova informação está sempre afetada, os problemas para recordar informação já aprendida não são tão comuns. A habilidade para repetir imediatamente uma informação sequencial não está alterada. Não se apresentam transtornos cognitivos. A confabulação frequentemente se evidencia pela recitação de eventos imaginários, sobretudo no começo do tratamento. A amnésia marcada pode resultar em desorientação no tempo e no espaço, raramente em pessoa. O insight sobre seu transtorno é pobre e pode negar a presença do problema. Podem ser encontrados apatia, perda de iniciativa, embotamento emocional (American Psychiatric Association, 1994) (tabla 7).
  2. Etiologia: Déficit de tiamina por dependência ao álcool (síndrome de Korsakoff, seguido da encefalopatía de Wernicke [ver capítulo farmacodependencia]); sedativos, ansiolíticos e hipnóticos também podem levar ao transtorno amnésico persistente, assim como a utilização de antipsicóticos com efeitos anticolinérgicos como a Clorpromazina (Tune et al., 1982). Também devido a trauma encefalocraneano, cirurgia, hipoxia, infarto no território de irrigação da artéria cerebral posterior, encefalitis por herpes simple, que costumam comprometer diencéfalo e lobo temporal (hipocampo, fornix, cuerpos mamilares). O transtorno de memória é uma das mais comuns sequelas dos pacientes com TEC, em especial quando há perda de consciência superior a 20 minutos e se apresentam outras complicações neuropatológicas. Os pacientes com lesões microscópicas no nível do tronco cerebral e da matéria branca profunda exibem um perfil subcortical de transtorno de memória, com comprometimento da evocação livre sem alterações nos test de reconocimiento (Delis, 1993).

 

TRASTORNO CATATÓNICO POR AFECCIÓN NO PSIQUIÁTRICA

 

Partindo da presença de sinais motores como mutismo, estereotipia, posturismo, catalepsia, obediência automática, negativismo, ecolalia / ecopraxia ou estupor, Abrams & Taylor estudaram 56 pacientes durante 14 meses, encontrando que apenas 7% satisfaziam os critérios do RDC (Research Diagnostic Criteria) para esquizofrenia, enquanto dois terços apresentavam um transtorno afetivo (62% mania e 9% depressão endógena). Os 22% restantes tinham etiologia orgânica como causa da catatonía (epilepsia, psicose tóxica, encefalitis, degeneración alcohólica e psicosis inducida por drogas). Adicionalmente, a resposta ao tratamento não teve relação direta com o número de sinais motores encontrados em cada paciente, que para os pacientes com transtornos afetivos foi de 3.7 características catatônicas em média (Abrams & Taylor, 1976). Em 1832, Calmeil, um estudante de Esquirol, descreveu um grupo de pacientes que apresentavam agitação, hiperatividade e alucinações auditivas, e que subitamente se tornavam estuporosos e morriam como causa de uma grande hipertermia (43.3 oC). Stauder, que cunhou o termo de catatonía fatal, considerou a doença como própria de adultos jovens e encontrou edema cerebral e hemorragias nos tecidos post-mortem, postulando fatores orgânicos como os responsáveis. Este tipo de catatonía só responde à intervenção oportuna com TEC (Penn et al., 1972). Relatos isolados sobre sinais catatônicos em entidades médicas gerais incluem: lesões do pallidum (parkinsonismo), encefalitis viral, lesões vasculares do lobo temporal, tumor do septum pellucidum (fornix), infarto hemorrágico bilateral do cíngulo anterior, tumores e hemorragias do terceiro ventrículo, lesões focais do tálamo, tumores do lobo frontal, pinealoma, tumores do corpo caloso, angioma do cérebro médio, aneurisma da artéria cerebral anterior, malformação arterial da circulação posterior, trombosis de la arteria basilar, trauma cerebral difuso, trauma cerrado del cráneo, status epilepticus de pequeno mal (crises parciais complexas), estados pós-ictais, encefalopatía de Wernicke, esclerosis tuberosa, fase aguda da encefalitis letárgica, febre tifoide, malária, hepatite viral, sepse, cetoacidosis diabética, hipercalcemia (adenoma paratiroideo), hipertiroidismo, enfermedad de Addison, enfermedad de Cushing, pelagra, porfiria intermitente aguda, homocistinuria, glomerulonefritis membranosa, encefalopatía hepática, abstinência a hipnosedantes, intoxicações com mescalina, álcool etílico, anfetaminas, PCP, aspirina e altas doses de antipsicóticos (síndrome neuroléptico maligno), a causa orgânica mais frequente de catatonía (Gelenberg, 1976; Gelenberg & Mendel, 1977; Rogers, 1985; Mann et al., 1986; Hyman, 1988) (tabla 8).


 

CAMBIO DE PERSONALIDAD POR AFECCIÓN NO PSIQUIÁTRICA

 

As mudanças de personalidade devidas a afecção sistêmica supõem uma diferença do estado prévio de personalidade do indivíduo, que devem ser diferenciadas dos distúrbios do comportamento que ocorrem frequentemente diante de certas circunstâncias ambientais. As manifestações comuns de mudanças de personalidade incluem instabilidade afetiva, pobre controle de impulsos, agressividade, apatia marcada, suspicacia ou ideação paranoide. Várias entidades podem conduzir a este transtorno, como tumores cerebrais, TEC, ECV, infecção com HIV, LES… (em especial se comprometem o lobo frontal ou estruturas subcorticais) (American Psychiatric Association, 1994) (tabla 9). Yudofsky et al. Expressaram seu desacordo com esta categorização diagnóstica e propõem um diagnóstico de Trastorno agresivo orgánico para descrever a condição específica de descontrole ou raiva e violência secundárias a lesões cerebrais caracterizado pela reatividade a estímulos triviais, pela não-planejamento do mesmo, por ser explosivo, periódico e egodistônico (Yudofsky et al., 1995). Entre as entidades que poderiam gerar episódios de agressividade estão: TEC, ECV, hipoxia, desbalanço hidroeletrolítico, uremia, enfermedad de Alzheimer, enfermedad de Huntington, enfermedad de Wilson, enfermedad de Parkinson, esclerosis múltiple, LES, tumores cerebrais, encefalitis, meningite, SIDA, epilepsia, hiper e hipotireoidismo, hipoglicemia, deficiências vitamínicas, porfiria… Os medicamentos também poderiam desencadear esses episódios: álcool, barbitúricos, BZD, opiáceos, esteroides, antidepressivos, anfetaminas, cocaína, antipsicóticos (acatisia) e drogas anticolinérgicas (síndrome anticolinérgico central) (Yudofsky et al., 1995). Quanto ao tratamento, em casos específicos e por curtos períodos de tempo, os antipsicóticos e as BZD poderiam ser de utilidade no paciente agitado. O Lorazepam é um medicamento efetivo no controle e manejo de pacientes violentos em um serviço de emergência (Bick & Hannah, 1986) e o Clonazepam é útil em pacientes idosos agitados (Freinhar & Alvarez, 1986). A Buspirona demonstrou ser efetiva no manejo dos pacientes com agressão e agitação por trauma cerebral e demência a longo prazo, pois seu período de latência é de 3 a 6 semanas (Colenda, 1988; Tiller et al., 1988; Gualtieri, 1991; Ratey et al., 1992). A Carbamazepina e o Ácido Valproico podem ser efetivos em reduzir o comportamento agressivo associado a transtornos cerebrais orgânicos e a demência, nas mesmas doses utilizadas para o manejo do Trastorno bipolar (Mattes, 1988; Gleason & Schneider, 1990; Giakas et al., 1990). O valor do Lítio no controle da agressão, limita-se a pacientes com retardo mental, já que naqueles com lesão cerebral podem apresentar sensibilidade aumentada aos efeitos neurotóxicos do Lítio (Moskowitz and Altshuler, 1991). Os antidepressivos com perfil serotoninérgico demonstraram ser úteis no controle da agressão associada a lesões cerebrais; tal é o caso de Trazodone (Pinner & Rich, 1988), Fluoxetina e Sertralina (Coccaro et al., 1990). Finalmente, o Propranolol (20-60 mg./dia inicialmente até 12 mg./kg./dia) é útil no controle da agressão e dos comportamentos violentos em pacientes com síndromes cerebrais orgânicas, tendo-se em conta que sua latência terapêutica é de 6 a 8 semanas (Yudofsky et al., 1995).


 

TRASTORNOS DE LA SEXUALIDAD

 

 

INTRODUÇÃO AL CONCEPTO DE GÉNERO

 

O que é a sexualidade humana? Existe a educação sexual como termo independente de qualquer abordagem à saúde mental? São necessários educadores “idôneos” da sexualidade? Ou devemos empreender outro processo na responsabilidade pessoal com respeito à educação sexual, ao assumir uma forma particular de entender a sexualidade? Dar resposta a esses ou outros questionamentos sobre a sexualidade e a educação sexual sempre foi uma preocupação de diversas disciplinas que estudam e abordam o quefazer humano. O que é possivelmente claro é que a família é a educadora sexual por excelência e que a educação sexual não é responsabilidade de poucos, mas de toda a sociedade. Mas, até que ponto grande parte dessa sociedade está capacitada para a educação sexual? É preciso encontrar solução para cada uma das inquietações a partir de uma análise coerente e reflexiva, requerendo para isso uma base acadêmica articulada com as inquietações surgidas a partir do planteamento do social. Assim, para falar de sexualidade humana, é primordial diferenciar entre sexo e gênero, para entender depois em que poderia consistir a educação sexual, se é que algo parecido existe. Sexo é a diferença meramente anatômica que existe entre o macho e a fêmea. Gênero é uma construção cultural do que se entende por masculino e feminino, e que faz referência aos aspectos não biológicos da sexualidade (práticas, símbolos, representações, normas e valores sociais que as sociedades elaboram a partir da diferença sexual anátomo-fisiológica). Identificar-se como homem ou mulher requer um processo árduo; não pelo fato de nascer varão ou fêmea se é um homem ou uma mulher. A formação da pessoa para assumir seu gênero inicia-se antes do nascimento a partir dos projetos construídos sobre o novo ser por parte dos pais, e continua enquanto o sujeito aprende a manipular os objetos, assimila as relações sociais e toma posições diante das demandas sociais. A socialização se prolonga durante toda a vida, mas é importante ter em conta que a socialização primária, ou seja, a que se realiza nos primeiros anos de vida dentro do ambiente familiar, é a de maior transcendência. Mas, como o homem ou a mulher assumem seu gênero? Do ponto de vista biológico, diversos estudos revelam pequenas diferenças no tamanho de algumas áreas diencefálicas entre o homem e a mulher, e entre homens homossexuais e heterossexuais (Le Vay, 1990). De toda forma, é muito prematuro ainda afirmar que aquelas condições biológicas especiais marcam a gênese da identidade de gênero de forma exclusiva; a tendência atual é aceitar uma postura eclética de interrelação entre as causas biológicas e psicossociais na gênese de uma determinada orientação sexual, na qual também participariam mecanismos comportamentais de reforço de conduta e condições particulares do ambiente.

 

FISIOLOGIA DE LA RESPUESTA SEXUAL

 

  1. Fase de deseo (apetitiva): Sensação subjetiva de tensão sexual prazerosa (antecipatória) caracterizada por fantasias sexuais e o desejo de ter sexo. Disfunção: Trastorno del deseo sexual hipoactivo; Trastorno de aversión sexual.
  2. Fase excitatoria: Lubrificação vaginal e ereção peniana por mecanismos reflexos periféricos ou psicológicos centrais com sensação objetiva de prazer. Disfunção: Trastorno femenino de la excitación sexual; Trastorno de erección masculina.
  3. Fase de meseta: Máximo desenvolvimento com ereção total e completa no homem e plataforma orgásmica no terço inferior da vagina na mulher.
  4. Fase orgásmica: Emissão (iminência ejaculatória) e ejaculação no homem; contrações rítmicas clônicas (3-8 c / 0.8 seg.) na mulher, com pico de prazer sensual e liberação da tensão sexual. Disfunção: Anorgasmia femenina; eyaculación retardada; eyaculación prematura.
  5. Fase de resolución: Sensação de relaxamento geral. O homem torna-se refratário à estimulação sexual; a mulher, em contraste, tem um potencial multiorgásmico, sem período refratário. Não há disfunções conhecidas nesta fase.

 

DISFUNCIONES SEXUALES

 

As disfunções sexuais caracterizam-se por uma alteração no processo que caracteriza a resposta sexual ou por dor associada ao coito. Podem ter múltiplas causas que se resumem em orgânicas e “psicogênicas”. Estas últimas constituem 70-90% de todas as disfunções e se devem a problemas intrapsíquicos ou interpessoais que são acompanhados de intensa ansiedade prévia ao ato sexual; as causas psicogênicas podem ser generalizadas ou limitadas a uma situação específica e estar presentes desde o começo da atividade sexual ou ser de tipo adquirido. Entre as causas orgânicas, que devem ser descartadas em primeiro lugar, encontramos: Epilepsia temporal, esclerosis múltiple, lesiones hipotalámicas y del hemisferio derecho (diminuição da libido), lesiones del lóbulo frontal o diencéfalo, síndrome de Klüver-Bucy, anfetaminas, cocaína, hipertiroidismo, hipercortisolismo (hipersexualismo), lesiones medulares (comprometimento de neurônio motor inferior e do arco reflexo), diabetes mellitus, hipogonadismo primario y secundario (eunucoidismo ou hiposexualismo), arteriosclerosis, alcoholismo… Em caso de disfunções por condição médica geral ou pelo uso de substâncias, deve-se especificar a patologia ou substância presentes (American Psychiatric Association, 1994).

  1. Secundarias a medicaciones: Os fármacos usados em psiquiatria estão entre os medicamentos que mais produzem alterações na ereção, na ejaculação, no desejo sexual em ambos os sexos e no orgasmo feminino. A seguir, mencionam-se alguns transtornos relacionados ao seu uso e seu manejo:
    • Antidepresivos tricíclicos e IMAO’s: Comprometimento da ejaculação e do orgasmo feminino por seu efeito anti-1 e anticolinérgico (Sadock, 1995). Comprometimento da ereção por seus efeitos anticolinérgicos (exc. Desipramina). Imipramina, Clomipramina e Nortriptilina foram implicadas na aparição de orgasmo feminino inibido (Gross, 1982; Sorscher, 1986; Segraves, 1987).
    • Antipsicóticos: Comprometimento da ereção por seu efeito antidopaminérgico, especialmente com butirofenonas, Flufenazina (Bartholomew, 1968) e Pimozide (Ananth, 1982). As fenotiazinas alifáticas (Hollister, 1964), a Tioridazina (Kotin et al., 1976) e a Trifluoperazina (Sadock, 1995) possuem, além disso, propriedades anticolinérgicas e alfa-bloqueadoras que comprometem a ereção, a ejaculação e o orgasmo feminino. A Tioridazina causa ejaculação retrógrada em até 50% dos que a consomem.
    • Antidepresivos serotoninérgicos: O Trazodone pode produzir priapismo por bloqueio 1 adrenérgico, enquanto os ISRS podem inibir o desejo sexual e o orgasmo em ambos os sexos devido ao aumento nos níveis de serotonina. A Ciproheptadina em doses de 4 mg, cerca de 2 horas antes do início da atividade sexual, demonstrou ser efetiva no alívio da anorgasmia produzida por fármacos serotoninérgicos, por seus efeitos anticolinérgicos e antiserotoninérgicos (Sovner, 1984; De Castro, 1985; Steele & Howell, 1986; Nurnberg & Levine, 1987; Balon et al., 1993).
    • Benzodiacepinas: Diminuem as concentrações de noradrenalina plasmática e, embora possam diminuir o desejo sexual, podem melhorar a função sexual devido às suas propriedades ansiolíticas.
    • Anticolinérgicos: Medicamentos como a Amantadina, a Benztropina e o Biperideno produzem secura das membranas mucosas (incluindo a vagina) e impotência. Os anti-histamínicos possuem também propriedades anticolinérgicas. A Ciproheptadina, embora seja um anti-histamínico, tem uma potente atividade antiserotoninérgica (Sadock, 1995).
    • Betabloqueadores y Alfabloqueadores: Anti-hipertensivos que diminuem o tônus simpático de centros vasomotores cerebrais que conduz à impotência, diminuição do volume de ejaculação, ejaculação retrógrada e diminuição da libido (Segraves, 1989). O tratamento das disfunções sexuais por fármacos depende do tipo de neurotransmissores implicados. Quando o transtorno erétil se deve à utilização de antidepressivos, a Ciproheptadina, no caso dos serotoninérgicos, e os agonistas dopaminérgicos como o Bupropión podem ser efetivos, pois diminuem o limiar de resposta erétil e ejaculatória. As anfetaminas podem aumentar a libido por aumento nos níveis de dopamina e noradrenalina. O Deprenil (um IMAO-B seletivo) aumenta a condução sexual por aumento da atividade dopaminérgica e noradrenérgica, enquanto a Tranilcipromina (um IMAO não seletivo) tem um efeito estimulante paradoxal por suas propriedades anfetamínicas (Sadock, 1995). A Apomorfina (agonista dopaminérgico) no tratamento do alcoolismo levou a ereções penianas periódicas em 22 de 35 pacientes estudados por Schlatter & Lal (Lal et al., 1979). Outros agonistas dopaminérgicos podem conduzir a ereções penianas espontâneas como Pergolida, Lisurida (Lees & Stern, 1981), Bromocriptina (2.5 a 3.75 mg./dia) (Ambrosi et al., 1980) e Levodopa (20% a 30% dos pacientes) (O’Brien et al., 1971; Bowers et al., 1971). Agonistas colinérgicos como o Betanecol são efetivos também na disfunção sexual produzida pelos ADT (Segraves, 1987). A Yohimbina é um bloqueador -adrenérgico que pode levar à dilatação da artéria peniana e por isso tem sido utilizada na disfunção erétil (Sadock, 1995). Muitas drogas como a cocaína, as anfetaminas, o álcool e o cannabis têm sido consideradas aumentadoras da atividade sexual, possivelmente por seus efeitos ansiolíticos, desinibitórios ou estimulantes. No entanto, seu uso a longo prazo conduz a alterações hormonais (como no caso do álcool ou cannabis) ou a alterações cardiovasculares, que culminam em uma marcada disfunção sexual. O Ginseng parece ter efeitos androgênicos, entre seus múltiplos princípios ativos, muitos deles desconhecidos, que permitem aumentar o desejo e a condução sexual (Sadock, 1995). Muitas substâncias com propriedades vasodilatadoras têm sido utilizadas de forma injetável nos corpos cavernosos do pênis com o fim de melhorar a disfunção erétil. Elas produzem um aumento transitório do fluxo sanguíneo peniano e uma tumefação e ereção do membro como consequência. Foram utilizadas substâncias como Papaverina (CERESPAN), Mesilato de fentolamina (REGITINE), fenoxibenzamina (DIBENZILINE), prostaglandina E e polipéptido intestinal vasoactivo (PIV), que tem atividade parassimpatomimética. No entanto, os riscos dessas práticas são elevados: priapismo, dor e esclerose dos pequenos vasos do pênis (Sadock, 1995).

2. Transtorno do Desejo Sexual Hipoativo

 

Ausência ou deficiência persistente ou recorrente de desejo ou fantasias sexuais que acompanha todas ou algumas expressões sexuais (coito, mas não masturbação, por exemplo). Fatores que afetam o funcionamento sexual, como idade, sexo e o contexto cultural em que a vida da pessoa se desenvolve, devem ser considerados. As mulheres são geralmente mais afetadas nesse sentido do que os homens. A discórdia conjugal é a razão mais frequente para a cessação da atividade sexual, mas a diminuição do desejo sexual também pode levar a problemas conjugais ou de relacionamento.

O transtorno pode ser acompanhado de ansiedade, depressão crônica, uso de fármacos que deprimem o SNC, doenças ou cirurgias de grande porte. Pode ocorrer acompanhado de transtornos na fase de excitação ou no orgasmo, caso em que podem ser os geradores da diminuição do desejo. Em outros casos, os indivíduos conservam a capacidade de excitação e orgasmo e podem ter relações sexuais com estimulação adequada. Os transtornos depressivos estão frequentemente associados a essa disfunção.

A disfunção se desenvolve mais frequentemente na idade adulta jovem, após um período adequado de desejo sexual, devido à presença de alterações psicológicas, eventos estressantes ou dificuldades interpessoais. A perda do desejo sexual pode ser contínua ou episódica (American Psychiatric Association, 1994).


 

3. Transtorno de Aversão Sexual

 

Aversão extrema persistente ou recorrente a todo contato sexual genital com o parceiro sexual. Pode representar um ato defensivo inconsciente por medo da sexualidade. Os indivíduos expressam medo, ansiedade ou desgosto quando o momento para uma relação sexual com o parceiro se apresenta. A aversão pode se concentrar em um aspecto específico da relação, como secreções, ejaculação, penetração, ou englobar cada expressão desde o flerte. Alguns indivíduos podem apresentar ataques de pânico quando confrontados com uma situação sexual, outros utilizam diferentes estratégias para evitá-las (American Psychiatric Association, 1994).


 

4. Transtorno Feminino da Excitação Sexual (Frigidez)

 

Inabilidade persistente ou recorrente, parcial ou completa, para manter a resposta da excitação sexual (lubrificação) durante todo o ato. Para seu diagnóstico, requer-se que a estimulação sexual seja adequada em foco, intensidade e duração. Frequentemente é acompanhada de transtorno no desejo sexual e no orgasmo. Pode resultar em dor durante o coito, evitação sexual e transtornos na relação de casal. É comumente devido a conflitos psicológicos ou orgânicos, como vaginite atrófica ou alterações hormonais (testosterona, estrógenos, prolactina, tiroxina) (American Psychiatric Association, 1994).

O tratamento baseia-se na terapia sexual e no uso de estrógenos na vaginite atrófica. Em casos selecionados, pode-se utilizar Metiltestosterona, 25 mg/dia por 4 a 5 dias no período menstrual (máximo 150 mg/mês).


 

5. Transtorno da Ereção Masculina (Impotência)

 

A ereção peniana depende da redireção preferencial do influxo arterial nos espaços vasculares dos corpos cavernosos e dos mecanismos neurovasculares que a permitem. Existe, portanto, uma inervação colinérgica e adrenérgica alfa adjacente aos vasos sanguíneos que mantêm o pênis túrgido ou não, conforme levam à vasoconstrição ou à vasodilatação, respectivamente; embora as vias simpáticas pareçam conduzir tanto fibras vasodilatadoras quanto vasoconstritoras. Em resumo, as vias colinérgicas fazem parte do mecanismo erétil reflexo que viaja pelos nervos parassimpáticos pélvicos, e as adrenérgicas do mecanismo erétil “psicogênico” e da detumescência (Segraves, 1989). Em estudos com macacos, foram identificadas algumas áreas cerebrais desses primatas que participam dos mecanismos de ereção peniana: projeções septais do hipocampo, giro do cíngulo anterior, núcleo talâmico anterior, núcleo dorsal medial do tálamo, região septopreóptica medial, trato mamilotalâmico e os corpos mamilares (Segraves, 1989).

O transtorno da ereção masculina é definido como a incapacidade de obter ou manter uma ereção suficiente para o coito (geralmente não presente na masturbação). 20-50% apresentam uma causa orgânica. Para o diagnóstico, é necessária polissonografia e calibradores de pressão no pênis que permitem descartar uma origem orgânica (o normal são 90 minutos de ereção todas as noites durante o sono REM). Também são utilizados ultrassom Doppler e níveis séricos de testosterona. Incidência: 8%.

As dificuldades na ereção estão frequentemente associadas a ansiedade, medo de falha, preocupação com o ato sexual e uma diminuição subjetiva de excitação ou prazer. Pode estar associada a outras disfunções sexuais, como transtorno do desejo sexual hipoativo e ejaculação prematura, ou a outros transtornos mentais, como transtornos do afeto ou do uso de substâncias. Frequentemente, são relatados inconvenientes com a excitação sexual (American Psychiatric Association, 1994). Entre as causas orgânicas da disfunção erétil, encontram-se:

  • Doenças infecciosas e parasitárias
  • Doenças cardiovasculares
  • Transtornos renais e urológicos
  • Transtornos hepáticos (cirrose)
  • Transtornos respiratórios
  • Doenças genéticas (síndrome de Klinefelter)
  • Desnutrição e deficiência vitamínica
  • Doenças endócrinas (diabetes mellitus, doença de Addison, neoplasias adrenais, mixedema, hipertireoidismo, acromegalia).
  • Transtornos neurológicos (esclerose lateral amiotrófica, esclerose múltipla, doença de Parkinson, tumores do SNC ou da medula espinhal, epilepsia do lobo temporal).
  • Terapia com radiação
  • Fratura pélvica
  • Uso de drogas aditivas e álcool (diminuição dos níveis de testosterona e elevação dos estrógenos circulantes no homem)
  • Fármacos psiquiátricos

Os casos adquiridos não orgânicos podem regredir espontaneamente em 15-30% das vezes. O tratamento consiste na abstinência do coito e terapia de focalização sensitiva (excitação para os genitais e não dos genitais) e manejo da ansiedade; prótese peniana inflável, Papaverina, Ioimbina ou cirurgia (revascularização), em caso de patologia orgânica. A disfunção produzida por fármacos é manejada com medicamentos já mencionados.


 

6. Transtorno Orgásmico Feminino (Anorgasmia)

 

Diminuição ou ausência persistente ou recorrente de orgasmo em uma mulher após uma fase de excitação normal em foco, intensidade e duração. Algumas mulheres são capazes de experimentar um orgasmo durante a estimulação clitoriana não coital, mas não o experimentam durante o coito (isso constitui uma variação normal, sendo o diagnóstico do transtorno feito somente se isso representa uma inibição psicológica).

5% das mulheres casadas com mais de 35 anos nunca tiveram um orgasmo, e esse número aumenta em mulheres solteiras e jovens, atingindo valores de 30%. O transtorno é devido a fatores psicológicos, como medo da penetração ou rejeição do sexo oposto, hostilidade em relação ao masculino, sentimentos de culpa em relação aos impulsos sexuais ou conflitos conjugais, ou a outros transtornos mentais, como os transtornos do afeto. Também pode ser devido a fatores orgânicos e medicamentos, como contraceptivos orais, antidepressivos, antipsicóticos, BZD.

O orgasmo não depende do tamanho vaginal ou de anomalias na musculatura do assoalho pélvico; mesmo em casos de diabetes ou câncer pélvico, a capacidade de excitação é mais facilmente comprometida do que o orgasmo (American Psychiatric Association, 1994).

O tratamento consiste em práticas masturbatórias e uso de vibradores. Em caso de consumo de fármacos, o manejo foi descrito em parágrafos anteriores.


 

7. Transtorno Orgásmico Masculino (Ejaculação Retardada)

 

A estimulação alfa-adrenérgica através dos nervos hipogástricos tem sido implicada na emissão seminal e no fechamento do colo da bexiga. Em nível cerebral, a participação da área pré-óptica, do tálamo anterior e das vias espinotalâmicas em macacos foi identificada (Segraves, 1989).

O transtorno orgásmico masculino consiste na diminuição ou ausência persistente ou recorrente de orgasmo em um homem após a fase de excitação sexual normal. A dificuldade geralmente se restringe a atingir o orgasmo na vagina, mas não com a masturbação ou estimulação oral, por exemplo. A disfunção sexual pode ser atribuída a causas psicológicas ou ser secundária a prostatectomia, doença de Parkinson, lesão sacra, anti-hipertensivos (Guanetidina, Alfa-metil-dopa, Reserpina) (Segraves, 1989), fenotiazinas (Hollister, 1964) e antidepressivos de perfil serotoninérgico (Clomipramina [200 mg/dia] (Monteiro et al., 1987), Fenelzina [60 a 90 mg/dia] (Harrison et al., 1986), Imipramina [200 a 300 mg/dia] (Harrison et al., 1986), Amitriptilina (Nininger, 1978), ISRS (Balon et al., 1993)). Apesar disso, muitos homens com lesões neurológicas ou vasculares que comprometem a ereção ou a emissão de sêmen podem atingir o orgasmo (American Psychiatric Association, 1994).

O tratamento consiste em terapia sexual, psicoterapia, recondicionamento masturbatório, ativação de fantasias sexuais. Inicialmente, busca-se a ejaculação fora da vagina e, em seguida, permite-se a penetração momentos antes do orgasmo. No caso de fármacos serotoninérgicos, a Ciproheptadina tem demonstrado ser eficaz (Balon et al., 1993). Outra alternativa seria a substituição por Bupropiona (agonista dopaminérgico) ou Desipramina (antidepressivo de perfil noradrenérgico) (Sovner, 1983).


 

8. Ejaculação Prematura

 

Ejaculação persistente ou recorrente com estímulo sexual mínimo na parte preliminar ou após uma penetração curta. Presente em 20-30% dos homens adultos jovens de alto nível cultural e por experiências prévias em situações de pressa. No entanto, alguns indivíduos podem apresentar esse padrão após um período de função adequada, por diminuição da frequência sexual, intensa ansiedade de desempenho com um novo parceiro ou perda no controle ejaculatório por dificuldades para alcançar ou manter a ereção. Alguns homens com consumo prévio de álcool podem apresentar essa disfunção (American Psychiatric Association, 1994).

O tratamento consiste em abstinência coital e abordagem sensorial com “técnica de apertar” a glande por 5 segundos na iminência ejaculatória e reinício da estimulação manual do pênis pela parceira sexual (3 a 4 ciclos) até permitir a penetração e, em seguida, os movimentos coitais progressivos. Bom prognóstico. Do ponto de vista farmacológico, existem alguns medicamentos que, por sua ação antagonista sobre receptores dopaminérgicos ou serotoninérgicos, podem ser eficazes em casos de ejaculação prematura, como a Tioridazina (Singh, 1963), os IMAOs (Bennett, 1961) e os ISRS (Balon et al., 1993; Waldinger et al., 1994).


 

9. Vaginismo

 

Contração dolorosa, involuntária e reflexa, persistente ou recorrente, dos músculos do introito vaginal (assoalho pélvico) em resposta à tentativa de penetração. É, portanto, uma resposta fóbica à penetração, em alguns casos por trauma sexual, como abuso sexual infantil ou por crenças religiosas que associam o sexo ao pecado. Apresenta-se principalmente em mulheres jovens de grupos socioeconômicos altos. As fases de desejo, excitação ou capacidade orgásmica não estão alteradas, a menos que a penetração seja antecipada ou tentada. Ao exame vaginal, observa-se marcada contração da musculatura pélvica em algumas mulheres com essa disfunção (American Psychiatric Association, 1994).

O tratamento baseia-se na prática do toque vaginal para confirmar a sensação dolorosa e iniciar terapia sexual com exercícios de Kegel (contração voluntária dos músculos do introito) até a exaustão e, em seguida, dessensibilização “in vivo” com recondicionamento masturbatório, abrindo a vagina com os dedos ou dilatadores.


 

10. Dispareunia

 

Dor persistente ou recorrente associada ao coito, antes, durante ou depois, na qual deve-se descartar patologia orgânica (vulvite, bartolinite, endometriose, parametrite, patologia pélvica…) em 30 a 40% dos casos. Pode ocorrer em homens e mulheres. Pode levar à evitação de relações sexuais. O transtorno não é causado exclusivamente por vaginismo ou perda na lubrificação vaginal (American Psychiatric Association, 1994).


 

11. Outras Disfunções Sexuais Não Específicas – DSM-III-R (APA, 1987)

 

(1) Sensação não erótica ou de anestesia completa com componentes fisiológicos do orgasmo normais. (2) Análogo feminino à ejaculação prematura. (3) Dor genital que ocorre durante a masturbação.


 

Parafilias

 

Impulsos, fantasias ou práticas sexuais incomuns, desviadas ou bizarras. Mudança de objeto sexual por ações ou objetos insólitos e bizarros. A sexualidade “normal” não satisfaz o indivíduo que a apresenta. Podem levar a múltiplos atos perigosos para o indivíduo submetido ao padrão de comportamento sexual do praticante (por exemplo, em pedofilia ou sadismo sexual). O indivíduo pode recorrer várias vezes ao serviço de prostitutas buscando realizar suas fantasias e ser submetido à prisão e ao encarceramento quando denunciado por alguém que foi forçado a satisfazer suas fantasias.

Em alguns casos, pode desempenhar trabalhos relacionados às suas fantasias, como em uma creche ou uma loja de roupas íntimas. Alguns indivíduos podem expressar culpa e depressão por seu comportamento sexual, por considerá-lo anormal ou imoral.

Mais comum em homens (20:1). Iniciam na infância e se estruturam na adolescência e na idade adulta jovem, com um curso crônico e variável em intensidade que pode ceder parcialmente na idade adulta avançada. As parafilias mais comumente encontradas em clínicas especializadas em seu tratamento são a pedofilia, o voyeurismo e o exibicionismo. Quase metade desses indivíduos são casados.

Presumem-se fatores biológicos (anormalidades no EEG e níveis hormonais) que são ativados por fatores psicológicos como o abuso infantil. As parafilias parecem estar associadas à hiperatividade dopaminérgica e/ou à dominância desta sobre a função serotoninérgica, o que pode responder a antagonistas dopaminérgicos ou agonistas serotoninérgicos que complementariam a psicoterapia comportamental e o condicionamento aversivo (American Psychiatric Association, 1994). Tem sido descrita em entidades como epilepsia do lobo temporal, estados pós-encefalíticos, transtorno de Tourette, transtornos do lobo frontal, doença de Huntington, tumores do tronco cerebral e esclerose múltipla (Cummings, 1995).

As parafilias e adições sexuais não parafílicas, como masturbação compulsiva, dependência de pornografia, etc., parecem responder favoravelmente à Fluoxetina por seu potencial efeito em transtornos de impulsividade, com efeitos estatisticamente significativos e resposta evidente em 4 semanas e sem afetar o comportamento sexual convencional. Existem relatos do uso desse antidepressivo em transvestismo (20 mg/dia), fetichismo (inicialmente 20 mg/dia e depois 40 mg/dia por 12 meses), escrupulosidade (relacionada ao TOC por 8 semanas), exibicionismo ou voyeurismo (20-80 mg/dia por 3 a 6 meses) (Kafka & Prentky, 1992).

Para alguns indivíduos, as fantasias ou estímulos parafílicos são necessários para alcançar a excitação sexual e são sempre incluídos na atividade sexual. Em outros casos, as preferências parafílicas ocorrem apenas episodicamente (por exemplo, durante períodos de estresse), enquanto outras vezes a pessoa é capaz de ter uma relação sexual sem as fantasias ou estímulos parafílicos. O comportamento, a urgência sexual ou as fantasias causam alteração significativa em importantes áreas do funcionamento, como a social ou ocupacional.


 

1. Exibicionismo

 

Exposição compulsiva e repetitiva de genitais a estranhos com o objetivo de aterrorizá-los ou fantasiando com a excitação sexual que o observador possa ter. Algumas vezes o indivíduo se masturba enquanto se expõe (ou enquanto fantasia em se expor). Apresenta-se em homens antes dos 18 e geralmente não mais de 40 anos (American Psychiatric Association, 1994). Medicamentos serotoninérgicos, pela diminuição do desejo de exposição, dificuldade em atingir o orgasmo e redução da intensidade do orgasmo, demonstraram ter alguma utilidade em casos isolados (Wawrose & Sisto, 1992; Casals-Ariet & Cullen, 1993).


 

2. Sadismo e Masoquismo Sexual

 

Consiste em causar sofrimento físico ou psicológico a outra pessoa para obter prazer sexual. A vítima pode consentir tal prática (masoquista). Incluem-se violações e agressões sexuais de outro tipo. Acompanham-se frequentemente de tendências homossexuais ou fetichistas.

O foco parafílico do masoquismo sexual está em relação à humilhação, espancamento, limitação ou qualquer outra forma de sofrimento real. O masoquismo sexual só se expressa durante as relações sexuais ou a masturbação, mas não em outros atos da vida cotidiana. A “hipoxifilia” envolve excitação sexual por privação de oxigênio por compressão torácica, sacos plásticos, compressão do pescoço ou meios químicos como nitrito e pode levar à morte. Pode ser acompanhada de fetichismo, fetichismo travestista ou sadismo sexual. O curso é crônico com o mesmo padrão e intensidade de ato masoquista geralmente.

O foco parafílico do sádico sexual está em relação ao sofrimento psicológico ou físico da vítima. O sadismo sexual só se expressa durante a atividade sexual, mas não em outras atividades da vida cotidiana. O curso é crônico com o mesmo padrão e intensidade de ato sádico por vários anos geralmente. Posteriormente, a intensidade pode aumentar, podendo levar a sérias lesões à vítima e até mesmo à morte (American Psychiatric Association, 1994).


 

3. Voyeurismo

 

Gratificação sexual ao observar outras pessoas em relações sexuais ou mulheres nuas desprevenidas, geralmente estranhas. Uma variante inclui ouvir conversas eróticas (sexo telefônico). A masturbação geralmente ocorre durante a atividade voyeurística ou depois dela, relembrando o evento. Algumas vezes o indivíduo tem fantasias de experiências sexuais com a pessoa que observa. O início da atividade voyeurística é por volta dos 15 anos com curso crônico (American Psychiatric Association, 1994).

4. Pedofilia

 

Atos ou fantasias eróticas com crianças pré-púberes (menores de 13 anos) por indivíduos maiores de 16 anos e com mais de 5 anos de diferença em relação às suas vítimas. Pode ser de caráter heterossexual (95%) ou homossexual (5%), exclusivo ou não exclusivo. A ação pedofílica pode limitar-se a despir e observar a criança, ou a masturbar-se na presença dela, ou a tocar os genitais da criança. Outros realizam a felação ou o cunnilingus ou a penetração na vagina, no ânus ou na boca, seja com os dedos ou outro objeto, ou com o pênis.

O indivíduo geralmente justifica seus atos argumentando provocação por parte da criança ou interesse em educá-la sexualmente, e tenta convencer a criança do suposto bem que está lhe fazendo. As crianças vitimadas podem ser os filhos do indivíduo ou crianças de fora de suas famílias.

É uma das parafilias mais frequentes, tanto que em todo o mundo existem vários locais turísticos destinados a esse fim, para os quais indivíduos com o transtorno se dirigem (American Psychiatric Association, 1994).


 

5. Fetichismo

 

Uso de objetos inanimados como método preferido (meias de mulher, sapatos, calcinhas…). O indivíduo com fetichismo geralmente se masturba enquanto observa, toca ou cheira o “fetiche” ou pede ao seu parceiro para utilizá-lo durante a relação sexual, pois na ausência dele pode ocorrer uma disfunção erétil (excitatória). Não é diagnosticado quando o indivíduo é um fetichista travesti ou quando o objeto foi projetado com o propósito de estimular (vibrador, por exemplo). Início na adolescência, com curso crônico. Principalmente em homens (American Psychiatric Association, 1994).


 

6. Travestismo Fetichista

 

Homens heterossexuais que, ao se vestirem como mulheres, obtêm prazer sexual, geralmente se masturbando durante tal ato, imaginando ser ao mesmo tempo o sujeito masculino e o feminino. Não é diagnosticado em indivíduos com transtorno de identidade de gênero. Pode estar associado ao masoquismo sexual. Em alguns casos, o indivíduo pode se vestir como mulher, mas tal comportamento não é evidente até a idade adulta. O ato de vestir roupas femininas pode ser usado sozinho ou com um parceiro para obter gratificação sexual ou em resposta a estados de ansiedade ou depressão. Aparece desde a infância, de curso crônico, podendo evoluir para o transexualismo (no qual a pessoa deseja ser do sexo oposto) (American Psychiatric Association, 1994).


 

7. Frotteurismo

 

Esfregar os genitais contra outro sujeito que não consente, para alcançar excitação e orgasmo, enquanto fantasia em uma relação com a vítima. Ocorre em locais movimentados, como ônibus, por exemplo. Inicia na adolescência e geralmente diminui em frequência com o passar dos anos (American Psychiatric Association, 1994).


 

8. Outras Parafilias

 

Zoofilia (uso de animais para obter excitação sexual e satisfação como método preferido. Mais comum em áreas rurais); coprofilia, urofilia (defecação ou micção em seu(sua) parceiro(a) sexual ou vice-versa [recepção das excreções do outro]); necrofilia (cadáveres); parcialismo (foco de excitação sexual em uma parte específica do corpo); clismafilia (enemas) (American Psychiatric Association, 1994).


 

Transtornos na Identidade de Gênero

 

Os Transtornos na identidade de gênero são situações nas quais se apresenta uma discordância entre o sexo biológico e a identidade de gênero. Não são devidos a transtornos de sexo ambíguo como a síndrome de Turner (XO), Klinefelter (XXY), síndrome adrenogenital, pseudo-hermafroditismo ou síndrome de insensibilidade androgênica.

O homossexualismo é definido como a atração erótica preferencial por membros do mesmo sexo, cuja etiologia pode ser muito variável; ainda não há consenso sobre o que pode determinar esse tipo de comportamento.

A capacidade de perceber e responder aos estímulos sexuais, de reconhecer a satisfação e o sucesso na prática heterossexual e de utilizar essas experiências como forças integradoras, pode ser crucial para o desenvolvimento do papel sexual. Os fatores de vulnerabilidade nessas áreas podem influenciar a escolha sexual, que então é reforçada acidentalmente ou pelo contexto social ou familiar.

Estudos com gêmeos mostram índices de concordância em monozigóticos, mas não em dizigóticos, o que sugere uma possível alteração dos padrões de maturação psicosexual controlada por genes.

Alguns transtornos orgânicos como a epilepsia ou a sífilis terciária poderiam determinar comportamentos de tipo homossexual, assim como patologias psiquiátricas como esquizofrenia e diversos transtornos de personalidade.

O quarto ao sétimo mês de vida fetal é crucial na diferenciação sexual, pela concentração de esteroides masculinos que atuam sobre estruturas límbicas e hipotalâmicas e que podem ser afetados (diminuídos em situações de estresse materno com a consequente liberação de glicocorticoides e a diminuição da testosterona). Assim, a interação entre estrógenos e andrógenos realiza o estímulo da diferenciação sexual.

Como já mencionado, em muitas culturas esse tipo de expressão sexual não é considerada patológica, e mesmo nas sociedades ocidentalizadas a rejeição a ela teve uma virada significativa nas últimas duas décadas, a ponto de serem consideradas aceitáveis para algumas delas as práticas matrimoniais e a adoção de filhos por parte de quem assume essa opção de gênero. No entanto, há indivíduos que não vivenciam sua homossexualidade de forma egossintônica e certamente recorrerão à ajuda especializada para buscar solução para seu mal-estar. Nesses casos, pode-se promover o desenvolvimento de respostas heterossexuais a partir da aversão a estímulos homossexuais (terapia de condicionamento aversivo), utilizando-se também a dessensibilização sistemática e o recondicionamento masturbatório (Byne & Parsons, 1993) (tabela 10).


 

Transtornos do Sono

 

 

Neurofisiologia do Sono

 

“O cérebro é um emulador da realidade, um aparelho para criar uma realidade abstrata.” Llinás, R.

A função central do Sistema Nervoso é a de sonhar, sendo a vigília um estado de sonho regido pelos sentidos, mas sem mais diferença que o estado de sono como tal que por sua vez é regido pela memória. Os neurônios relacionados com o sistema sensório-motor ocupam apenas 5% de toda a massa cerebral, o resto se encarrega de predizer (herança filogenética) (Llinás, 1994).

A consciência é definida como a atividade integradora pela qual o indivíduo capta a totalidade de seu campo fenomenológico e o incorpora à sua experiência. O estado de consciência requer uma alta frequência e sincronização entre diversas estruturas como o sistema reticular ativador, o tálamo e o córtex (efeito de ressonância ou coerência temporal); no tálamo (órgão que controla o ciclo sono-vigília) são produzidas despolarizações tônicas de alta frequência (potenciais de ação consecutivos) de forma paroxística, que permitem a percepção do mundo externo de forma fragmentada (granular) e não contínua. Sabe-se então que os núcleos reticulares do tálamo constituem a porta para a realidade e que os núcleos intralaminares se encarregam de estruturá-la, pois é percebida de forma fragmentada. Ambos os núcleos talâmicos estão interconectados com as camadas IV-VI e I do córtex respectivamente, a uma frequência de 40 Hz como uma oscilação que progride de frente para trás a cada 12,5 ms (quantum de cognição) (Llinás, 1994). A região cortical apontada como o substrato biológico da consciência (percepção do instante) é a chamada zona terciária, formada pela área 39 de Brodmann ao nível da região parieto-occipital (Kandel, 1995).

Por outro lado, a mente, função intrínseca presente unicamente no estado de consciência, é um estado oscilatório com um ritmo de 40 ciclos/seg. (Hz) devido às propriedades dos canais iônicos e não a despolarizações. Isso se deve a campos magnéticos provenientes dos campos elétricos e localizados de forma perpendicular a estes últimos, e suscetíveis de serem medidos através de um magnetoencefalógrafo. A 40 Hz, os dois hemisférios cerebrais se encontram sincronizados em um estado de ativação espontânea não presente nos estados de sono (com exceção de um estímulo sensorial durante o sono REM) (Llinás, 1994).

Tanto o sono quanto a vigília são controlados por sistemas neuronais localizados no tronco cerebral, hipotálamo, tálamo e cérebro anterior. A vigília é mantida por atividade tônica no sistema reticular ativador e reforçada por impulsos sensoriais colaterais (acústicos e dolorosos os mais importantes) (Culebras, 1992). Esses sistemas neuronais respondem a um ciclo circadiano onde a luz cumpre um papel sincronizador. Antes se pensava que eram necessários estímulos luminosos de excessiva intensidade (7000 a 13000 lux) para exercer alguma influência no ciclo circadiano dos humanos. Mas, estudos recentes indicam que a exposição a baixas iluminações como as produzidas por lâmpadas artificiais (100 a 500 lux) ainda exibe um efeito robusto ao conseguir modificar a temperatura corporal e reduzir a secreção noturna de melatonina (Boivin et al., 1996).

Neurônios catecolaminérgicos e colinérgicos reforçados pelos histaminérgicos do hipotálamo posterior, são ativos durante a vigília. O sono aparece quando esses neurônios diminuem sua atividade e ativam-se neurônios promotores do sono (GABAérgicos, peptidérgicos) no núcleo do rafe médio do tronco cerebral, núcleo do trato solitário, núcleo talâmico reticular, hipotálamo anterior (área pré-óptica) e prosencéfalo basal. A desativação do sistema reticular libera os impulsos talâmicos e bloqueia a informação para o córtex. Além disso, os neurônios serotoninérgicos do rafe médio inibem a atividade motora (Steriade, 1992). Existem fatores humorais como o peptídeo indutor do sono delta, o fator liberador do hormônio do crescimento, os muramil peptídeos, a prostaglandina D2 e a serotonina, entre outros, que se sabe participam na indução e manutenção do sono. Os estrógenos, por exemplo, encurtam o período circadiano e consolidam a fase de sono (Leibenluft, 1993).

O sono consiste em 2 estados divididos em 4 etapas por EEG: 1 e 2 (leve), 3 e 4 (estado de pouca atividade mental) e REM (estado de movimentos oculares rápidos). Tais etapas se apresentam em ciclos de aproximadamente 90 minutos (4 a 5 no total) de ritmicidade ultradiana. O sono não REM (NREM) predomina na primeira metade (70-100 minutos) e o REM no final [FIG. 2]. Assim, o NREM ocupa 75-82% do sono total (com predomínio da etapa 2) e diminui com a idade, e o REM, que ocupa 50% do sono do recém-nascido, ocupa de 3 a 5 anos 18-25% e não se altera mais tarde. Enquanto em indivíduos adultos normais o sono se inicia no estado NREM, nos infantes normalmente inicia no estado REM. O recém-nascido dorme entre 16-18 horas diárias distribuídas em 6 a 8 períodos de aproximadamente igual duração. Por volta dos seis meses, o padrão de sono assemelha-se ao do adulto com um período mais longo à noite e dois de soneca durante o dia. Em pessoas de idade avançada, o padrão polifásico é retomado (Osuna & Rubiano, 1994).

Quando um indivíduo é privado de algum estágio do sono durante uma noite, observa-se um fenômeno de rebote na noite seguinte com incremento do estágio comprometido (o sono REM se recupera apenas em 50%).

O sono REM é promovido por neurônios colinérgicos que se originam nas regiões parabraquiais (próximo ao núcleo do III par) e pode ser inibido por neurônios noradrenérgicos e serotoninérgicos no locus coeruleus e rafe dorsal, respectivamente (Gillin et al., 1993). Caracteriza-se por: dessincronização da atividade cortical, ritmo teta no hipocampo, movimentos oculares rápidos por estímulos excitatórios da região mesopôntica que se projetam aos sistemas tálamo-corticais (núcleo geniculado lateral e córtex occipital), atonia muscular dada por potenciais pós-sinápticos inibitórios mediados pela glicina sobre os motoneurônios espinhais (exceto músculos oculares e diafragma, por estimulação de fibras ponto-genículo-occipitais), alternada com breves contrações de músculos faciais e de extremidades, flutuações cardiorrespiratórias, ereções penianas (ainda que o sono não tenha conteúdo sexual), experiências de sonho (85%) e incremento do fluxo cerebral e do metabolismo.

O limiar para despertar um indivíduo em sono REM é similar ao da etapa II do sono NREM. O sono REM tem sido associado ao desenvolvimento cerebral do infante e nos processos de consolidação da memória e aprendizagem, tanto que a aquisição de aprendizagens complexas leva ao incremento na densidade do REM e os pacientes com atraso mental e demência apresentam diminuição desse estágio. O sono REM se caracteriza por uma média mais alta de recordação dos sonhos (89%) que o NREM (64%) (Osuna & Rubiano, 1994).

O estado NREM associa-se ao papel restaurador da fadiga física, a ponto de o fluxo sanguíneo cerebral e a taxa metabólica do cérebro diminuírem significativamente durante o mesmo, diferente do encontrado no sono REM (Hajak et al., 1993). Consiste em ondas lentas de maior amplitude, baixa voltagem e baixa frequência (delta), de fusos de sono e complexos K. Os fusos de sono apresentam-se em número de 5 por minuto como ritmos sinusoidais com 12-14 Hz de frequência e são gerados por neurônios GABA localizados no tálamo. Os complexos K são ondas agudas em resposta a estímulos internos e externos (auditivos) de intensidade baixa (que não levam ao despertar) e mais comuns na etapa 2 (Osuna & Rubiano, 1994).

A etapa 1 se caracteriza por um EEG de frequência mista e baixa voltagem com atividade EMG. A etapa 2 apresenta fusos de sono com um EEG de frequência mista e baixa voltagem. A etapa 3 apresenta ondas lentas de alta amplitude ao EEG em quantidade moderada (10-50%). A etapa 4 apresenta predominância das ondas lentas (mais de 50%). Nas etapas 3 e 4, ocorre liberação de LH, testosterona e prolactina e podem ser inibidas por vias colinérgicas que vão do tronco cerebral ao córtex e ao tálamo (Osuna & Rubiano, 1994). Por outro lado, as ondas delta são moduladas por mecanismos serotoninérgicos complexos, a ponto de os antagonistas de receptores 5-HT2 as incrementarem (Gillin et al., 1993) (tabela 11) (tabela 12).

Além da secreção do hormônio do crescimento, outros hormônios podem modificar seus níveis séricos durante o sono:

  • Prolactina: Aumenta ao longo de todo o sono com um pico às 5-7h.
  • Cortisol: Pico no final do sono (Não dependente da qualidade do mesmo).
  • TSH: Pico antes de iniciar o sono com diminuição paulatina.
  • FSH e LH: Aumento no início do sono.
  • Melatonina: Estimulada pela escuridão e regulada pelo núcleo supraquiasmático do hipotálamo e o fascículo retinohipotalâmico (neurônios GABA). Está correlacionada com a curva de temperatura corporal de forma inversamente proporcional (Dawson & Encel, 1993).

 

Transtornos do Sono

 

Os transtornos do sono que se mencionam a seguir são divididos em 2 grupos maiores: Dissônias (transtorno na qualidade e quantidade de sono) e Parassônias (evento anormal que ocorre durante uma fase do sono). As Dissônias, por sua vez, dividem-se em insônia, hipersonia e transtornos do ritmo circadiano.

No interrogatório, deve-se indagar pelas diferentes etapas do sono, a latência para iniciar o sono, o número de despertares e sua duração, o tempo total dormido e a presença de sonolência no dia seguinte. O DSM-IV utiliza uma classificação baseada no The International Classification of Sleep Disorders (ICSD) Diagnostical and Coding Manual da American Sleep Disorders Association, de 1990. Separa os transtornos do ritmo circadiano (ciclo sono-vigília), a síndrome das pernas inquietas e o mioclonia noturna dos transtornos relacionados à insônia e estabelece uma divisão marcada entre Hipersonia primária e outras entidades que cursam com hipersonia, como Narcolepsia e Síndrome de Apneia Obstrutiva (Transtornos do sono relacionados à respiração) (American Psychiatric Association, 1994). Para um diagnóstico preciso e complementar à clínica, utilizam-se algumas ajudas diagnósticas (Osuna & Rubiano, 1992):

Polissonografia (laboratório do sono): Realizam-se durante três noites consecutivas EEGs (eletroencefalogramas), EMGs (eletromiografias), EKGs (eletrocardiogramas), eletrodos nos músculos tibiais anteriores (para identificar os movimentos periódicos das pernas), medições de pressão arterial (que permite detectar a hipotensão com a subsequente diminuição do fluxo cerebral), medições de temperatura, medições hormonais, pneumografia, oximetria e EOG (eletrooculograma), medição de suco gástrico e registro de tumescência peniana em casos de impotência. É indicada em casos de insônia maior de 6 meses (pelo menos 4 noites por semana) e quando não há resposta ao tratamento, em SAOS, narcolepsia, transtorno do sono relacionado ao REM, transtornos convulsivos e algumas parassônias.

Teste de Latência Múltipla do Sono (TLMS): Realizado no dia seguinte ao polissonograma, registram-se 4 a 5 cochilos por dia, a cada 2 horas, com duração de 20 minutos. O primeiro é feito 2 a 3 horas depois de acordar. São feitas medições de EEG, EOG, EMG e EKG. É indicado em suspeita de narcolepsia, SAOS, outras causas de hipersonia e insônia.

Teste Repetitivo de Vigilância Sustentada: Similar ao anterior, mas com a diferença de que o paciente é impedido de tirar cochilos, medindo-se a capacidade do indivíduo de permanecer acordado.


 

1. Insônia (Transtorno de Iniciação e/ou Manutenção do Sono)

 

É a alteração do sono mais prevalente; consiste em uma expressão subjetiva de “falta de sono” que afeta sua duração, profundidade e qualidade restauradora. Pode expressar-se como dificuldade para conciliar ou manter o sono (normalmente um adulto dorme 8 horas diárias e leva entre 10 e 30 minutos para conciliar o sono). É, portanto, um sintoma que afeta mais de 10% da população ou mais de 30% dos maiores de 50 anos. Vários estudos demonstraram que dormir pouco pode levar a uma menor expectativa de vida. É mais frequente em mulheres, pessoas magras, ansiosas ou depressivas, ou naqueles com doenças crônicas ou consumo de álcool (Lugaresi, 1992; Osuna & Rubiano, 1994).

Laboratório: A polissonografia pode demonstrar uma baixa continuidade do sono por despertares frequentes, latência do sono aumentada, aumento da etapa 1, diminuição das etapas 3 e 4 do sono NREM, aumento no tônus muscular ou aumento da atividade alfa.

Insônia Transitória (1-3 dias): O sono pode ser alterado transitoriamente por várias causas, como calor ambiental, ruído, mudanças na relação afetiva ou no trabalho, presença de alguma doença ou consumo de medicamentos, situação de estresse agudo ou em síndrome de Jet-Lag (transtorno circadiano em viagens longas) ou em turnos noturnos (nos quais a administração do hipnótico seria feita durante o dia) ou viagens a locais altos (maiores de 2.800 metros), onde a utilidade da Acetazolamida foi comprovada. Devido ao alto risco de evoluir para insônia persistente, discutem-se os benefícios de iniciar um tratamento precoce com um hipnótico de ação curta (Triazolam) que não produza sedação diurna (Osuna & Rubiano, 1994).

Insônia de Curto Prazo (3 dias – 3 semanas): Apresenta-se em estresse situacional persistente. Usar um BZD de ação prolongada para descontinuá-lo gradualmente e evitar a insônia de rebote e a abstinência causada pelos BZD de ação curta (Osuna & Rubiano, 1994).

Insônia de Longo Prazo (semanas ou meses): Por transtornos situacionais ou psiquiátricos não resolvidos (depressão, ansiedade, transtornos de personalidade, transtornos obsessivo-compulsivos, alcoolismo) ou por doenças intrínsecas do sono, como insônia primária, mioclonia noturna, síndrome das pernas inquietas e apneia central do sono, ou patologias médicas descritas posteriormente. Utilizam-se BZD de forma intermitente (a cada 3 noites) por 3 a 4 meses com tratamento concomitante da patologia de base (Osuna & Rubiano, 1994).

*### Insônia Primária Psicofisiológica:

É o tipo mais comum de insônia crônica (15-25%), desencadeado por fatores precipitantes, mas sem depender deles para sua permanência. Entre os fatores predisponentes encontram-se: uma alteração no sistema gerador de sono, a idade, a predileção por permanecer acordado até tarde, história de transtornos do afeto ou ansiedade. Os fatores perpetuadores aparecem como resultado de comportamentos aprendidos para tentar combater a insônia, como horário irregular no ciclo sono-vigília, ansiedade pelas consequências da insônia no dia seguinte, a ingestão de hipnóticos ou álcool… Tipicamente, apresenta-se em adultos jovens ou de meia-idade, sendo raro na infância ou adolescência. Alguns indivíduos apresentam o transtorno durante alguns meses (mínimo 1 mês) ou anos de forma estável e constante, outros o apresentam de forma episódica (Osuna & Rubiano, 1992).

*### Insônia Idiopática:

Diferente da anterior, não apresenta nenhum fator precipitante; aparentemente há um comprometimento da maturação do sistema nervoso e, consequentemente, dos centros do sono.

*### Movimentos Periódicos das Pernas (MPP) e Síndrome das Pernas Inquietas (SPI):

Os MPP são movimentos repetitivos e estereotipados dos músculos tibiais anteriores com extensão do hálux a cada 5-120 segundos (3 episódios seguidos com cerca de 30 contrações cada e despertares) que podem causar pequenos despertares. São mais frequentes durante os estados 1 e 2 do sono e não ocorrem no sono REM (diagnóstico polissonográfico). O paciente não tem consciência dos movimentos pedais.

Esses movimentos podem ocorrer nos membros superiores e também na vigília. Podem se manifestar em pessoas assintomáticas ou com outros transtornos do sono e serem desencadeados por medicações como L-dopa, ADT ou ao retirar anticonvulsivantes ou hipnóticos. Quanto ao tratamento, podem ser úteis o Clonazepam, 0,5-2 mg, o Triazolam, 0,125 mg, o Baclofeno, 20-40 mg ou L-dopa, 100 mg.

O SPI manifesta-se como uma sensação incômoda tipo parestesias (coceira) não dolorosa, na panturrilha, coxas e pés, que leva ao seu movimento permanente e que se apresenta durante o repouso, antes do sono, dificultando a conciliação do mesmo e causando insônia. Presume-se alteração nos receptores opioides “mu” e padrão autossômico dominante com penetrância incompleta.

É mais severo durante a gravidez, idade avançada e privação do sono. Alguns transtornos estão associados ao SPI: neuropatias periféricas, câncer, esclerose lateral amiotrófica. Tem uma prevalência baixa. O tratamento é com derivados opioides como o Propoxifeno ou a Codeína (10-15 mg), Clonazepam, 0,5-2 mg 3 noites por semana, L-dopa, 100 mg + Carbidopa, 25 mg/dia [SINEMET] com efeito ao sétimo dia e betabloqueadores (Osuna & Rubiano, 1992, 1994; Osuna, 1993).

  • Insônia Geriátrica:

     

Principalmente em pacientes de 65-79 anos (25%), mulheres, solteiras, que vivem sozinhas, com alguma deficiência e durante o curso de uma depressão (ou predizendo-a). O idoso não apresenta fase 4 e tem uma diminuição na fase 3, com diminuição do sono REM total, apresentando muitos despertares matutinos. O sono é de má qualidade e duração devido à atividade diária inadequada, o que leva à fadiga frequente pela manhã. Devido a isso, ocorrem picos de sonolência às 12h ou 4h da manhã e ao início da tarde (Dehlin et al., 1987; Livingston et al., 1993).

Tratamento:

  • Higiene do Sono (tratamentos não farmacológicos):

     

Evitar produtos que contenham cafeína (depois das 14h), cacau, betaestimulantes, betabloqueadores, nicotina, álcool. Deve-se consumir algo leve antes de ir para a cama, deitar-se sempre na mesma hora e evitar cochilos e esforços antes de dormir; praticar exercícios pela manhã e à tarde (antes das 18h), tomar um banho quente 2 a 3 horas antes de deitar, evitar luzes, calor e ruídos no quarto de dormir, evitar esforçar-se demais para dormir, usar cama confortável unicamente para atividades como dormir ou ter sexo. Manter um horário regular para levantar e não utilizar o relógio no dormitório.

Além de uma psicoterapia breve, recomendam-se técnicas de relaxamento e terapia comportamental (Osuna & Rubiano, 1994).

Uma meta-análise sobre a eficácia dos tratamentos não farmacológicos para a insônia agrupou 59 estudos com 2.102 pacientes no total. As intervenções psicológicas (5 horas de terapia em média no total) produziram mudanças na latência do sono (indução) e no tempo de despertar após o início do sono (manutenção). O controle de estímulos e a restrição do sono foram os procedimentos terapêuticos mais eficazes, enquanto a higiene do sono não foi tão eficaz usada sozinha. Essa melhora clínica foi mantida após seis meses (Morin et al., 1994).

  • Tratamento Farmacológico:

     

Quanto à medicação, o uso de hipnóticos é o mais recomendável para pacientes com insônia crônica intermitente que não respondem à higiene do sono ou às psicoterapias, ou para insônia de curta duração. O risco das BZD é a apresentação de sono durante o dia e a amnésia anterógrada. A sonolência diurna é menos frequente com BZD de ação curta e as de ação prolongada são reservadas para pacientes com despertar prematuro apesar do tratamento ou com ansiedade diurna concomitante. Deve-se levar em conta que as BZD diminuem a quantidade de sono REM e prolongam sua latência e aumentam a fase II do sono. Outros tratamentos que poderiam ser úteis em pacientes com contraindicação para as BZD são a Hidroxizina [HIDERAX], que suprime o sono REM com uma ação que pode durar 4-6 horas, mas que ocasionalmente causa um efeito de rebote e não deve ser administrada com IMAOs nem em pacientes com glaucoma, ou a Trazodona, 50-100 mg ao deitar, antidepressivo heterocíclico que mimetiza adequadamente as fases normais do sono, mas que pode causar hipotensão ortostática (Catesby & Pittard, 1990; Osuna & Rubiano, 1992, 1994; Osuna, 1993).


 

2. Hipersonia (Transtorno de Sonolência Excessiva)

 

Mais incapacitantes que as insônias. Definem-se como o desejo irresistível de dormir em qualquer circunstância durante várias semanas ou meses, acompanhando-se de transtornos cognitivos e de atenção. Apresenta-se em 4-5% da população. Essa alteração faz parte da depressão atípica, o sono induzido pelo álcool ou sedativos, a abstinência de estimulantes do SNC, a uremia, insuficiência hepática, hipotireoidismo, DPOC, diabetes mellitus, encefalopatias, tumores do terceiro ventrículo, doença de Alzheimer, AVC e os que se mencionam mais adiante (Osuna & Rubiano, 1992, 1994; Osuna, 1993).

 

Hipersonia Primária (Síndrome de Kleine-Levin):

 

Sonolência excessiva (principalmente à noite) por mais de 1 mês, com um período de sono de 8-12 horas de duração e dificuldade para despertar no dia seguinte. A qualidade do sono noturno é normal. Os episódios de sono podem ocorrer também durante o dia, desencadeados por situações de pouca estimulação ou de baixa atividade. O indivíduo não se sente descansado após os episódios de hipersonolência e o nível de alerta é baixo (às vezes com comportamento automático).

Em alguns casos, pode ser recorrente com períodos de sonolência excessiva que duram pelo menos 3 dias, várias vezes ao ano e por no mínimo 2 anos; são acompanhados de bulimia, hostilidade extrema, irritabilidade, despersonalização, hipersexualidade, depressão, confusão, comportamento impulsivo, polidipsia (que sugere uma origem hipotalâmica) e ocasionalmente alucinações. Há amnésia após a crise. Entre esses episódios, o sono recupera suas características normais. Prevalência: 5-10% de todos os transtornos do sono.

De etiologia desconhecida, suspeita-se da associação de um agente viral, e não está relacionada com um fator orgânico ou transtorno mental ou medicação ou alterações no sono noturno. Foi encontrada certa incidência familiar e ocorre em maiores de 20 anos. É preciso descartar entidades como uremia, insuficiência hepática, hipotireoidismo, DPOC, diabetes mellitus, tumores do terceiro ventrículo (disgerminomas, craniofaringiomas), hidrocefalia, encefalites, doença de Alzheimer, esclerose múltipla, AVC, síndrome de Kearns-Sayre (lesões bitalâmicas)…

Quando a hipersonolência leva a períodos de 18-20 horas na cama, faz-se o diagnóstico de síndrome de Kleine-Levin, raro transtorno de início durante a adolescência (em jovens de aproximadamente 15 anos), afetando mais o sexo masculino na proporção de 3:1. Ao exame físico, é possível encontrar diminuição dos reflexos osteotendinosos, disartria e nistagmo (Osuna & Rubiano, 1992; Osuna, 1993).

A polissonografia noturna demonstra uma duração normal a prolongada do sono, diminuição da latência do NREM (menor que 7 minutos), sem alteração do REM e aumento da fase 2, que dura entre 12-20 horas, mas sem a incoercibilidade narcoléptica da Narcolepsia. O diagnóstico é apoiado pelo TLMS pós-polissonografia, sem que se encontre início do sono em REM e com latência muito curta para o NREM. Na Síndrome de Kleine-Levin, pode-se observar a irrupção de flashes de atividade teta sobre o ritmo de base, encurtamento da latência do REM e até mesmo início do sono na fase REM nos estudos de TLMS (American Psychiatric Association, 1994).

A hipersonia primária pode resolver-se espontaneamente após vários anos ou requerer o uso de Lítio ou anfetaminas (Metilfenidato), mas de valor limitado. As sestas durante o dia não são úteis.

 

Transtornos do Sono Relacionados à Respiração:

 

  • Características:

     

A Síndrome de Apneia Obstrutiva do Sono (SAOS) caracteriza-se por um quadro consistente em séries de 4 a 5 roncos seguidos por apneia, roncos, expiração explosiva e leve despertar, com aumento da pressão negativa intratorácica por alongamento e estreitamento do istmo faríngeo ou por obstrução nasal parcial ou total, ou deformidade da região oronasomaxilofacial. Apresenta-se principalmente em homens de idade madura (40 a 60 anos) com uma prevalência de 1 a 10% e em uma proporção de 8:1 em relação às mulheres. No entanto, pode ocorrer também em crianças, constituindo nelas a segunda causa de hipersonia (prevalência de 1,6-3%), dada por hipertrofia de amígdalas e adenoides ou as dismorfias faciais, com posturas anormais durante o sono com apoio sobre as mãos e os joelhos e enurese.

A Apneia Central do Sono (ACS), de baixa prevalência, caracteriza-se pela cessação completa da atividade dos músculos da respiração; apresenta-se com hipoventilação alveolar e despertar ao término da apneia por transtorno bulbar com diminuição no fluxo de ar (Guillain-Barré, distrofias, transtornos do tronco, medula, nervo frênico e outros pares). Distinguem-se 2 grupos: hipercápnico (secundário a lesões do SNC) e o não hipercápnico (idiopático). A proporção é maior para os homens, mas tende a se nivelar após a menopausa nas mulheres.

A Síndrome de Hipoventilação Alveolar Central (SHAC) caracteriza-se por um transtorno no controle ventilatório que resulta em diminuição do pO2 que piora durante o sono, sem apneias nem hipopneias. Os pulmões desses pacientes, geralmente obesos, não revelam anormalidade alguma.

Nessas entidades, a diminuição de O2 (hipoxemia) e a hipercapnia levam à diminuição do débito cardíaco e da frequência cardíaca, com hipertensão sistêmica e pulmonar durante a apneia (por flutuações do sistema simpático e aumento na atividade vagal), podendo levar a um cor pulmonale (transtorno cardíaco devido a uma patologia pulmonar), eritrocitose e arritmias (ectopia ventricular e fibrilação atrial).

A SAOS é agravada por entidades ou medicamentos como o hipotireoidismo, acromegalia (pela macroglossia), álcool, depressores do SNC, alergias respiratórias, cigarro, altitudes maiores de 1500 metros acima do nível do mar e obesidade (70%) (American Psychiatric Association, 1994; Osuna & Rubiano, 1992, 1994; Osuna, 1993).

  • Diagnóstico e Curso:

     

O diagnóstico clínico de um transtorno do sono relacionado à respiração é confirmado com uma polissonografia na qual se encontram apneias durante as etapas 1 e 2 e durante o REM principalmente, mais acentuadas na posição supina; diminuição do tempo total de sono, despertares frequentes, aumento na etapa 1 do sono NREM e diminuição nas etapas de sono de ondas lentas e REM. O TLMS é útil para avaliar o impacto no dia seguinte (diminuição da latência do sono para 5 a 10 minutos). São achados adicionais a dessaturação de oxigênio, anormalidades no EKG (arritmia sinusal, contrações ventriculares prematuras, bloqueio atrioventricular e bradicardia nos episódios apneicos) e elevação da pressão arterial sistêmica e pulmonar.

Na SAOS, a atonia muscular na fase REM acentua a obstrução das vias supraglóticas com roncos, hipopneias e apneias em número superior a 5 (5-20: leve; 21-50: moderado; > 51: grave), com duração superior a 10 segundos (20 a 40). Adicionalmente, diminuição do pO2 (pressão de oxigênio no sangue) e despertar e hiperventilação posteriores. O paciente expressa ainda sintomas como irritabilidade, cansaço, disfunção sexual (a impotência somada à H.T.A. constituem uma associação diagnóstica), cefaleia matutina que pode durar 1 a 2 horas, enurese (nictúria) e boca seca.

Na ACS pode-se observar a respiração de Cheyne-Stokes (apneia seguida de um episódio de hiperventilação de 10 a 60 segundos, que por sua vez é seguido por outro episódio de apneia).

Os transtornos depressivos, de ansiedade e a demência apresentam-se frequentemente nos transtornos do sono relacionados à respiração. Os pacientes com SAOS que não recebem tratamento podem apresentar infarto do miocárdio, infarto cerebral e morte de origem cardiovascular (Osuna & Rubiano, 1992, 1994; Osuna, 1993).

  • Tratamento:

     

Diminuir de peso, eliminação do álcool, do cigarro ou dos medicamentos depressores do SNC; uso de descongestionantes nasais e anti-histamínicos, tonsilectomia, uvulopalatofaringoplastia (50% de resposta), traqueostomia (para casos muito graves), CPAP nasal (ventilação mecânica com pressão aérea positiva contínua de 2,5-15 cm de H2O), Medroxiprogesterona em pacientes com pO2 diminuída em vigília (estimula a respiração e melhora os gases arteriais, desde que as causas obstrutivas tenham sido corrigidas, mas não diminui o número de apneias), Protriptilina, 25 mg/dia (aumenta a contração do músculo genioglosso, contrariando a ação exercida pela pressão negativa intratorácica sobre a faringe) ou Viloxazina ou Imipramina.

Na ACS de tipo hipercápnico, ocorrem melhorias com Acetazolamida e Teofilina a curto prazo. A Medroxiprogesterona também pode ser eficaz. Na ACS de tipo não hipercápnico, foi demonstrada a utilidade do CPAP (Osuna & Rubiano, 1992, 1994; Osuna, 1993).

 

Narcolepsia:

 

  • Características:

     

Transtorno neurológico crônico do sono REM, caracterizado por uma tétrade de sintomas (nem sempre presentes) (Ferris, 1982): sonolência diurna excessiva, cataplexia, alucinações hipnagógicas e paralisia do sono. Ocorre em igual proporção em homens e mulheres, com uma prevalência de 0,01-0,16% (1/600 no Japão; 1/3000 nos Estados Unidos e Europa). Aparece aos 20 anos de idade, mas não depois dos 50 anos (Osuna & Rubiano, 1992, 1994; Aldrich, 1992).

  • Diagnóstico e Curso:

     

Aparece inicialmente como sonolência contínua comprometendo o rendimento escolar (laboral). Em seguida, ocorrem crises súbitas de sono recorrentes (2 a 6 durante o dia) e curtas (1-30 minutos) independentemente do tempo dedicado ao sono noturno, com alterações do REM (sono diurno) por transtorno do sistema reticular ativador e exacerbado pela monotonia ou sedentarismo.

Após vários meses ou anos do aparecimento da hipersonia, apresenta-se ainda cataplexia (70-80%), fenômeno exclusivo da narcolepsia, consistindo em uma diminuição do tônus muscular que dura poucos segundos ou minutos ou paralisia súbita dos músculos estriados (com exceção dos extraoculares e respiratórios) de forma localizada ou generalizada com consciência preservada no início do ictus e desencadeada por estímulos emocionais (riso ou raiva), exercício vigoroso ou relações sexuais. Os episódios prolongados geralmente estão associados a alucinações que podem levar diretamente ao sono REM (Osuna & Rubiano, 1992, 1994; Aldrich, 1992). É devida possivelmente à diminuição de noradrenalina e serotonina e aumento de dopamina (receptores D2) (Aldrich, 1993).

Também ocorrem alucinações hipnagógicas (no início do sono) ou hipnopômpicas (ao despertar) em 20-40% dos pacientes. Essas alucinações são de cunho auditivo ou, mais comumente, visuais, com sensações de presença de um estranho, formigamento, carícias, levitação ou mudanças na localização das partes corporais.

Em 30-45% dos pacientes, a paralisia do sono apresenta-se como expressão aterrorizante (sem alteração da consciência) ao iniciar o sono ou ao despertar (principalmente), inabilidade para mover-se, abrir os olhos ou falar e duração de menos de um minuto que pode ser abortada com um ruído ou uma carícia.

Em 80% dos casos ocorre o comportamento automático, que consiste na realização de tarefas rotineiras sem que o paciente reconheça o que está fazendo e se surpreendendo ao despertar (diagnóstico diferencial com crises parciais complexas).

Por fim, podem ocorrer também transtornos de concentração e memória (50%), visão turva e diplopia, movimentos periódicos de pernas, diminuição da latência do sono e início prematuro do sono REM. Os ataques de sono, alucinações e paralisia (por comprometimento de neurônios colinérgicos e noradrenérgicos (?) do tronco cerebral com aumento da acetilcolina) são fragmentos do sono REM.

O diagnóstico pode ser confirmado com uma polissonografia que mostra uma diminuição da latência do REM (LREM) (menor que 5 minutos) com início do sono na fase REM, acompanhado de aumento nas fases 1 e 2 e diminuição da 3 e 4, aumento do sono REM e movimentos oculares fora do período REM. Sono noturno fragmentado na segunda metade. No TLMS, observa-se mais de 2 cochilos com presença do sono REM e diminuição da latência do sono para menos de 5 minutos (Aldrich, 1992; Osuna & Rubiano, 1992, 1994).

  • Efeitos Psicossociais:

     

Limitação laboral, depressão (30%), alta acidentalidade, consumo frequente de álcool, comprometimento marcado da vida de relação. Com exceção da sonolência que permanece estável com o tempo, os outros sintomas melhoram com a idade em um terço dos pacientes. 40% dos pacientes com narcolepsia podem apresentar concomitantemente transtornos mentais como Transtorno Depressivo Maior, distimia, transtorno de ansiedade generalizada e transtorno por uso de substâncias. Também podem estar presentes histórias pessoais de parassônias (enurese, sonambulismo ou bruxismo) (Osuna & Rubiano, 1992, 1994).

  • Tipos:

     

Primária idiopática: Sem causa conhecida, mas com bases hereditárias com antígenos de classe II do complexo maior de histocompatibilidade HLA-DR2/DQW1 (DRw15/DQw6/Dw2 segundo nomenclatura da OMS) na maioria dos casos (90-100%) e que só é encontrado em 21% da população geral. Liga-se ao braço curto do cromossomo 6. Uma variante genética se apresenta sem cataplexia. Também existem algumas famílias sem os achados na região HLA, o que sugere uma heterogeneidade genética com um segundo gene não relacionado com essa região e de tipo recessivo autossômico de penetração incompleta (Aldrich, M.S.). A discordância em gêmeos monozigóticos sugere a importância dos fatores ambientais na expressão completa da síndrome.

Secundária: Consequência de TCE, encefalite ou tumores mesodiencefálicos da porção superior do tronco cerebral ou encefalopatia hipóxico-isquêmica (Aldrich, 1992; Osuna & Rubiano, 1992, 1994).

  • Tratamento:

     

Os estimulantes do SNC para tratar a sonolência excessiva liberam a norepinefrina pré-sináptica e alteram a concentração de serotonina no espaço sináptico. Apesar do aumento no alerta, não produzem efeitos sobre a aprendizagem. Classificam-se de acordo com sua potência em menores (cafeína, Efedrina), moderados (Pemolina, Modafinil, Mazindol) e maiores (anfetamina, Metilfenidato). O Metilfenidato, 10-60 (20) mg/dia em 2 tomadas, com descanso de 1 ou 2 dias por semana para diminuir o risco de tolerância, ou Pemolina, de efeito mais prolongado, 40-120 mg/dia, ou Modafinil, estimulante central alfa com poucos efeitos colaterais, 300 mg/dia, são os medicamentos de escolha por sua ação periférica limitada, seu baixo risco de produzir sonolência e tolerância e seletividade no alerta. As anfetaminas são utilizadas em doses de 40 mg ou menos/dia.

Outros compostos com propriedades estimulantes são: Selegilina (IMAO-B) que aumenta o alerta, com menores efeitos secundários que as anfetaminas; Codeína que parece ser mais promissora que a própria Pemolina e o Mazindol (imidazol anorexígeno), 3-8 mg/dia em casos moderados (Osuna & Rubiano, 1992, 1994).

Para o tratamento da cataplexia e da paralisia do sono, são indicados: a Protriptilina, 5-30 mg/dia, a Viloxazina que diminui o REM, a cataplexia e a sonolência ao inibir a recaptação de noradrenalina, a Fluoxetina (Baker & Hesla, 1991), o Gama-hidroxibutirato que diminui a sonolência e a cataplexia, o Propranolol e a Clomipramina (25 a 100 mg/dia; de início rápido, embora com o inconveniente da tolerância após um ano de tratamento) (Shapiro, 1975; Parkes, 1979).

É preciso acrescentar ao tratamento farmacológico indicações sobre a higiene do sono, permitindo uma soneca em caso de grande sonolência ou segundo um horário pré-estabelecido de 15 minutos de duração (10h, 13h e 16h). Recomendar abster-se de dirigir veículos ou máquinas perigosas, evitar refeições abundantes, álcool ou chocolate e evitar situações de alto conteúdo emocional (Osuna & Rubiano, 1992, 1994).


 

3. Transtornos do Ritmo Circadiano (Sono-Vigília)

 

No organismo humano, muitos sistemas fisiológicos desenvolvem um ritmo circadiano regular. Em um estado de isolamento, sem controle por relógios, luz solar ou o padrão normal de atividade diária, vários dos principais ritmos circadianos do homem têm um ciclo de 25 horas. Portanto, o ciclo diário de 24 horas requer um ajuste de quase 1 hora no ritmo já aceito como “natural”. Ao mudar os horários cotidianos, geralmente é mais difícil levantar mais cedo do que despertar uma hora mais tarde.

Os transtornos do ritmo circadiano são classificados em (Osuna & Rubiano, 1992, 1994; Osuna, 1993):

 

Síndrome com Fase Atrasada para Dormir:

 

Pacientes que adormecem às 2-3 da manhã e levantam mais tarde do que o usual ou com sonolência pela manhã. O sono é normal em tempo e fases, embora possa apresentar uma latência do sono prolongada e encurtamento moderado da latência do REM. O tratamento é feito com cronoterapia, deitando o paciente 3 horas mais tarde a cada dia e deixando-o dormir 8-9 horas até chegar ao horário desejado. A luz brilhante nas horas da manhã (6h às 9h) (luz fluorescente sobre as sobrancelhas a 1500-2000 lux), com restrição da luz à noite, pode ser útil também. Outros recursos são o exercício intenso nas horas da manhã. Em alguns pacientes, a adição de Triazolam pode ser útil.

 

Síndrome com Fase Adiantada para Dormir:

 

Pacientes que se deitam e se levantam muito cedo e com uma duração do sono de 6-7 horas (o que constitui um diagnóstico diferencial com depressão). É mais frequente em idosos. Pode ser útil o uso da cronoterapia com exposição à luz brilhante nas horas da tarde e colocação de lentes escuras pela manhã.

 

Síndrome Hipernictemeral:

 

Padrão de atraso progressivo no início do sono, iniciando o ciclo sono-vigília cada dia mais tarde. Sugere-se um transtorno retinohipotalâmico ou do núcleo supraquiasmático, pois também ocorre em pacientes cegos e com transtornos psiquiátricos. Recomenda-se o uso de vitamina B12, 1,5 mg/dia.

 

Síndrome do Jet-Lag:

 

Os ajustes às mudanças de fuso horário após uma viagem aérea demoram mais na direção Oeste-Leste; adaptar-se a um fuso horário localizado no Oriente é quase o mesmo processo que despertar mais cedo; na polissonografia, pode-se observar aumento da latência do sono, diminuição no REM e reduções menores no sono de ondas lentas.

 

Transtorno do Sono por Rotação dos Horários de Trabalho:

 

Quanto à rotação de turnos de trabalho, uma rotação satisfatória é aquela que ocorre de turnos noturnos para diurnos e para vespertinos, em vez da ordem contrária. Ao seguir uma progressão no sentido do relógio para turnos tardios, a ordem de rotação impõe menos tensão na capacidade adaptativa do relógio interno. Em estudos polissonográficos, pacientes com transtorno do ritmo circadiano por rotação de turnos de trabalho podem apresentar uma latência do sono encurtada e uma redução na duração do sono às custas da etapa 2 e do REM.


 

4. Outros Transtornos do Sono:

 

Presença de insônia ou hipersonia ocasionada por uma condição médica geral ou pelo uso de substâncias ou medicamentos. A insônia secundária a outros transtornos mentais é a patologia mais comum dos transtornos do sono (35-50%). A hipersonia secundária a eles é muito menos frequente (< 5%) (Osuna & Rubiano, 1994; American Psychiatric Association, 1994).

 

Transtornos Psiquiátricos:

 

Transtorno de ansiedade generalizada (com dificuldade para conciliar o sono e frequentes despertares); Transtorno depressivo maior (com dificuldade para conciliar o sono [prolongamento na latência do sono] ou despertar precoce com incapacidade de retornar ao sono, diminuição das etapas 3 e 4, diminuição da latência do REM e aumento na densidade do REM); Transtorno bipolar; depressão atípica e distimia (hipersonia); Esquizofrenia (diminuição do sono total, da latência e densidade do REM e do sono de ondas lentas); Demência (incapacidade de manter o sono, alteração do ritmo circadiano, parassônias do sono REM e confusão ao despertar por degeneração das vias do sono); Transtorno de personalidade borderline; Transtorno de pânico (despertares paroxísticos ao entrar nas etapas 3 e 4)…

 

Condições Médicas Gerais Não Psiquiátricas:

 

Tensão muscular paravertebral, doenças cardiorrespiratórias, glaucoma, refluxo gastroesofágico (por maior secreção do ácido clorídrico à meia-noite), AVC, doenças neuromusculares, dor crônica, ICC, artrite reumatoide, cefaleia em salvas tipo Horton (histamínica), fibromialgia, doença de Parkinson (com frequentes despertares em até 75% dos pacientes por comprometimento das vias neurológicas do sono, rigidez e medicação agonista dopaminérgica), doença de Huntington (frequentes despertares e diminuição do tempo total de sono), epilepsia (que pode ser ativada pelo sono, manifestando-se como parassônias como terrores noturnos ou sonambulismo), hipo e hipertireoidismo, hipo e hiperadrenocorticismo, encefalite viral, bronquite crônica; insuficiência renal crônica, anemia e diabetes mellitus (podem causar síndrome das pernas inquietas e mioclonia noturna)…

 

Abuso de Substâncias ou Consumo de Medicamentos:

 

Anfetaminas e outros estimulantes (insônia durante a intoxicação e hipersonia durante a abstinência), cafeína (latência do sono prolongada, despertares frequentes e diminuição no sono de ondas lentas), opioides (com redução no sono REM sem alteração de outras variáveis no consumo de curto prazo, mas com insônia no uso continuado), BZD e outros sedativos e hipnóticos (com diminuição do REM, dos fusos do sono e dos complexos K e redução do sono total com “rebote” do sono REM no uso continuado ou na suspensão abrupta), álcool (com encurtamento da latência do sono, aumento do sono profundo na primeira metade e do REM na segunda metade no consumo agudo, mas com fragmentação, múltiplos despertares e diminuição das fases 3 e 4 e do REM no consumo crônico).

Entre os medicamentos encontram-se: IMAOs, ISRS, anti-hipertensivos (betabloqueadores, Metildopa, Reserpina), diuréticos, anticonvulsivantes, alfa metil dopa, Propranolol, Reserpina, Teofilina, Tiroxina, anticoncepcionais e esteroides (que devem ser administrados pela manhã).


 

5. Parassônias (Transtornos Associados às Etapas do Sono)

 

São transtornos do comportamento durante o sono associados a episódios breves ou parciais de despertar, sem que ocorra uma interrupção importante do sono nem alteração no nível de vigília, e associados a diferentes etapas do sono ou à transição sono-vigília (tabela 13).

 

Associadas ao Despertar:

 

Despertar com confusão; principalmente em crianças, com movimentos e gemidos, choro e transpiração marcada. Dura 5-15 minutos e não requer intervenção alguma (Osuna & Rubiano, 1992, 1994).

 

Associadas à Transição Sono-Vigília ou Vice-Versa:

 

As mais frequentes são os “movimentos hípnicos”, movimentos mioclônicos ou movimentos rítmicos estereotipados e repetitivos no início do sono; mais comum na infância e em crianças com retardo mental. Não requer tratamento (Osuna & Rubiano, 1992, 1994).

 

Associadas ao REM (Transtorno do Comportamento do Sono REM):

 

Com diminuição da atonia e aparecimento da atividade motora relacionada ao conteúdo onírico, aparentemente por comprometimento das fibras inibitórias descendentes para o tronco cerebral e medula espinhal (tratos tegmento-reticular e retículo-espinhal) por lesões isquêmicas periventriculares e na região pontomesencefálica. Principalmente em maiores de 60 anos. Tratamento: Clonazepam, 0,5-1,5 mg/dia indefinidamente. Imipramina ou Carbamazepina nos não respondedores (Osuna & Rubiano, 1992, 1994).

 

Terrores Noturnos:

 

Aparecimento de sonhos aterrorizantes de poucos minutos de duração (1 a 10), de forma repetida, que levam a sensação de ansiedade intensa durante o sono com gritos, choro e expressão de pânico, taquicardia, taquipneia e diaforese, às vezes com levantadas e corridas, que não respondem aos esforços de outros para despertá-lo ou acalmá-lo; se o indivíduo acorda, encontra-se confuso, sem recordar o sonhado, desorientado e com vocalizações ininteligíveis; pode voltar a dormir e geralmente apresentará amnésia para o episódio na manhã seguinte. O episódio costuma ser único, embora às vezes ocorram vários em uma noite.

O cansaço extremo, a privação de sono, a febre, a distensão vesical, o uso de sedativos ou álcool e o estresse físico ou emocional podem aumentar sua apresentação. São mais comuns em crianças maiores e adolescentes jovens (1-3% da população geral) durante a fase 4 (no primeiro terço do sono) e precedidos por um aumento no voltage da atividade ao EEG (alfa ou teta) com aumento do tônus muscular e taquicardia.

O tratamento raramente é necessário em crianças, pois o transtorno costuma desaparecer durante a adolescência de forma espontânea; em adultos, podem ser utilizados BZD (Clorazepato) e antidepressivos tricíclicos por curto tempo (Osuna & Rubiano, 1992, 1994).

Sonambulismo:

 

Episódios repetidos de comportamento motor complexo que inclui levantar da cama e caminhar, realização de tarefas complexas e abertura dos olhos ou movimentos desajeitados, sem propósito. É difícil despertar o paciente e, ao fazê-lo, ele se encontra confuso e com amnésia do episódio ou recordação fragmentária. A atividade motora costuma terminar espontaneamente, o paciente pode despertar ou voltar para a cama e continuar dormindo. Os episódios são breves (15-30 minutos) e podem ser desencadeados por estímulos internos como a distensão vesical ou estímulos externos como ruídos ou luzes ou medicamentos como Tioridazina, lítio, Perfenazina, Desipramina.

Apresenta-se durante o sono profundo (etapa 4, no primeiro terço); outras parassônias próprias desta etapa podem ocorrer concomitantemente (Terrores noturnos). Em alguns adultos, podem se manifestar durante a etapa 2. Precedendo o episódio, o EEG mostra atividade de alta voltagem (alfa). Histórico pessoal de transtornos do afeto, de personalidade ou de ansiedade e histórico familiar de parassônias podem estar presentes, sugerindo uma transmissão genética (o risco de apresentar o transtorno quando ambos os pais o apresentam é de 60%). Geralmente associa-se à enxaqueca infantil.

Entre 10 e 30% das crianças já tiveram pelo menos um episódio de sonambulismo, mas a prevalência (episódios repetidos com alteração significativa) é de 1 a 5%. O início do transtorno ocorre entre 4 e 8 anos de idade, desaparecendo espontaneamente na adolescência (15 anos de idade) na maioria dos casos.

Tratamento: BZD (que suprimem a fase 4), antidepressivos tricíclicos por curto tempo (Osuna & Rubiano, 1992, 1994).


 

Pesadelos:

 

Ocorrência repetida de sonhos aterrorizantes próprios da fase REM com recordação do conteúdo e início na segunda metade do sono que levam ao despertar com sensação de medo ou ansiedade, o que às vezes dificulta o retorno ao sono. No entanto, apresentam-se com menor ansiedade, confusão, vocalização, motilidade e descarga autonômica que os terrores noturnos. Os pesadelos que ocorrem após eventos traumáticos podem replicá-los. Alguns pesadelos, especialmente os relacionados com um Transtorno de estresse pós-traumático, podem ocorrer durante o sono NREM, particularmente na etapa 2. Podem ser devidos também à suspensão de BZD ou antidepressivos tricíclicos. São mais frequentes em mulheres do que em homens (2-4:1). Quase 50% de todos os humanos já experimentaram um pesadelo em suas vidas. Não requerem tratamento (Osuna & Rubiano, 1992, 1994).


 

Bruxismo:

 

Contração acentuada dos masseteres e temporais de forma episódica por segundos ou minutos, repetidamente e durante a fase 2 principalmente. Causas prováveis: má oclusão, tendência familiar, estresse. Pode afetar a dentição e levar a dor facial e cefaleia. Seu manejo é feito com placas odontológicas e Trimipramina [SURMONTIL], 150-200 mg/dia por tempo indefinido (Osuna & Rubiano, 1992, 1994).


 

Outras Parassônias (Osuna & Rubiano, 1992):

 

  • Hemoglobinúria noturna: De caráter paroxístico e devida a uma hemólise.
  • Ereções dolorosas: Relacionadas com o sono REM.
  • Cefaleias noturnas: De caráter unilateral, associadas ao REM; são manejadas com Amitriptilina, Indometacina, derivados do ergot.
  • Paralisia do sono familiar: Crises súbitas de imobilidade que se apresentam ao despertar principalmente e que não são acompanhadas de outra sintomatologia; padrão familiar presente.
  • Transtorno do comportamento do sono REM: Com perda da atonia e devido a causas neurológicas. Tratamento: Clonazepam, 0,5-2 mg/dia.
  • Asma: Mais comum e grave à noite. As crises associam-se à fase REM.

 

Transtornos Psicossomáticos

 

 

Definição

 

Os transtornos psicossomáticos consistem na associação de doença orgânica demonstrável (diferente do Transtorno somatoforme) com fatores psíquicos que a iniciam ou exacerbam. Existem muitas teorias que tentam explicar essa associação. Fala-se, por exemplo, de pacientes com Personalidade tipo A, na qual predomina uma hiperfuncionalidade do S.N.A. com relações inafetivas, operatividade (falta de fantasias), alexitimia (sem emoções), competitividade, agressividade, hiperatividade, urgência do tempo… (Goldsmith & Levin, 1993).

Outros autores pensam que cada pessoa tem um órgão suscetível às mudanças autonômicas do estresse prolongado (órgão de choque), pelo qual alguns serão “reagentes gastrointestinais”, outros cardíacos, outros de tensão muscular… Outros falam da importância do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, que ao produzir cortisol, afeta alguns tecidos diretamente ou por diminuição de mecanismos homeostáticos, o que levaria a infecções e outros transtornos (Seward, 1993).

As depressões do paciente psicossomático costumam ser “mascaradas“, com inibição psicomotora ou agitação, tonturas, arritmias, boca seca, constipação, transtorno do sono, dor, diminuição do apetite, dismenorreia, impotência… O paciente costuma apresentar antecedentes pessoais de alexitimia infantil, família superprotetora, rígida, com incapacidade de solucionar conflitos e aglutinada.


 

Patologia Associada

 

  1. Asma: Pacientes com marcada dependência e ansiedade de separação. Ataques precipitados por estresse. Examinar a dinâmica familiar, especialmente quando a criança é o paciente e está superprotegida.
  2. Colite ulcerativa, cólon irritável, doença de Crohn: Em pacientes com atitude passiva, traços obsessivos, hostilidade e medo do castigo, com afeto depressivo e má qualidade do sono. Inicia após uma situação muito estressante. Geralmente respondem adequadamente ao tratamento psicoterapêutico e médico.
  3. Eczemas e neurodermatites: Em pacientes com sexualidade conflituosa e irritabilidade reprimida. A manifestação dermatológica ocorre em resposta a múltiplos estressores psicossociais.
  4. Doença ácido-péptica: As doenças gastrointestinais, especialmente a úlcera péptica, relacionam-se com o estresse, mudanças no estilo de vida e consumo de café e álcool; a atividade do sistema nervoso autônomo participa na secreção abundante de ácido clorídrico e as concentrações de pepsinogênio sérico aumentam. Outros problemas gastrointestinais como os transtornos de alimentação, dispepsia funcional e constipação, também foram relacionados (Seward, J.P., 1993). Respondem à terapia de relaxamento.
  5. Artrite Reumatoide e LES: Que se acompanham de estresse crônico e depressão. Tem sido descrita a utilidade da S-adenosilmetionina em comorbidade com depressão.
  6. Urticária e Angioedema: De tipo idiopático, não relacionada com alérgenos ou estímulos físicos em pacientes com estresse, ansiedade crônica ou depressão. Algumas fenotiazinas têm efeito antipruriginoso.
  7. Angina e arritmias: Em pacientes com personalidade tipo A. Existem provas para designar o estresse como fator de risco de doença cardiovascular, a coronariopatia e o infarto do miocárdio; tem sido demonstrado que o colesterol sérico se eleva, assim como a pressão arterial, o consumo de tabaco e os níveis séricos das catecolaminas (Seward, 1993). As arritmias podem apresentar-se em estados de ansiedade marcada e que podem levar à morte (arritmias ventriculares). Seu tratamento, além de incluir medicamentos como o Propranolol em alguns casos acompanhados de taquicardia, requer a mudança de estilo de vida, perda de peso, diminuição na ingestão de álcool e cigarros e normalização do perfil lipídico.
  8. Cefaleias: Inclui a cefaleia tensional por espasmo dos músculos paravertebrais da nuca e enxaqueca pelas mudanças vasomotoras cerebrais. Associam-se à ansiedade e estresse situacional. Podem ser úteis a terapia de relaxamento e os ansiolíticos. A enxaqueca responde à Amitriptilina e à Flunarizina.
  9. Hipertensão arterial: O estresse agudo desencadeia a liberação de catecolaminas que aumentam a pressão sistólica. O estresse crônico associa-se à HTA essencial. Para o manejo devem ser prescritos medicamentos anti-hipertensivos, exercício, terapia de relaxamento, dieta baixa em gorduras e sal e BZD em estados de estresse agudo e se os níveis tensionais atingirem níveis perigosos para os órgãos-alvo.
  10. Síndrome de hiperventilação: Costuma acompanhar o Transtorno de pânico ou de ansiedade generalizada e associa-se a taquicardia e vasoconstrição. Pode ser perigoso em pacientes com doença coronariana. Utilizam-se ansiolíticos (BZD).
  11. Obesidade: A hiperfagia é um comportamento compensatório à ansiedade e é entendida como uma alteração para perceber o apetite, a fome ou a satisfação por um comprometimento dos centros hipotalâmicos da saciedade e da fome. Os pacientes costumam ter traços depressivos.

Também podem fazer parte deste transtorno entidades como Diabetes Mellitus, acne, alergias, hipertiroidismo, hipotiroidismo, hipoparatiroidismo, doença de Cushing, doença de Addison, porfiria, Feocromocitoma, esclerose múltipla, hipoglicemia, náuseas, menstruação dolorosa, prurido anal, dor sacroilíaca, taquicardia, vômitos, verrugas, hipotensão, transplante de órgãos e cirurgias (Hall et al., 1978).


 

Tratamento (Terapêutica)

 

Terapia grupal, terapia comportamental (de relaxamento, por exemplo), psicoterapia de apoio e dinâmica breve, em associação a fármacos ou procedimentos para o controle do transtorno somático em curso. São úteis, por exemplo, os betabloqueadores em enxaqueca e sintomas autonômicos e cardíacos como taquicardia; procinéticos em cólon irritável e dispepsia funcional; Tiapride, Flupentixol, em fadiga, vertigem, síndrome da fadiga crônica; Buspirona, em ansiedade associada; BZD em cefaleia tensional por seu efeito como relaxante muscular e tranquilizante; antidepressivos para a depressão “mascarada”.

O placebo é uma substância sem atividade farmacológica conhecida que atua através da sugestão e das mudanças fisiológicas que dela derivam. São muito utilizados nesse tipo de pacientes com respostas variáveis. O uso de um placebo deve ser reservado para aqueles casos em que não é possível utilizar uma terapia efetiva e deve ser evitado em pacientes com outro tipo de transtornos mentais, como hipocondria, ou quando o paciente consciente de tal medicação não a aceita.


 

Síndrome de Fadiga Crônica

 

A entidade não tem uma origem recente, mas foi denominada de diferentes formas: febrícula (Richard Manningham, 1750), neurastenia (George Beard, 1869), síndrome de DaCosta (1871), brucelose crônica (Alice Evans, 1934), hipoglicemia (anos 60 e 70), síndrome de alergia total (anos 80) e candidíase crônica (Truss, Crook et al., 1981). Os conceitos de fadiga crônica ou síndrome de disfunção imune são mais adequados, pois os pacientes com essa entidade diferem imunologicamente dos controles saudáveis (anticorpos mais elevados para antígenos virais, diminuição no número de células natural killer) e apresentam um número significativo de sintomas afetivos (Straus, 1991).

 

1. Definição e Características:

 

Entidade clínica imprecisa de sintomas somáticos, emocionais e cognitivos que levam à fadiga generalizada incapacitante (Barofsky & Legro, 1991). Mais comum em mulheres brancas de classe alta entre 20 e 40 anos de idade. Aparece geralmente de forma gradual, após uma doença febril com lenta melhora e recaídas.

Os sintomas próprios da SFC não costumam ser progressivos em intensidade, sendo característico que sua maior severidade se apresente no primeiro ano de evolução, com melhora para a maioria dos pacientes aos 2 anos de iniciado a síndrome.

Não parece ser contagiosa nem mortal. Há várias hipóteses sobre sua etiologia, entre as quais se contam: infecção por vírus Epstein-Barr, retrovírus, giárdias ou candidíase crônica; supressão imune mediada por células ou alergias ambientais; diminuição do cortisol plasmático, hipotireoidismo, hipoglicemia ou anemia. Postula-se então, coinfecção em indivíduos imunologicamente suscetíveis por fatores genéticos e com tensões emocionais (Zal, 1993).

 

2. Diagnóstico (Holmes, 1991):

 

Para fazer o diagnóstico de SFC, é preciso apresentar ambos os critérios maiores, 6 ou mais critérios sintomáticos (menores) e 2 ou mais critérios físicos (representam-se também as frequências dos sintomas com 2 coortes de 510 pacientes no total (Komaroff & Buchwald, 1991)):

Critérios maiores:

  • Fadiga prolongada, severa e generalizada (diferente da fibromialgia, que é menos persistente) e que não se resolve com o descanso (100% dos pacientes). Entidades clínicas crônicas ou psiquiátricas foram previamente excluídas.

Critérios menores: Sintomas persistentes ou recorrentes com mais de 6 meses de duração. (1) Febre leve (37,5 a 38,6 ºC) (60% a 95%) (2) Dor de garganta (faringite) (50% a 75%) (3) Nódulos linfáticos dolorosos nas axilas ou cadeias cervicais anterior e posterior (30% a 40%) (4) Fraqueza muscular generalizada não explicada (40% a 70%) (5) Mialgias (20% a 95%) (6) Fadiga generalizada prolongada (> 24 h) diante de exercícios previamente tolerados (100%) (7) Cefaleias generalizadas de nova aparição (35% a 85%) (8) Artralgia migratória não inflamatória (40% a 50%) (9) Sintomas neuropsicológicos: fotofobia, escotomas visuais transitórios, esquecimentos, irritabilidade excessiva, confusão, dificuldade de pensamento ou cognição alterada (50% a 85%), inabilidade para se concentrar e depressão (70% a 85%). (10) Transtornos do sono (11) Início de sintomas de forma aguda ou subaguda, segundo o paciente.

Critérios físicos: Documentados por um médico em pelo menos 2 ocasiões com um intervalo de mais de 1 mês: (1) Febre leve (10% a 20%) (2) Faringite não exsudativa (40% a 60%) (3) Nódulos linfáticos palpáveis (< 2 cm) no pescoço e axilas (20% a 40% e 5% a 15% respectivamente)

 

3. Transtornos Cognitivos e do Humor:

 

Inicialmente, como foi dito, pensava-se que a SFC estava associada a uma infecção pelo vírus EB (mononucleose infecciosa) e que por isso se apresentava uma série de transtornos cognitivos como amnésia ou afasia. No entanto, um bom número de pacientes com SFC sem infecção ativa pelo vírus EB, podem apresentar alterações cognitivas também. Foram feitos estudos para avaliar a relação entre a SFC e a depressão. Manu et al., encontraram que 69% dos pacientes avaliados com SFC apresentavam um transtorno psiquiátrico que foi considerado uma causa maior da SFC (Manu et al., 1989). Straus et al. encontraram uma alta incidência de problemas psiquiátricos em pacientes com SFC (65%) com 90% relatando um transtorno na capacidade de concentração (Straus et al., 1988). Alguns estudos avaliaram o papel do vírus EB em pacientes deprimidos sem SFC. Esses estudos encontraram relações significativas entre a presença do vírus e os sintomas depressivos em alguns casos (Allen & Tilkian, 1986; DeLisi et al., 1986), mas outros não relataram diferença alguma com os controles (Amsterdam et al., 1986). A presença do vírus também foi observada em casos de estresse e transtornos de personalidade em geral. Miller et al., sugerem inclusive que os ADT podem inibir a resposta imune celular e isso tornaria os pacientes depressivos suscetíveis à infecção pelo vírus EB (Miller et al., 1986). O alcoolismo também se apresenta com maior frequência nos parentes de pacientes com SFC (Swanson et al., 1978).

 

4. Diagnóstico Diferencial:

 

Malignidade, doenças autoimunes, inflamatórias, endócrinas ou orgânicas crônicas, hepatite crônica (B ou C), doença de Lyme mal tratada, HIV, tuberculose, depressão psicótica, transtorno bipolar, esquizofrenia e abuso de substâncias. Akiskal, H. considera que esse transtorno deveria ser classificado entre os transtornos do humor, já que seu quadro clínico é compatível com um transtorno bipolar III (pseudounipolar), com um transtorno distímico de base e ocorrência de períodos hipomaníacos (Zal, 1993).

O Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos recomenda incluir no diagnóstico os transtornos somatoformes e de ansiedade (generalizada ou de pânico), depressão, fibromialgia, mononucleose infecciosa mais toxoplasmose, brucelose e doença de Lyme tratadas adequadamente e que se apresentam antes e depois da crise.

Laboratório: Urinálise, hemograma e sedimentação, eletrólitos, glicemia, ureia, creatinina, Ca++, função tireoidiana, anticorpos antinucleares, direto, Gram e cultura de pontos moles (gânglios linfáticos) e SPECT (hipoperfusão temporal anterior bilateral e frontal dorsomedial por danos no nível da amígdala e do hipocampo).

 

5. Tratamento:

 

Analgésicos, antipiréticos, anti-inflamatórios, anti-histamínicos, dieta baixa em gorduras e açúcares, diminuição de peso e inatividade, exercícios, antidepressivos (Bupropiona, RIMAs), Alprazolam, Tiapride, Lítio, Ácido Valproico. Psicoterapia de apoio e cognitiva, terapia grupal (Zal, 1993).


 

Fibromialgia

 

 

1. Definição e Diagnóstico:

 

Em 1990, foram estabelecidos os critérios para o diagnóstico da entidade (CAR): Dor generalizada nos quatro quadrantes corporais (presente em 97% dos casos) e mais de 11 pontos dolorosos à palpação de 18 possíveis (90% dos casos) sem sinais histológicos de inflamação (Dailey et al., 1990). Esse par de critérios confere uma sensibilidade de 88% e uma especificidade de 81%. Outros sintomas que podem ocorrer são fadiga, alteração do sono e rigidez matinal (mais de 75% dos casos), parestesias (67%), ansiedade (45%), cefaleia (54%) e cólon irritável (36%). Entre os fatores agravantes estão: frio, umidade, mudança de clima, ansiedade, estresse e fadiga. Embora Clark et al. não encontrem diferenças significativas entre os pacientes com a síndrome e os controles com respeito às medidas psicológicas, outros autores encontraram uma fraca relação próxima de 0,3 (Clark et al., 1985; Dailey et al., 1990).

As alterações do sono consistem em predomínio das ondas alfa em 36% dos pacientes e durante mais de 60% do sono NREM às custas das ondas delta, tradicionalmente consideradas restauradoras. Alguns autores chegaram a suspeitar de uma forte relação com os transtornos depressivos pela similaridade nos padrões de sono.

A depressão pode estar presente em 20% a 71% dos casos, inclusive um ano antes do aparecimento da síndrome, segundo estudo realizado por Hudson et al. em 22 pacientes. A presença de familiares com transtorno afetivo costuma ocorrer em 47% desses indivíduos (Hudson & Pope, 1989).

 

2. Etiologia:

 

Existem duas teorias sobre a patogênese da fibromialgia, a central e a periférica. O componente periférico está localizado no sistema musculoesquelético; no entanto, nenhum defeito muscular foi demonstrado. Vários estudos sugeriram mudanças focais musculares em termos de: redução de fosfatos de alta energia, fibras vermelhas rompidas e espalhadas, mudanças focais na tensão de oxigênio e repetitivas “bandas de contração”. Essas mudanças podem resultar de microtraumas musculares (como os que ocorrem após um exercício incomum) que causam uma disrupção na membrana sarcolêmica, levando a um influxo de Ca++ que, por sua vez, ocasiona uma contração sustentada das miofibrilas e uma depleção do ATP dependente de Ca++.

O componente central relaciona-se com os níveis alterados de hormônio do crescimento e de somatomedina C, as quais são essenciais para a homeostase do músculo e a reparação dos microtraumas. As causas de tais microtraumas musculares podem ser muito variadas, desde depressão, ansiedade generalizada, estresse… até transtornos do sono que comprometem a etapa IV (onde é secretado o hormônio do crescimento) (Bennett, 1993).

Também foi encontrada diminuição da serotonina no LCR e aumento de receptores serotoninérgicos plaquetários (Russell et al., 1987). Outras aminas como a noradrenalina e a dopamina também apresentam alterações, assim como a substância P (aumentada) e o neuropeptídeo Y (diminuído); todos eles envolvidos na modulação da dor. No entanto, não foram relatadas alterações nos peptídeos opioides endógenos. As mudanças endócrinas são vagas, com leve perturbação do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal manifestada em hiporresposta adrenal e não supressão do cortisol no TSD.

Imagens de SPECT relatam diminuição do fluxo sanguíneo cerebral no tálamo, cabeça do caudado e córtex.

 

3. Epidemiologia:

 

Apresenta-se em até 2% da população geral e abrange 20% das consultas reumatológicas. É mais frequente em mulheres (3,7% vs. 0,5% em homens).

 

4. Tratamento:

 

Entidade com pouca resposta aos tratamentos convencionais. Tem sido utilizada Amitriptilina em doses baixas (50 mg/dia) com uma melhora média de 63% vs. 32% com placebo (Carette et al., 1986), mas com remissões totais após 3 anos de apenas 5% (Goldenberg, 1989). Outros tratamentos propostos com menores taxas de melhora são: Alprazolam, S-adenosilmetionina, Ciclobenzaprina (tricíclico similar à Amitriptilina com ação periférica e central), Doxepina, Fluoxetina, Clormezanona e Clorpromazina (por sua ação sobre a fase IV do sono). A eletroacupuntura, a hipnoterapia e o bloqueio ganglionar são tratamentos alternativos.


 

Transtornos Somatoformes

 

Presença de sintomas físicos que sugerem, convencem e preocupam o paciente de possuir um transtorno corporal como consequência de uma condição médica geral, mas cuja origem não pode ser esclarecida nesse sentido, nem se deve ao uso de substâncias ou a um ataque de pânico. Os sintomas podem ter um fator psicológico (estressante) determinante para seu início, exacerbação e manutenção, causando significativo mal-estar ou alteração no funcionamento social, ocupacional ou de outra índole. Em contraste com o transtorno factício ou a simulação (ver mais adiante), os sintomas físicos não são intencionais; por outro lado, o paciente com transtorno somatoforme difere daquele com um transtorno psicossomático em que não há uma condição médica geral identificável (American Psychiatric Association, 1994).

Os pacientes com transtornos somatoformes foram apontados como escandalosos, manipuladores ou distorcedores, mas não se leva em conta que a perda de concordância entre os achados físicos objetivos e o sofrimento subjetivo pode ser devido a uma série de percepções internas desorganizadas e crenças incomuns. No entanto, e apesar de o diagnóstico de transtorno somatoforme não dever ser um diagnóstico de exclusão, devem ser descartados transtornos como esclerose múltipla, sífilis do SNC, tumores cerebrais, hipertireoidismo, hiperparatireoidismo, porfiria aguda intermitente, lúpus eritematoso e miastenia gravis, entre outros (Guggenheim & Smith, 1995).


 

Transtorno de Conversão

 

 

1. História:

 

Até meados do século XIX, foi denominado, em combinação com o transtorno de somatização, como histeria. Paul Briquet foi o primeiro a propor o conceito moderno de transtorno de conversão, considerando-o como uma disfunção do S.N.C. em indivíduos predispostos e diante de uma situação de estresse severo. Jean-Martin Charcot afirmou que a predisposição dos indivíduos tinha bases genéticas. Sigmund Freud, a partir do caso de Anna O., utiliza o termo conversão para se referir a sintomas somáticos que surgem como consequência da repressão do material inconsciente que não pode assim acessar diretamente a consciência. Em 1929, Pierre Janet observou que os transtornos de conversão eram precedidos por uma diminuição no limiar da consciência, em relação aos transtornos dissociativos. O DSM-I (1952) utilizou o termo “reação de conversão”, enquanto o DSM-II (1967) o denominava “psiconeurose histérica, tipo conversiva”. O inconveniente desses sistemas de classificação era sua sustentação em bases psicodinâmicas que não permitiam uma aproximação objetiva à etiologia e sintomatologia do paciente. O ICD-9 (1978) da OMS, utilizava o termo “histeria” incluindo nele tanto os transtornos conversivos (que se expressam através da função corporal) quanto os dissociativos (que se expressam através da função da mente) (Guggenheim & Smith, 1995).

 

2. Definição:

 

Perda da função ou alteração no sistema sensitivo-motor sem patologia alguma do sistema nervoso periférico, de caráter involuntário; em alguns casos a sintomatologia radica no sistema nervoso autônomo. É de início súbito, posterior a trauma emocional e com sintomas variáveis; alguns autores consideram que a energia psíquica proveniente de um conflito agudo se transforma em manifestações corporais que simulam uma entidade médica geral (Guggenheim & Smith, 1995).

As características cardinais foram determinadas há vários anos sem maiores mudanças nos sistemas de classificação atuais: 1) Qualquer uma das funções afetadas é potencialmente capaz de ser influenciada por controle voluntário. 2) Os sintomas não refletem alterações em funções anatômicas conhecidas, não correspondem a vias neurológicas ou distribuições segmentares e não seguem padrões de resposta neurofisiológica conhecidos. 3) A magnitude da deficiência costuma interferir muito pouco com o estado de saúde do paciente. 4) Apresenta-se um distúrbio do afeto conhecido como “belle indifférence“, uma desproporcionada perda de interesse em relação à natureza incapacitante dos sintomas. Esse afeto pode ser observado também em pacientes com esclerose múltipla ou anosognosia por lesão do lobo parietal. O paciente não exibe comprometimento algum para reagir apropriadamente a aspectos emocionais que não envolvam as áreas afetadas. 5) Os pacientes tendem a ser altamente suscetíveis à sugestão externa, a ponto de a apresentação de uma ideia absurda poder ser aceita automaticamente e sem contradição. Além disso, a sugestão pode levar à transformação da sintomatologia ou à sua eliminação durante períodos variáveis de tempo (Janet, 1924). De acordo com Janet, “o estado mental dos pacientes que sofrem de histeria é caracterizado pela retração do campo de consciência, o que leva a um exagerado ‘absentismo da mente'”. A incapacidade de atenção conduz a alterações da memória com preservação de lembranças antigas prévias que podem ser reproduzidas automaticamente, enquanto os eventos recentes (especialmente aqueles com uma forte carga emocional) passam sem deixar vestígios por alteração da retenção ou da evocação” (Janet, 1924).

Os sintomas costumam desaparecer após 2 semanas de hospitalização, podendo ser alterados ou resolvidos devido à sugestionabilidade desses pacientes, mas podem recorrer no primeiro ano, e existem casos de transtornos de conversão crônicos que podem levar a sequelas irreparáveis por contraturas da extremidade “paralisada”. A maioria dos estudos de acompanhamento de vários anos relata recaídas em 25% dos pacientes. Os sintomas de melhor prognóstico são paralisia, afonia e cegueira, ao contrário do que ocorre com o tremor e as convulsões; também são indicadores de bom prognóstico o início agudo, eventos estressantes identificáveis, ausência de comorbidade psiquiátrica, médica ou neurológica e carência de mecanismos compensatórios (American Psychiatric Association, 1994; Guggenheim & Smith, 1995).

Pode associar-se a outros transtornos mentais como transtornos dissociativos, transtorno depressivo maior, transtornos de ansiedade, transtornos de personalidade histriônica (5% a 21%), antissocial, evitativa ou dependente (9% a 40%). Em mulheres, os sintomas conversivos são mais referidos ao lado direito do corpo. Em algumas mulheres, o transtorno pode progredir para um transtorno de somatização. Em homens, é mais evidente uma associação com transtorno de personalidade antissocial. Os sintomas conversivos em crianças menores de 10 anos costumam limitar-se a problemas na marcha ou convulsões (American Psychiatric Association, 1994) (tabela 14).

3. Sintomas Comuns (Guggenheim & Smith, 1995):

 

Crises psicomotoras (pseudoconvulsões): São movimentos convulsiformes anárquicos não intencionais de duração variável, sem relaxamento de esfíncteres, nem Babinski e reação pupilar normal, com gritos e fala. O paciente reage a estímulos externos e à atitude de quem o rodeia. Apresenta recuperação rápida com choro final e sem transtorno algum de consciência, nem letargia, sono ou confusão. (Prolactina sérica e EEG normais, considerando que 10-15% da população em geral tem um EEG anormal sem ter convulsão alguma). Apesar do exposto, até um terço dos pacientes em que se faz diagnóstico de pseudoconvulsões, apresentam verdadeiras convulsões.

Crises lipotímicas: Sem perda da consciência, nem lesão durante a queda (desmaio) que costuma ser aparatosa e posterior a tensão emocional.

Ataques catalépticos: Nos quais o paciente fica aparentemente dormindo, mas com EEG normal.

Paralisias motoras: Principalmente no lado não dominante, sem reflexos patológicos, nem fasciculações, atrofia ou alterações eletromiográficas, com comprometimento de movimentos determinados e não de toda a mobilidade de uma extremidade e sem relação alguma com a distribuição de nervos motores. Também se incluem afonia, disfagia, ataxia e astasia-abasia (marcha cambaleante com movimentos espasmódicos grosseiros, frequentemente com dificuldade para permanecer em bipedestação).

Contraturas musculares: Presentes no estado de vigília; sistematizadas, localizadas ou generalizadas.

Transtornos sensitivos: Anestesias, parestesias ou hiperestesias com uma distribuição que não corresponde a uma alteração neurológica (dermátomos), muito suscetíveis à sugestão, de caráter variável e com potenciais evocados normais. Também se apresentam transtornos visuais como cegueira ou visão em túnel (nos quais o paciente é capaz de caminhar sem ajuda e tem reflexos pupilares normais), anosmia (ausência de olfação), surdez…


 

4. Etiologia:

 

Embora os sistemas teóricos de predomínio psicanalítico atribuam a sintomatologia do transtorno à expressão simbólica do conflito subjacente ou a uma “tentativa primitiva de comunicação”, isso não pode dar conta adequadamente dos mecanismos pelos quais tais conflitos não resolvidos chegam a se transformar em sintomas físicos não fisiológicos e o porquê da indiferença dos pacientes em relação à sua deficiência, como se uma parte da mente estivesse dissociada ou separada das outras. A histeria agrupa certos transtornos de percepção, sensação, função muscular, consciência e outras funções psicofisiológicas (Ludwig, 1972). Em 1926, Kretschmer descobriu que a maioria das formas de histeria emanava de dois padrões de reação instintiva observados em animais como um mecanismo de preservação e adaptação em resposta a situações perigosas. Um deles é a “reação motora violenta” e o outro o de “imobilização reflexa ou morte fingida” com características hipnoides ou estuporosas. O perigo na histeria pode ser fantasiado ou imaginado, levando a movimentos de busca de ajuda e a um estado emocional difuso com frenéticas explosões de movimento como convulsões, estados de fuga, ataques emocionais violentos e tremores ou, pelo contrário, levando a estados de sonho, cegueira, surdez, paralisia, paresias, retenção urinária, astasia-abasia ou anestesia que permitem um adequado bloqueio do estímulo físico e emocional. Essas condutas podem ser reforçadas (a mal chamada “ganho secundário neurótico”) ao terem efeito como liberadoras do perigo potencial e podem ser reutilizadas em situações futuras, adquirindo qualidades automáticas e tornando-se mais refratárias ao controle voluntário (Ludwig, 1972). Já em 1956, Hernández-Peon et al. haviam medido a resposta do núcleo coclear de um gato a uma série de estímulos auditivos por meio de potenciais evocados. Estes diminuíram consideravelmente quando um rato foi apresentado ao gato em uma câmara de vidro, o que foi interpretado pelo cientista como prova da existência de um sistema regulador da estimulação aferente que influencia a entrada de tais estímulos no sistema de reconhecimento consciente (Hernández-Peon et al., 1956). Em 1967, Whitlock propõe as bases neurofisiológicas da histeria, a qual considera como um transtorno da atenção e da vigilância (alerta). Produz-se uma “depressão seletiva” da consciência de uma função corporal pela inibição corticofugal da estimulação aferente ao nível da formação reticular do tronco cerebral. Essa perda de atenção ou distração pode comprometer seriamente a apreciação ou reconhecimento da estimulação periférica e levar a um estado de dissociação entre a atenção e certas fontes de estimulação aferente (“belle indifférence”); isso explicaria a melhora da sintomatologia em estados de relaxamento, hipnose ou diante da administração de barbitúricos ou opiáceos (Whitlock, 1967; Ludwig, 1972). Pierre Flor-Henry em 1981, publicou um estudo sobre a etiopatogenia do transtorno conversivo, no qual pôde determinar que, sob circunstâncias extraordinárias, apresenta-se hipofunção do hemisfério dominante em diferentes níveis como mecanismo inicial, hiperreatividade do hemisfério não dominante e anormalidade nas conexões inter-hemisféricas, de tal maneira que se produzem defeitos no processamento de sinais somáticos endógenos e nas sinais sensório-motoras integrativas (Flor-Henry et al., 1981). Os transtornos na atenção e vigilância e na memória recente foram demonstrados também com avaliações neuropsicológicas, confirmando-se a disfunção de ambos os hemisférios cerebrais. A preponderância da alteração do hemicorpo esquerdo nos transtornos de conversão, a maior prevalência em mulheres (com maior instabilidade na organização do hemisfério direito) e a estreita associação com transtornos depressivos, estão a favor da vulnerabilidade do hemisfério direito não dominante; adicionalmente, e do ponto de vista filogenético, o hemisfério esquerdo associa-se a influências inibitórias (Drake, 1993).


 

5. Epidemiologia:

 

O transtorno de conversão é o mais frequente de todos os transtornos somatoformes, com incidências variáveis de acordo com o local onde o estudo é realizado, e se este é efetuado na população geral, em um serviço de internação (psiquiátrico ou não) ou em um serviço de urgências. Para alguns, a incidência do transtorno pode estar declinando (por maior acesso à educação, padrões socioculturais diferentes ou confiabilidade diagnóstica?).

Mais frequente em pacientes hospitalizados (10% vs. 0,15% em ambulatórios), principalmente em mulheres (2-5:1) com história familiar, e ocasionalmente procedentes de família numerosa, nível socioeconômico baixo, área rural e baixo nível de escolaridade. Raramente começa antes dos 10 anos de idade ou depois dos 35.

Vários estudos conseguiram estabelecer um maior grau de hereditariedade da histeria nos parentes femininos de primeiro grau de mulheres com diagnóstico de histeria (risco de 7%). Nos parentes masculinos, foi encontrado um maior nível de alcoolismo e sociopatia (Arkonac & Guze, 1963; Woerner & Guze, 1968). Young et al., utilizando diferentes escalas de avaliação (a Middlesex Hospital Questionnaire – MHQ e a Psychoticism, Extraversion and Neuroticism – PEN), conseguiu determinar a hereditariedade dos “traços de personalidade histérica” em 17 monozigóticos comparados com 15 dizigóticos (Young et al., 1971). Esses autores admitem, em geral, que os fatores ambientais (estresse) são provavelmente o maior fator determinante para induzir a descompensação e o desenvolvimento de uma neurose, mas que os fatores genéticos são os que determinam a forma que a neurose assume: ansiedade, histeria, fobia ou obsessão (supunham, portanto, um continuum).


 

6. Tratamento:

 

A maioria dos sintomas conversivos regredem espontaneamente após o tratamento comportamental, sugestão e suporte emocional. As crises podem ceder com Amobarbital, 100-500 mg em infusão IV lenta ou Lorazepam. O tratamento de base consiste no uso de BZD para a ansiedade e ISRS para a ruminação obsessiva dos sintomas (Guggenheim & Smith, 1995).


 

Transtorno de Somatização

 

 

1. Características:

 

Em 1859, Briquet enfatizou os aspectos multissistêmicos da doença, atribuindo-lhe uma origem emocional; além disso, reconheceu a presença da doença em homens. No entanto, estudos modernos só reconhecem um grau moderado de concordância entre a síndrome de Briquet e o transtorno de somatização. O transtorno de somatização caracteriza-se por queixas somáticas múltiplas e recorrentes não limitadas a um sistema corporal, de curso crônico com flutuações e de caráter vago e não explicadas sob a perspectiva médica geral (tabela 15). O indivíduo utiliza os sintomas corporais para manipular ou controlar as relações interpessoais de forma inconsciente; os utiliza como meio de expressão emocional (Guggenheim & Smith, 1995). Para que os sintomas somáticos não explicados medicamente tenham uma base psiquiátrica, são necessárias as seguintes características (Escobar, 1995):

1A. Os sintomas estão associados a um transtorno psiquiátrico primário, como depressão maior ou transtorno de pânico. 1B. Os sintomas aparecem em estreita proximidade temporal com certos eventos psicológicos, como trauma ou outras formas de estresse grave. 2. Os sintomas proporcionam alguma gratificação para o indivíduo (ganho secundário) ou representam um traço de personalidade previsível. 3. Os sintomas tornam-se persistentes, levando a atitudes como avidez por serviços de saúde e insatisfação crônica com os cuidados médicos; isso implica que essa entidade seja uma das mais custosas na medicina.


 

2. Sintomas:

 

Vômitos, dor nas extremidades, amnésia, dificuldade para deglutir, queimação nos genitais e reto (sensação), menstruação dolorosa, falta de ar… Geralmente, predomina um sintoma por episódio. O paciente tem múltiplas consultas médicas ou tratamentos, ou mudou seu estilo de vida. Além disso, caracteriza-se por baixa autoestima e depressão acompanhante, com comportamentos antissociais, tentativas (gestos) suicidas e discórdia conjugal; as vidas desses pacientes são frequentemente caóticas e complicadas por suas histórias médicas. O transtorno depressivo maior, o transtorno de pânico e os transtornos relacionados ao uso de substâncias frequentemente se associam ao transtorno de somatização. Os transtornos de personalidade mais frequentemente observados são o histriônico, borderline e antissocial. Curiosamente, os sintomas são muito mais comuns e de características diferentes em culturas não ocidentais e em sociedades em desenvolvimento, e são influenciados por fatores sociodemográficos e culturais. “Em algumas culturas, a apresentação de estresse pessoal/social na forma de manifestações somáticas é a norma”. Na América Latina, por exemplo, foram descritos um grande número de estados somatoformes e dissociativos que incluem “ataque de nervos”, “susto”, “mau-olhado”… que em alguns casos acompanham os transtornos depressivos (Escobar, 1995).

A evolução é variável, com aparecimento de novos sintomas diante de novos agentes estressantes. Os episódios costumam durar de 6 a 9 meses, com períodos de remissão de 9 meses em média (Lipowski, 1988).


 

3. Etiologia e Epidemiologia:

 

Algumas evidências apontam para a contribuição genética, mas os estudos não são conclusivos. Vários estudos encontraram incrementos significativos no transtorno somatoforme entre parentes femininos e um risco aumentado de transtorno de personalidade antissocial e alcoolismo entre os parentes masculinos (Bowman & Nurnberger, 1993). Avaliações neuropsicológicas demonstraram alterações bifrontais e no hemisfério não dominante, com alteração de potenciais auditivos evocados. Os pacientes respondem a estímulos relevantes e irrelevantes, o que sugere uma alteração na atenção seletiva.

Apresenta-se em menores de 30 anos, principalmente em mulheres (0,2-2% de todas as mulheres e menos de 0,2% nos homens), especialmente de classe baixa e histórico familiar positivo (10-20% dos casos) (American Psychiatric Association, 1994). Na Colômbia, o Estudo de Saúde Mental com uma amostra de 15.045 entrevistados revela uma prevalência ao longo da vida de 4,9%, com maior ocorrência em mulheres (6,8% vs. 3,0%) (Torres & Montoya, 1997).


 

4. Diagnóstico Diferencial:

 

Deve-se diferenciar de transtornos orgânicos como esclerose múltipla, síndrome de fadiga crônica, lúpus eritematoso sistêmico, porfiria (dor abdominal), esquizofrenia, transtorno de pânico, transtorno de ansiedade generalizada, transtornos do afeto, dor associada a fatores psicológicos, disfunção sexual, transtorno de conversão, transtorno dissociativo, hipocondria, transtorno factício, simulação (American Psychiatric Association, 1994).


 

5. Tratamento:

 

A mudança frequente de médico que o paciente vivencia em busca de ajuda é frustrante e nada terapêutica. É importante garantir em primeira instância o cuidado físico do paciente, estabelecer visitas regulares a cada 4 a 6 semanas, com consultas breves e evitando testes diagnósticos, avaliações laboratoriais e operações. A terapia grupal com orientação comportamental tem se mostrado eficaz, seus objetivos básicos são oferecer suporte emocional, estabelecer mecanismos de enfrentamento, aumentar a capacidade de perceber ou expressar uma emoção e convidar o paciente a desfrutar da experiência grupal (Guggenheim & Smith, 1995). Os antidepressivos foram propostos para dor crônica, fadiga crônica, somatização e hipocondria, enquanto os antipsicóticos como o Pimozide são recomendados em casos de transtorno dismórfico corporal ou delírios de infestação (Escobar, 1995).


 

Hipocondria

 

 

1. Definição e Características:

 

Preocupação e ideia supervalorizada não delirante de poder desenvolver ou ter uma doença que envolve funções corporais, anormalidades físicas menores ou sensações físicas vagas e ambíguas, a ponto de ter sido considerada por alguns autores como parte do espectro obsessivo-compulsivo (Fallon et al., 1991). O paciente vive centrado em seus incômodos e suas queixas parecem razoáveis, mas sua insistência em curá-las não, razão pela qual suas relações sociais ou familiares são alteradas; da mesma forma, as relações médico-paciente costumam deteriorar-se e levar frustração e raiva a ambas as partes, pois o histórico clínico, o exame físico e os exames laboratoriais costumam confirmar ao médico que não se trata de uma condição médica geral; ao esclarecer a origem de seu transtorno e a negatividade dos diversos exames, o paciente costuma rejeitar essa informação e continua na busca por novas opiniões. Embora qualquer órgão ou sistema funcional possa estar implicado, o cardiovascular e gastrointestinal são os mais predominantes (American Psychiatric Association, 1994) (tabela 16).

Resulta do aumento das sensações corporais normais. Segundo a psicanálise, como mecanismo de defesa egoica contra a culpa pelos desejos agressivos e hostis em relação a outros, de tal forma que são transferidos para manifestações físicas devido à repressão e ao deslocamento. Do ponto de vista da teoria da aprendizagem, o paciente aprende o papel de doente, o qual é reforçado pelo contato social ou pela necessidade de gratificação (Barsky, 1986). Para outros, a hipocondria é a outra face da moeda compartilhada com a histeria, pois enquanto os pacientes com histeria têm uma dissociação da atenção aos seus sintomas, o hipocondríaco tem a atenção centrada em seus sintomas, mostrando uma exagerada preocupação pelos mesmos com pouca suscetibilidade à sugestão; isso poderia ser explicado como o reconhecimento em níveis limiares de circunstâncias ou sensações que normalmente passariam despercebidas, por uma redução na inibição corticofugal (vias córtico-corticais e córtico-reticulares) dos estímulos aferentes (Pilowsky, 1967).


 

2. Epidemiologia:

 

A duração mínima do transtorno deve ser de 6 meses. Embora a origem seja psicogênica (contato sexual traumático [28,6% vs. 7,3% dos não hipocondríacos], violência física [32,1% vs. 7,3%] e transtorno maior nos pais [28,6% vs. 7,3%] antes dos 17 anos), pode ocorrer uma hipersensibilidade congênita às sensações e funções corporais (Barsky et al., 1994). Apresenta-se em igual proporção em homens e mulheres, e a prevalência é de 4% a 9%. Na Colômbia, o Estudo de Saúde Mental com uma amostra de 15.045 entrevistados revela uma prevalência ao longo da vida de 0,8% com uma maior apresentação em homens (1,0% vs. 0,6%) (Torres & Montoya, 1997).

A doença pode ocorrer associada a transtornos do apetite, transtorno de pânico e fobias, depressão maior, TOC, transtornos de personalidade e esquizofrenia (cenestopatias). Em alguns casos, encontra-se histórico pessoal de uma doença grave ou de um familiar (American Psychiatric Association, 1994).


 

3. Tratamento:

 

Aproximadamente 50% dos pacientes apresentam melhora, o restante exibe um transtorno crônico de curso flutuante. São sinais de bom prognóstico o nível socioeconômico alto, presença de outras condições tratáveis como ansiedade ou depressão, ausência de transtornos de personalidade e ausência de uma doença orgânica concomitante. Podem ser utilizadas diversas abordagens, mas com resultados variáveis: BZD, antidepressivos (ISRS) ou Clomipramina, 200 mg/dia em somatomorfismo ou obsessão (Stone, 1993), Pimozida ou Clomipramina em hipocondria monossintomática (Fernando, 1988); psicoterapia grupal cognitiva. As medicações mencionadas devem ser administradas com suficiente clareza sobre os aspectos a serem tratados com elas, pois podem ser tomadas pelo paciente como prova de que padece de uma entidade grave que deve ser medicada (Guggenheim & Smith, 1995).


 

Transtorno da Dor (Psicogênica)

 

 

1. Definição e Características:

 

Aparecimento em qualquer idade de dor aguda ou prolongada associada a fatores psicológicos, a condições médicas gerais ou a ambos. A dor pode comprometer vários aspectos da vida diária; o desemprego e os problemas familiares são frequentes, assim como o consumo de diferentes medicamentos, alguns deles aditivos como os derivados opioides e as BZDs. Os conflitos gerados por tal situação podem levar o paciente à depressão e até mesmo ao suicídio. A dor crônica parece estar mais associada a transtornos depressivos, enquanto a dor aguda a transtornos ansiosos (Von Korff, 1993). Não se correlaciona com a distribuição anatômica da sensibilidade; pode ser acompanhada de anestesia ou parestesias. Em diferentes exames laboratoriais, podem ser detectadas condições médicas gerais como lesões musculoesqueléticas, neuropatias ou câncer que estão associados à dor (American Psychiatric Association, 1994) (tabela 17).

No transtorno estão envolvidos os nervos aferentes periféricos, o sistema de processamento e a interpretação em nível do SNC, de tal maneira que os limiares da dor variam consideravelmente de pessoa para pessoa. Anormalidades estruturais límbicas ou sensoriais podem determinar a gravidade da dor; um mecanismo de gatilho no corno dorsal da medula espinhal (substância gelatinosa > substância P) maneja sinais dolorosos aferentes; a deficiência de endorfinas parece estar relacionada com o aumento dos estímulos aferentes; a serotonina tem sido implicada como o neurotransmissor das vias inibitórias descendentes. Algumas pessoas usam a dor de forma manipulativa diante de situações de difícil manejo para o paciente, como as discórdias familiares ou conjugais (Guggenheim & Smith, 1995).


 

2. Epidemiologia:

 

Apresenta-se em qualquer idade, especialmente entre os 30 e 40 anos. As mulheres têm maior proporção em experimentar dores crônicas tipo cefaleia ou transtornos musculoesqueléticos. É relativamente comum, com altas taxas de absenteísmo laboral atribuídas à sua causa. Os transtornos depressivos, a dependência ao álcool e a dor crônica podem se apresentar em familiares de primeiro grau (Guggenheim & Smith, 1995).


 

3. Tratamento:

 

O placebo pode ser eficaz em até um terço dos casos (especialmente se associado à melancolia ou metástase). Para seu manejo, deve-se evitar, na medida do possível, medicações analgésicas e tratar a causa do sintoma. São úteis os antidepressivos como a Imipramina, 25-100 mg/dia, e as terapias comportamentais.


 

Transtornos Dissociativos

 

Nos anos 40, os trabalhos de Penfield permitiram suspeitar que a memória tinha substrato nos lobos temporais devido à evocação de experiências passadas (“flashbacks”) que a estimulação elétrica dos mesmos produzia. No entanto, e apesar do comprometimento do aprendizado declarativo ou explícito (aquele que se adquire após um breve trabalho de treinamento), é possível observar pacientes com lesões bilaterais de lobos temporais que conservam a capacidade de aprender novas habilidades motoras e formas não associativas do aprendizado conhecidas como habituação, sensibilização e condicionamento clássico, onde o sujeito, apesar do aprendizado, não é capaz de descrever o que foi aprendido. Nessa situação, o processo de aprendizado não depende do fenômeno de potenciação de longo prazo (LTP) ou da coativação de elementos pré e pós-sinápticos, mas sim da participação de neurônios moduladores de tipo serotoninérgico que produzem uma facilitação pré-sináptica ao aumentar a liberação de neurotransmissores pela célula pré-sináptica (Kandel & Hawkins, 1992). Caso contrário, a potenciação de longo prazo (LTP), que se presume participa nas mudanças sinápticas que subjazem à memória explícita e ao aprendizado, consiste em um aumento estável e duradouro (horas a dias) na magnitude da resposta pós-sináptica a partir de estímulos pré-sinápticos breves de alta potência e com um intervalo apropriado entre os pulsos. A LTP pode ser induzida pela administração de 100 a 200 pulsos com uma frequência de 0,2 a 400 Hz a cada poucos segundos ou minutos. Existe um limiar de intensidade de estimulação que deve ser ultrapassado para induzir uma potenciação de longo prazo (McNaughton et al., 1978; Staubli & Lynch, 1987). A potenciação de longo prazo caracteriza-se por ter especificidade em relação ao tipo de estímulo e associatividade por generalizar-se a outras vias quando a estimulação pós-sináptica ocorre ao mesmo tempo. Requer-se ainda uma coativação de elementos pré e pós-sinápticos (regra de Hebb) com ativação do neurônio pré-sináptico e receptividade do pós-sináptico (Malinow & Miller, 1986; Bliss & Collingridge, 1993).

O neurotransmissor implicado no paradigma da potenciação a longo prazo é presumivelmente o glutamato, com ativação de receptores NMDA e posterior abertura de canais de Ca++, sempre e quando se apresentem tanto a união do neurotransmissor quanto a despolarização da membrana (Bekkers & Stevens, 1990). Como foi mencionado, o Ca++ é o íon indispensável na ativação de vários tipos de proteína-cinases e, consequentemente, da expressão genética que depende da fosforilação destas (Mayer et al., 1984; Nowak et al., 1984; Kandel & Hawkins, 1992). Os receptores NMDA participam apenas na indução de LTP, já que a manutenção é realizada pela estimulação de receptores AMPA e cainato (Collingride, 1985). Estudos em animais com um antagonista seletivo dos receptores NMDA (APV) injetado no hipocampo ou com inibidores da PKC ou da CAM-cinase II, previamente a uma sessão de treinamento, mostram um bloqueio na aquisição de memória espacial (Morris et al., 1986; Malinow et al., 1989). Experimentos realizados em Aplysia, Drosophila e ratos, indicam que as proteínas CREB desempenham um papel central nos processos moleculares da memória a longo prazo (Frank & Greenberg, 1994). A potenciação a longo prazo leva a um aumento na probabilidade da liberação de neurotransmissores diante de um determinado estímulo (Bekkers & Stevens, 1990); possivelmente por uma forma de sinal retrógrado (fator retrógrado de plasticidade), talvez o ácido araquidônico e o óxido nítrico que atuam como mecanismos de facilitação pré-sináptica (Bredt & Snyder, 1992).

Diferente da memória de curto prazo, onde a fosforilação covalente das proteínas intraneuronais é suficiente, para a memória de longo prazo a síntese de proteínas (transcrição genética) é indispensável, como demonstra a formação de RNA e a síntese de proteínas que ocorrem poucas horas após a exposição ao estímulo (Montarolo et al., 1986; Dash et al., 1990). Além disso, demonstrou-se que existe uma migração dos “rastros de memória” (RNAm de fos) para diferentes áreas cerebrais. Assim, em macacos rhesus, a “memória representacional” (de curto prazo) pode depender de substratos límbicos, mas a “memória de hábito” (de longo prazo) localiza-se posteriormente em substratos estriatais (Post, 1992).

A facilitação heterossináptica é um processo em que participam neurônios facilitadores que liberam serotonina e alguns peptídeos, aumentando a liberação de neurotransmissores do neurônio pré-sináptico, por meio da ativação da adenilciclase. Este é um mecanismo claramente evidenciado nos processos de memória implícita ou formas não associativas da aprendizagem (aquela evidenciável mas não consciente) e diferente daquele produzido pela potenciação de longo prazo (LTP) própria da memória explícita (Hawkins & Schacher, 1989).

A memória pode requerer uma variedade de etapas como codificação (recepção de nova informação), memória explícita (armazenamento da informação a curto prazo em forma de “rastros de memória” que pode ser recuperada facilmente), consolidação (localização em uma nova zona dos “rastros de memória” de forma mais permanente, durante várias semanas ou mais), armazenamento (onde se conservam os “rastros de memória” de forma permanente) e recuperação (informação armazenada que é levada à consciência). Essas etapas envolvem sistema reticular ativador, córtex sensorial e córtex frontal esquerdo (codificação); hipocampo, núcleo dorsal do tálamo e córtex pré-frontal dorsolateral (memória explícita), hipocampo, giro parahipocampal ou córtex entorrinal (consolidação) e córtex frontal direito, componentes parietais e cerebelares e hipocampo (armazenamento e recuperação). O papel do hipocampo é unificar elementos de memória armazenados em diversas áreas corticais no momento da recuperação da memória (Mishkin, 1978; Zola-Morgan & Squire, 1990; Andreasen et al., 1995) (ver figura # TSF-1). A memorabilidade de um evento aumenta quando este está relacionado com um conhecimento preexistente, é relevante para as crenças ou expectativas e/ou está relacionado com outros eventos no momento de ser codificado. Assim, os eventos estressantes, por exemplo, podem ser mais memorizáveis que eventos ordinários da vida (Bremner et al., 1996).

Os transtornos dissociativos são o resultado do isolamento de um fragmento da vida psíquica (memória, consciência ou identidade), inconsciente e sem transtorno cerebral orgânico. Esses pacientes têm altos níveis de hipnotizabilidade, acima de pacientes com outros transtornos (Frischholz et al., 1992). Pierre Janet foi o primeiro a desenvolver o conceito de dissociação mental utilizando a técnica hipnótica e descobrindo que a memória de eventos traumáticos é excluída da consciência e separada totalmente (dissociada). Até 38% das vítimas de um trauma qualquer que experimentaram abuso severo suficiente para requerer avaliação em um serviço de urgências não têm memória do evento 20 ou mais anos depois (Bremner et al., 1996). Em estudos com animais, o estresse traumático levou a mudanças nas regiões cerebrais envolvidas com a memória; os neuromoduladores liberados durante o estresse levam à diminuição dos “rastros de memória” (Charney et al., 1993). Os sintomas dissociativos podem expressar-se como amnésias, uma variedade de paralisias localizadas, anestesias, estados de transe, parestesias e alucinações (Nemiah, 1995). O ICD-10, utiliza uma categoria mais ampla de transtornos dissociativos e de conversão que o DSM-IV; define entre outros: Neurastenia, Amnésia dissociativa, Fuga dissociativa, Estupor dissociativo, Transtornos de possessão e transe, Transtornos motores dissociativos, Convulsões dissociativas, Anestesia dissociativa, Transtorno misto conversivo/dissociativo, Transtorno de Ganser… (World Health Organization, 1992).

É importante notar que as crenças culturais podem fazer com que sobressaiam sintomas incomuns que podem ser mal interpretados como psicóticos por um clínico não familiarizado com os mesmos. Quando as culturas sancionam ou reforçam as experiências dissociativas (respostas emocionais condicionadas ao medo adquirido), através de rituais religiosos ou de cura e de outros aspectos da vida comunitária ou de modelos de doença ou idiomas de “estresse”, os indivíduos podem tender a exibir sintomas dissociativos em resposta à ansiedade (Kirmayer et al., 1995).


 

1. Amnésia Dissociativa:

 

É o transtorno dissociativo mais comum. De maior apresentação em mulheres e posterior a estresse psicossocial ou físico, com perda abrupta da memória de caráter fragmentário principalmente (localizada ou seletiva) ou de tipo generalizado, sistematizado ou contínuo, da qual o paciente é consciente e às vezes indiferente.

Alguns indivíduos relatam sintomas depressivos, despersonalização, estados de transe e analgesia, aparecimento de conteúdos mentais dissociados como visões alucinatórias, disfunções sexuais, automutilação, impulsos agressivos, transtornos laborais ou interpessoais e impulsos e atos suicidas. Pode apresentar-se em indivíduos com outro tipo de transtorno mental como transtorno conversivo, transtornos do afeto ou transtornos de personalidade.

Os indivíduos com este transtorno apresentam alta hipnotizabilidade e costumam ter histórias pessoais de trauma infantil. A amnésia, que se deve a um transtorno na fase de evocação e não de fixação como nos processos neurofisiológicos, pode durar desde minutos até vários anos e costuma terminar subitamente, especialmente quando se separa o indivíduo da circunstância traumática. A possibilidade de desenvolver uma nova amnésia diante de outra circunstância traumática é alta. A fragmentação das memórias traumáticas é usualmente vista nesses pacientes e se deve ao comprometimento no funcionamento hipocampal, o qual não pode então integrar os diferentes “rastros de memória” que compõem uma lembrança determinada e que se alojam em diferentes zonas corticais, conforme sejam de tipo tátil, olfativo, visual, auditivo, emocional. Sem a devida integração, a memória aparecerá fragmentada ou mesmo ausente. A amnésia representa então um mecanismo autoprotetor pelo qual os sobreviventes a situações traumáticas evitam recordar o evento, sendo uma intervenção psicoterapêutica com evocação da memória emocional, um instrumento que permite prover um meio de suporte que permita ao paciente experimentar essas emoções intensas com uma abordagem diferente (Bremner et al., 1996).

A hipnose e o Tiopental intravenoso podem ser úteis para “mobilizar” memórias subjacentes; a psicoterapia extensa de qualquer tipo pode ajudar o paciente na resolução dos conflitos psicológicos que precipitaram o episódio amnésico (American Psychiatric Association, 1994; Nemiah, 1995).


 

2. Fuga Dissociativa:

 

Perda severa da memória (amnésia retrógrada) associada a uma viagem repentina inesperada no contexto de uma elevada tensão emocional, e com mudanças de atividade e identidade (parcial ou completa) em meio a um comportamento normal, que surpreende o indivíduo ao retornar ao seu estado prévio, ao se ver em um lugar ou situação estranha, sem estar consciente da mudança e da perda de memória.

A recuperação é geralmente espontânea e rápida, com poucas recorrências. Deve-se descartar epilepsia, estado pós-ictal, intoxicação etílica. O alto consumo de álcool é um fator predisponente, assim como os transtornos de personalidade borderline, esquizoide ou histriônica. Prevalência relatada: 0,2% (American Psychiatric Association, 1994).

O tratamento consiste em entrevistas com Amobarbital ou com psicoterapia e hipnose; os pacientes com transtornos dissociativos têm maiores taxas de hipnotizabilidade que outros grupos, e por isso poderia ser útil no diagnóstico diferencial (Nemiah, 1995).


 

3. Transtorno de Identidade Dissociativa (Personalidade Múltipla):

 

Presença na mesma pessoa de variadas e separadas personalidades (duas ou mais) com uma delas dominante, e que se apresentam independentemente com seu próprio corpo de memórias e associações e seu próprio nome e características (sexo, idade, raça, QI, traços psicológicos…).

Cada personalidade não sabe da existência da(s) outra(s). Através de uma sugestão hipnótica ou secundário a um estresse psicossocial, é possível provocar a mudança de personalidade de forma abrupta. Usualmente há uma identidade primária que leva o nome da pessoa e que é passiva, dependente, depressiva e com sentimentos de culpa, e outras identidades alternas provenientes de elementos mentais dissociados que têm diferentes nomes e características (em idade, gênero, vocabulário, conhecimentos gerais) que contrastam com a identidade primária (às vezes criticando-a) ao serem hostis, controladoras e autodestrutivas. A inabilidade para recordar importante informação pessoal está presente. É três a nove vezes mais frequente em mulheres que em homens, principalmente jovens e com um maior número de personalidades (15 ou mais) que estes (8 aproximadamente) (American Psychiatric Association, 1994).

O paciente apresenta histórico de abuso sexual (físico ou psicológico em 94,4% dos casos), ou transtorno de estresse pós-traumático (80,6%) (Boon & Draijer, 1993). Deve-se descartar esquizofrenia, amnésia orgânica, epilepsia do lobo temporal (psicomotora), transtornos somatoformes, fuga dissociativa, transtorno de despersonalização, transtorno factício, simulação e outros transtornos mentais.

O diagnóstico deste transtorno é difícil de ser realizado, a menos que a transição para outra personalidade se apresente em meio à entrevista clínica. Uma forma indireta de suspeitá-lo poderia ser investigando por períodos de amnésia ou sensação subjetiva de um tempo perdido; episódios de estranheza pelo local em que o sujeito se encontra; ser cumprimentado frequentemente por sujeitos desconhecidos para ele; extravio ou alteração de posses pessoais.

O curso é crônico e recorrente com recuperação incompleta. O manejo deve ser com psicoterapia extensa de orientação analítica que explore todos os alter-egos, frequentemente sob hipnose (Nemiah, 1995).


 

4. Transtorno de Despersonalização:

 

Persistente e desagradável sensação de estranheza da própria personalidade (“como se um estivesse se observando”), com sensação de que o ambiente e os objetos nele estão mudando (desrealização) com macropsias ou micropsias e experiência de automatismo com distorção na percepção de tempo e espaço. Durante a despersonalização, a avaliação da realidade permanece intacta. É um fenômeno comum que geralmente não supõe uma patologia subjacente e é frequente em crianças. Quando se apresenta de forma patológica, costuma ser raro e mais frequente em mulheres jovens (2:1) (American Psychiatric Association, 1994).

Costuma ser acompanhado de sintomas depressivos, ideias obsessivas, ansiedade e preocupações somáticas. Deve-se estabelecer um diagnóstico diferencial com esquizofrenia, depressão maior, transtorno de pânico (pela frequente apresentação neste transtorno da despersonalização e desrealização, especialmente durante os ataques de pânico), transtorno de estresse agudo, outro transtorno dissociativo ou entidades cerebrais orgânicas como epilepsia e consumo de alucinógenos como o LSD e a mescalina. O curso é crônico, marcado por exacerbações e remissões, principalmente em associação a eventos traumáticos. Diferente dos outros transtornos dissociativos, não se apresenta uma perda da consciência ou memória do evento, mas sim uma mudança na qualidade da percepção. O transtorno é muito refratário a qualquer procedimento terapêutico, limitando-se ao manejo da ansiedade e à descarga catártica das emoções conectadas com memórias traumáticas (Nemiah, 1995).


 

5. Outros Transtornos Dissociativos:

 

Síndrome de Ganser:

Amnésia, respostas absurdas (“2 mais 2 igual 5”), perda da concentração, transtornos perceptuais e desorientação. Também se incluem estados de transe com alteração da consciência, desrealização sem despersonalização e estados dissociados por persuasão intensa (“lavagem cerebral”) (Kaplan, 1990).

Transtorno de Transe Dissociativo:

Caracteriza-se por alterações simples ou episódicas no estado de consciência, identidade ou memória, acompanhados de recordações alucinatórias vívidas ou sensação de estar possuído por espírito. O indivíduo experimenta uma perda do controle de si mesmo com padrões de comportamento repetitivos e complexos e marcada ansiedade com expressões linguísticas às vezes impossíveis de compreender; com amnésia posterior para o evento, mas recuperação imediata do nível de funcionamento prévio (Nemiah, 1995).

Ataques de Nervos:

São uma variante dos transtornos de transe dissociativo, desencadeados por situações estressantes de tipo familiar (conflitos conjugais, morte de um parente, divórcio, acidente de um familiar…). As experiências dissociativas, as pseudoconvulsões e os gestos suicidas podem ser proeminentes em alguns ataques, mas ausentes em outros. Os ataques de nervos diferem dos ataques de pânico em que ocorrem unicamente como uma resposta a um evento estressante (American Psychiatric Association, 1994).

Transtorno Factício e Simulação

1. Definição e Características:

Em 1951, Richard Asher utilizou o termo “síndrome de Munchausen” para descrever aqueles pacientes com processos crônicos e com tendência a migrar de hospital em hospital e de médico em médico, fabricando dramaticamente diferentes doenças. Além disso, determinou 3 subtipos da síndrome: abdominal, hemorrágico e neurológico.

O transtorno factício é caracterizado por sintomas físicos (náuseas, vômitos, dor, convulsões) e psicológicos (alucinações, depressão, delírios, comportamento bizarro) produzidos de forma voluntária com a intenção compulsiva de permanecer doente, às vezes com perigo para sua vida, mas sem outro benefício adicional (tabela 18). Muitos desses indivíduos podem ser submetidos a múltiplos procedimentos cirúrgicos ou médicos com consequências que podem ser perigosas para sua saúde ou sua vida (Jones, 1995).

O simulador, diferente do paciente com transtorno factício, tem fins muito determinados (como o pagamento de um seguro ou evitar uma reclusão carcerária) e descreve os sintomas com grande detalhe (diferente do indivíduo com transtorno factício), irritando-se se o médico se mostra cético. Podem ocorrer critérios para um transtorno de personalidade antissocial. As simulações mais frequentes são: cegueira, claudicação e surdez, e requer-se avaliações neurológicas e exames laboratoriais para esclarecer o diagnóstico (American Psychiatric Association, 1994). Alguns pacientes envolvidos em acidentes ou acusados de um crime podem exagerar ou fabricar problemas de memória para obter alguma vantagem em troca. Nesses casos, uma avaliação neuropsicológica desempenha um papel importante; assim, em um teste de memória como o da lista de palavras, os pacientes com amnésia orgânica real tendem a recordar palavras do final da lista, enquanto os pacientes simuladores não seguem esse padrão. Em um teste de memória de reconhecimento “sim-não”, os pacientes simuladores podem dizer NÃO aos itens-alvo e SIM aos distratores, indicando uma boa memória para distinguir os dois tipos de itens (Delis, 1993).

O indivíduo com transtorno factício frequentemente domina alguma terminologia médica e conhece bem a rotina da vida hospitalar. Costuma construir histórias em torno de sua suposta doença (pseudologia fantástica) de forma mitomaníaca, com a convicção de que suas histórias são reais. Para a produção de alguns sintomas, o indivíduo pode recorrer a certos medicamentos (anticoagulantes, psicotrópicos, hipnóticos, epinefrina, insulina…) ou procedimentos (laceração das vias urinárias, autoinoculação bacteriana, autoimplantação de corpos estranhos…).

No transtorno factício por procuração, descrito por R. Meadow em 1977, o propósito é provocar sinais e sintomas físicos ou psicológicos em uma pessoa sob a responsabilidade do indivíduo, com o propósito de assumir indiretamente o papel de doente. Além disso, as crianças que desenvolvem sintomas factícios por um transtorno factício por procuração, podem desenvolver mais tarde um transtorno factício sem a intervenção do procurador (Jones, 1995).

 

2. Etiologia:

A experiência precoce de ter sido um paciente pode desempenhar um papel muito importante para que o paciente se sinta na necessidade de repetir a experiência em busca de se sentir valorizado. Uma ostensiva atitude de amargura, desamparo e ressentimento em relação aos médicos pode ser evidente. Esses pacientes podem se caracterizar por seus comportamentos agressivamente masoquistas e autopunitivos. O transtorno pode se apresentar muitas vezes em um paciente com um transtorno depressivo ou de personalidade subjacente (limítrofe, histriônico) com traços como baixa tolerância à frustração, pobre senso de identidade, pobre ajuste sexual, necessidade extrema de dependência e narcisismo (Jones, 1995).


 

3. Epidemiologia e Curso:

 

É mais frequente em homens. 0,5% dos pacientes internados em um serviço psiquiátrico podem ser diagnosticados posteriormente como um transtorno factício; em hospitais gerais, a porcentagem é maior, especialmente por febre simulada ou sangue em secreções ou excreções corporais. Um estudo em 1288 pacientes encaminhados por interconsulta ao departamento de psiquiatria em um hospital geral, relatou que o diagnóstico de transtorno factício poderia ser feito em 0,8% desses pacientes (7 dos 10 pacientes com o diagnóstico pertenciam ao sexo feminino). É mais comum em trabalhadores da área da saúde, como enfermeiras, secretárias médicas, técnicos da área da saúde, voluntários hospitalares e médicos (Jones, 1995). De início na idade adulta jovem e curso crônico com frequentes consultas médicas e hospitalizações. O prognóstico é pobre sem tratamento definido e de melhor prognóstico se associado a depressão ou ansiedade (American Psychiatric Association, 1994).

4. Tratamento:

Técnicas comportamentais, sendo prudente confrontar o paciente de uma maneira suportiva e não acusatória. Deve-se dar tratamento à depressão ou ansiedade concomitantes, caso estejam presentes (Jones, 1995).